Globalização, comércio internacional e a chance de ouro

O mundo mudou, e rapidamente. É até clichê dizer que a internet mudou a forma como as pessoas se comunicam. Este blog, por exemplo, foi visto em mais de vinte países apenas hoje até o momento em que escrevo este parágrafo, se contabilizarmos os dados desde que a fundação do Terraço, há menos de dois meses, fomos lidos em mais de cinquenta países, sendo alguns inesperados para um blog escrito em português como o Sri Lanka, a Letônia e a Tanzânia. Nem mesmo o mais otimista editor do Estadão esperaria um alcance tão amplo nos tempos do papel impresso.

Não me iludo, não somos (ainda) um sucesso absoluto, tampouco estamos perto de ser estar consolidados. Trata-se de um fenômeno global que estamos tentando nos aproveitar. De acordo com um relatório publicado pela consultoria McKinsey[1], 38% dos fluxos internacionais de bens, serviços e financeiros originaram-se em países em desenvolvimento, contra 14% em 1990. É provável que no Iphone em que você está lendo este texto esteja escrito em alguma parte algo como “Designed in California. Assembled in China.”

O mesmo relatório também diz que uma maior abertura aos fluxos globais tem sido uma importante fonte de crescimento econômico para países e no mundo. No geral, estima-se que os fluxos globais têm contribuído 15-25% do crescimento global a cada ano, com os países mais interligados recebendo 40% a mais dos benefícios do crescimento do que os menos interconectados. Isto é consistente com a teoria econômica: interconectividade promove o crescimento através de ganhos de produtividade de especialização, escala, competição e inovação.

Como o Brasil está inserido nesta cadeia de produção global? Não muito bem, levando-se em conta o fato de que o comercio internacional representa apenas 27% do PIB[2], número extremamente baixo se comparado com outro país latino americano: o comércio internacional em Cuba, por exemplo, apresenta uma taxa de 39% do PIB. De fato, não é muito justo comparar uma economia do tamanho da brasileira com uma pequena ilha que não possui capacidades produtivas muito elevadas dependendo assim de outros países para obter alguns produtos básicos de consumo. Porém, uma economia que aspira a uma posição de destaque no cenário internacional apresentar um nível menor de internacionalização do que um país que sofre um embargo comercial desde 1962 é, no mínimo, estranho.

Com conectividade global passando por uma transformação profunda, agora é a hora de estabelecer parcerias-chave. Ao fazer isso, o Brasil ganharia acesso a inúmeras oportunidades de crescimento. Assim, iríamos colher os benefícios da concorrência global, o que obrigaria as empresas locais a buscar uma maior eficiência através da implementação de processos enxutos, investindo em pesquisa e desenvolvimento, ou adotar as mais novas tecnologias. Nossos carros estão em um patamar tecnológico muito inferior ao encontrado fora, devido à proteção dada à indústria automotiva, além de não contarem com o charme dos carros cubanos. A exposição global torna as cadeias de abastecimento mais dinâmicas e permite que as empresas para absorver inovações, tecnologias e ideias que surgem constantemente em todo o mundo.

O histórico de protecionismo do Brasil – os sucessivos governos tentaram controlar o fluxo de bens e serviços para fortalecer as indústrias nacionais desde os tempos de Cabral – tem dificultado a sua participação no mercado global. No geral, o Brasil mantém tarifas e impostos relativamente altos e voláteis. A sua tarifa média foi de 7,9 por cento em 2011, que foi o mais alto de qualquer economia BRIC. Porque o Brasil faz parte do bloco comercial Mercosul da América Latina, suas tarifas comerciais são estipuladas no mesmo nível do bloco, com exceções feitas para 100 produtos escolhidos (que incluem bens de consumo intensivos em conhecimento, como telefones celulares, equipamentos de telecomunicações, computadores e impressoras, e certos produtos químicos e farmacêuticos).

Dado o fracasso da OMC e sua rodada de Doha, dois grandes acordos comerciais estão sendo negociados no mundo: o Transatlantic Trade and Investment Partnership (TTIP), entre Estados Unidos e União Europeia (UE); e o Trans-Pacific Partnership (TPP), entre Estados Unidos, Austrália, Brunei, Canadá, Singapura, Chile, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru e Vietnã. Os economistas Vera Thorstensen e Lucas Ferraz, da FGV-SP, em um recente estudo[3], destacam que se o Brasil abandonasse as amarras do Mercosul e aderisse a estes acordos um significativo aumento nas exportações e importações ocorreria, como ilustrado no gráfico formulado pelos autores abaixo:

[caption id="attachment_829" align="aligncenter" width="552"]Fonte: FGV Fonte: FGV[/caption]

Porém, o cenário mais provável é que o Brasil continue atrelado ao Mercosul e os acordos aconteçam sem a participação brasileira. Neste caso, os efeitos serão negativos, ou seja, ao permanecer atrelado ao Mercosul é como se o Brasil aplicasse um auto embargo comercial:

[caption id="attachment_830" align="aligncenter" width="571"]Fonte: FGV Fonte: FGV[/caption]

Hoje, a Copa do mundo começou no Brasil e trouxe, temporariamente, o mundo “para dentro” do nosso país. Seria ideal se o país aproveitasse a euforia e convidasse o mundo a ficar. Se não, ficaremos cada vez mais defasados e um dia olharão para cá como hoje olhamos para a ilha dos irmãos Castro:

[caption id="attachment_831" align="aligncenter" width="428"]Fonte: Desconhecida Fonte: Desconhecida[/caption]

João Lazzaro 10170219_10203335365288648_276252663_o

 

[1] http://www.mckinsey.com/insights/globalization/global_flows_in_a_digital_age

[2] Fonte: World Development Indicators – World Bank Data

[3] Disponível em: http://www.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/boletim_internacional/140512_boletim_internacional016.pdf

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