Agora é sangue, suor e lágrimas

“Equilibrar o orçamento é como ir para o céu. Todos querem ir, mas ninguém quer fazer o que tem de ser feito para chegar lá.”

Phil Gramm, político americano.

O ano era 1999, o governo era FHC e o Brasil entrava em uma guerra. Esta era travada numa batalha de trincheiras em que o Planalto mergulhou ao mudar o regime de câmbio. O dólar furava a emblemática barreira dos R$ 2,00 e havia muitos perdedores. A credibilidade do governo atingia o ponto mais baixo desde a sua ascensão ao poder. O mercado financeiro entrou em pânico e o sentimento contaminou a população, provocando histeria coletiva e onda de saques no sistema bancário.

O presidente foi obrigado a ser franco:

“A crise existe e não podemos negá-la. Só tenho a oferecer sangue, suor e lágrimas”, relembrando uma célebre frase de Winston Churchill, primeiro ministro inglês ao constranger os ingleses ao sacrifício da Segunda Guerra Mundial.

FHC completava “Lágrimas porque não fizemos o que tínhamos de fazer a tempo e suor porque vamos superar isso e transformar o nosso país em um lugar próspero e marcado pelo avanço”.

O ano agora é 2016 e quem de fato ocupará a presidência até 2018 ainda é incerto. Mas isso não importa. A situação atual obriga e obrigará o país a passar novamente por um período de “Sangue, suor e lágrimas”.

O rombo fiscal é de proporções faraônicas. A solução deste problema exige um governo politicamente forte, um líder comprometido e um corpo técnico de alto calibre. Hoje temos qualquer coisa, menos estes três ingredientes.

De forma bem genérica, o país precisa – inicialmente – das reformas fiscais política, tributária, trabalhista e previdenciária.

O suor virá da dificuldade de aprovar todas as medidas necessárias, grande parte julgada como impopular, como aumento de impostos (inicialmente, pois depois é necessária a reforma e simplificação tributária), alongamento do tempo necessário para a aposentadoria, corte de alguns benefícios e a redução da máquina pública – corte na carne. O sangue será pelas feridas que serão abertas em alguns grupos de interesses e as lágrimas podem ser pela dor da falha ou pela felicidade do sucesso.

O canal da recuperação seria mais ou menos o seguinte: a correta medicação do problema fiscal, melhorando o resultado primário, aumentaria o capital político e a confiança, gerando um interessante círculo virtuoso.

A confiança por si só gera uma melhora (ou uma redução da piora) da atividade econômica, inicialmente, no lado produtivo, no lado da oferta. Este resultado positivo da atividade é acompanhado pelo aumento das receitas fiscais que fortalecera o ciclo da recuperação fiscal do país. Além disto, a confiança (e o início do ajuste fiscal) também reduz o Risco-País e diminui a pressão sobre a taxa de câmbio, ajudando também no combate à inflação. A melhora do quadro fiscal e a redução da inflação, por sua vez, fortaleceriam o cenário de ciclo de afrouxamento monetário, via redução dos juros, que também traria algum folego para a atividade econômica. E, por último, neste novo cenário de maior confiança no governo, poderemos retomar a agenda de concessões.

Este é o melhor dos mundos, mas repito: há a necessidade de um governo forte e comprometido.

A questão da não legitimidade de um eventual governo Temer para aprovar as medidas parece um pouco desleal. Abusando de sua memória, lembre-se que o Plano Real – o maior plano social que o país teve a capacidade de pôr em prática – não veio sem sangue, suor e lágrimas, mas veio da mão de um vice-presidente.

Então você, tentando ser inapelável, dirá: mas o país não estava tão rachado no início dos anos 90. Bom, só me resta lembrá-lo que o país vivencia a mais intensa e longa recessão de toda sua histórica republicana.

O governo deverá ser franco com a sociedade, assim como foram Churchill e FHC, e explicar muito bem o que será feito e a importância do que será feito. Não poderá prometer um caminho fácil, mas deverá prometer um caminho exitoso. A sociedade brasileira também não poderá fugir de seu compromisso com o país na hora da compreensão das medidas – pois foi sócia na eleição de pessoas que nos trouxeram esta crise – e na importância de não comprometer as gerações futuras com o adiamento da crise fiscal (se é que isto é possível).

Por fim, gostaria de lembrá-los que a solução do problema fiscal e as reformas acima mencionadas são apenas o passo inicial, aquele que deverá nos tirar da crise econômica. Agora, para se sustentar um bom crescimento de longo prazo, outras medidas deverão tomar a agenda de país, como a maior exposição ao comercio internacional e melhora no sistema de educação básica, mas infelizmente isto continuará sendo uma conversa para uma outra oportunidade.

Arthur

Editor do Terraço Econômico

Arthur Lula Mota

Mestre em Economia Aplicada pela Universidade de São Paulo (USP/ESALQ) e Bacharel em Economia pela Universidade Federal de São Paulo. Já trabalhou no mercado financeiro, auxiliando mesa de operações de fundos institucionais e departamento econômico com análises macroeconômicas.

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