Não existe pipoca grátis!

Quem não gosta de ir ao cinema ? Mas o preço das entradas desanima, principamente o do ingresso inteiro. Por isso, quem tem carteirinha de estudante não a esquece. E quem não tem quer ter! O surpreendente é que a famosa carteirinha não parece gerar um desconto, e sim uma maldição para o bolso dos cinéfilos.

Lembre-se que o empresário do cinema precisa pagar funcionários e custos como luz, água e outros de forma integral, independentemente da quantidade de meias entradas que vendeu. Para formar o preço, no entanto, o cinema leva em conta o percentual de vendas com carteirinhas e o público médio; afinal, a receita precisa cobrir os custos e oferecer uma margem de lucro razoável, como qualquer outro negócio.

Segundo dados do sindicato das empresas cinematográficas de Minas Gerais, 75% dos consumidores usam a carteirinha. Assim, para obter uma receita média por ingresso compatível com o custo, o cinema terá que aumentar significativamente o preço do ingresso regular. No caso mineiro, o aumento daria 60%.

Como agravante, ainda existem especulações de que grande parte das carteirinhas usadas é fraudulenta, ou seja, utilizadas por quem não teria, a rigor, esse direito. Na internet, é fácil encontrar softwares para confecção de carteirinhas e certificados estudantis. No final das contas, esse benefício acaba virando o vilão da história e impulsionando o preço para cima.

Para comprovar este enredo do preço, digno de um filme de terror, realizamos uma pesquisa sobre o valor do ingresso em mais de 15 grandes cidades do mundo, convertendo os preços em dólares e, na sequência, no número de horas que, em média, um cidadão teria que trabalhar para pagar o ingresso. Vale lembrar que a simples comparação de preço em dólares não é razoável, uma vez que o custo de vida e a renda da população variam muito.

O gráfico a seguir  mostra, em horas de trabalho, o preço dos ingressos de cinema nos países pesquisados:

[caption id="attachment_1751" align="aligncenter" width="481"] Horas médias trabalhadas para se comprar um ingresso. Fontes: Redes de cinema locais e WorldBanck; Elaboração própria.[/caption]

Nota-se que o Brasil amarga a posição de ter o 4º cinema mais caro do mundo. Este resultado final é dramático, e faz os amantes brasileiros do cinema chorarem de raiva (só não mais que os amigos indianos, chineses e nigerianos).

Curioso notar que, dentre os países pesquisados, não por coincidência, apenas a Nigéria, detentora do posto de ingresso mais caro do mundo, possui uma política de meia entrada – aliás, bastante semelhante à nossa.

Em alguns países, são oferecidos descontos, em torno de 30%, para idades especificas como crianças, jovens e idosos.

Os dados merecem reflexão e, como em um filme de ação, uma revisão na política de incentivos à cultura, uma vez que estes estão servindo mais para aumentar os preços do que incentivar o cinema.

Os que não são estudantes e não fraudam a carteirinha acabam pagando mais do dobro do preço do que nos demais países – um verdadeiro drama.

Uma das possibilidades para mitigar o problema seria oferecer descontos de acordo com a idade – seria uma forma mais justa e que dificultaria a fraude .

Outro ponto é que a cultura deveria ser acessada por todos, e talvez estratificar não resolva o problema do setor.

Um cinema mais barato para todos, e não para uma parcela, é mais vantajoso tanto para o país quanto para as redes de cinema – afinal, cinema não tem idade –quem sabe ainda há tempo para um final feliz.

Obs : Os dados usados para o cálculo da média de horas trabalhadas e renda, foram obtidos a partir do banco de dados do World Bank. Os preços de ingressos foram obtidos a partir do filme “ O Hobbit“, em seções de Sexta ou Sábado, todos em caráter de estreia. A cotação do dólar usada na conversão de preços de moedas locais para dólar foi a do dia 09/01/2013.

Por Victor Candido e Samy Dana

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Victor Candido

Mestre em economia pela Universidade de Brasília (UnB). Economista pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Foi economista-chefe de uma das maiores corretoras de valores do país, economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento e atualmente é sócio e economista de uma gestora de fundos de investimento. Foi pesquisador do CPDOC (O Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) da FGV-RJ. Ajudou a fundar o Terraço Econômico em 2014.

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