Aumento do salário mínimo: bom ou ruim?

Leis de salário mínimo parecem coisas boas: protegem os mais “fracos” no mercado de trabalho – os menos qualificados, os sem experiência, os que são passíveis de sofrerem algum tipo de discriminação salarial- de serem explorados pelos empregadores recebendo salários muito baixos. Pelo menos esse é o argumento principal por trás desse tipo de regulação.

O que diz a teoria econômica?

Esse argumento, todavia, nunca encontrou amparo teórico. Para modelos “bem-comportados” de mercado de trabalho (e.g., não há fricções bizarras e a demanda por trabalho não é monopolizada), a previsão teórica é em geral a mesma: salário mínimo é controle de preço e esses controles de preço (e aqui temos um tentando fixar um preço-piso) vão gerar um desequilíbrio entre oferta e demanda. O excesso de oferta e a diminuição de demanda que esses controles de preço produzem se traduzem em desemprego, em geral maior exatamente entre aqueles que a lei pretende proteger.

Testes difíceis

Não é fácil testar esse tipo de resultado teórico — quando o salário mínimo muda ele muda, em geral, para toda a força de trabalho, dificultando a identificação de seu efeito; tampouco existem bancos de dados detalhados o suficiente para saber o que acontece com os trabalhadores após mudanças no salário mínimo.

Faz uns 40 anos que os economistas procuram dados com características que permitam testar de forma mais ou menos “clean” esses efeitos.

Nova evidência

Um novo estudo de Claus Kreiner (U of Copenhagen) Daniel Reck (U of Berkeley) e Peer Skov(U of Auckland) explora uma descontinuidade no salário mínimo para os jovens na Dinamarca para responder uma das clássicas questões da literatura de economia do trabalho: qual o efeito do salário mínimo sobre o nível de emprego?

As leis dinamarquesas ditam que é possível pagar para adolescentes menos do que o salário mínimo para adultos. Ao completarem 18 anos, o salário mínimo obrigatoriamente aumenta. E não é pouco: 40%.

Os resultados da pesquisa– ilustrados na figura abaixo — mostram que o aumento de 40% no salário desses jovens causa uma redução de 33% no nível de emprego (a maior parte causada por perda de emprego).

Ao contrário do que os estudos baseados em estratégias diferenças-em-diferenças explorando mudanças globais no salário mínimo sugerem (muitos chegando a um efeito nulo), o trio de pesquisadores conclui que, pelo menos para esse subgrupo demográfico, há uma elasticidade-salário da demanda por emprego é de cerca de -0,8. Não é só perder o emprego (efeito imediato) que é ruim aqui. Tem o efeito (intertemporal) de ficar desempregado e deixar de adquirir habilidades e experiência importantes para o futuro. A pesquisa pode ser lida em totalidade aqui.

Evidência de Seattle

Resultados similares também são obtidos por Jardim, Long, Plotnik, Inwegen, Vigdor, Wething (2017). O time de pesquisadores usa um conjunto de dados administrativos ricos (e.g., com informações sobre o salário por hora) para explorar o efeito de uma mudança de salário mínimo em Seattle aplicável para todas as categorias de trabalhadores em postos com salários baixos em todos os setores.

Eles encontram que um aumento de 3,1% nos salários abaixo de um certo valor (US$ 19) em Seattle causou uma queda de 9,4% no total de horas trabalhadas (algo equivalente a 5 mil empregos). A perda de renda associada à redução de horas não é compensada pelo aumento de renda provocado pelo aumento salarial, produzindo uma redução na massa salarial desse grupo de empregados.

Essa pesquisa faz uma extensa e rica discussão sobre o porquê das diferenças nas estimativas de elasticidade-salário do emprego obtido em outros estudos utilizando outros tipos de dados – que os autores argumentam convicentemente serem consideravelmente subestimadas. O estudo pode ser visto aqui.

Batalha perdida

Conquanto haja um certo regozijo em ver evidência de que mesmo os modelos mais básicos não estavam errados nesse assunto, a verdade é que não há evidência no mundo que convença os políticos e os eleitores que essas leis de salário mínimo — como qualquer outra política de controle de preço, seja de livro, seja de câmbio, seja de aluguel — não são coisas boas no médio e longo prazo. Veja o impacto de longo-prazo perverso que essas leis de salário mínimo têm ao deixar jovens no começo de uma trajetória potencialmente ascendente de produtividade fora do mercado de trabalho e, portanto, sem acumular “capital humano”.

A vasta maioria dos países industrializados possuem leis controlando o preço do trabalho (3/4 dos países da OCDE, por exemplo, têm leis de salário mínimo). O Brasil instituiu lei do salário mínimo no meio da década de 30. Falar em acabar com salário mínimo está fora de questão. Essa foi uma batalha que os economistas perderam.

  Sérgio Almeida – Professor Doutor na Universidade de São Paulo  

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