Não existem economistas bonzinhos ou malvados: a diferença está no método

Ultimamente, no Fla-Flu político e econômico, muita gente tem a impressão que existem duas castas de economistas. A primeira é formada pelos economistas “malvados”, aqueles que defendem a contenção de gastos do governo – e consequentemente a PEC do Teto dos Gastos, aprovada no Senado, assim como também defendem a Reforma de Previdência. A segunda seria caracterizada pelos chamados economistas “bonzinhos”, que criticam o controle dos gastos públicos assim como bradam sem rodeios que a Reforma da Previdência é inconstitucional e os direitos adquiridos pela sociedade não merecem ser debatidos e alvos de reforma neste momento – por mais que a proposta enviada pelo governo recentemente não inclua nenhuma alteração dos direitos adquiridos, se seguirmos a letra da lei sobre o que estes significam.

capturar Encontre os bonzinhos e os malvados na foto acima.

Notem, leitores, que essa visão não auxilia em nada o debate do presente momento. Quando falamos em economia (obviamente sem restringir suas sinergias com a política), não devemos acreditar na retórica segundo a qual existem aqueles que são “os malvados da história”, simplesmente pelo fato de mostrarem a verdade dos fatos. Sim, porque a verdade é dura demais. Mas, então, o que vale mais: mostrar a real situação das contas públicas e ser rotulado de neoliberal, rentista e elitista ou esconder o jogo e fingir que está tudo bem?

O ponto é inequívoco: os dados mostram como os gastos públicos seguem uma trajetória ascendente – tendo inclusive superado as receitas recentemente – e, quando as receitas caíram devido à crise econômica, essas despesas do governo não caíram na mesma velocidade () [1]. Na mesma toada, como a previdência social corresponde a boa parte do gasto total do governo brasileiro [2], uma reforma também seria necessária, haja vista a limitação do gasto real aprovada pela PEC. Você pode encontrar muitos desses artigos aqui no ou em outros blogs/sites de economia.

Algo que precisa ficar claro é que, independente da visão que você tenha, é sempre salutar acompanhar o que ocorre do outro lado do debate – por motivos claros: para verificar se o que lhe parece óbvio realmente o é e também para provocar em sua própria mente a reflexão que uma ciência social como a economia demanda.

Esse costuma ser outro divisor de águas entre os economistas ditos bonzinhos e os malvados: o método de análise. Há economistas que utilizam métodos científicos para averiguar se uma premissa é verdadeira, enquanto outras preferem a análise histórica do problema. É exatamente neste ponto que vale a pena uma reflexão importante: é mais válido ficar apenas com os dados ou somente com as suposições? A ideia de acompanhar o debate econômico é justamente poder formar alguma opinião observando os dois – quando não múltiplos – lados.

Outro ponto importante a se pensar é que, mesmo ao tratar-se de um debate direto entre ideias bastante diferentes podemos encontrar algumas razoáveis e outras que parecem não ter nenhuma conexão com a realidade; afinal, todos os economistas sérios apresentam suas ideias visando o melhor para a economia e a sociedade. Podem ser desde ideias de restrição dos gastos públicos até outras de ampliação destes, mas o objetivo é o mesmo: de melhorar a economia. É muito difícil encontrar um economista sério que diga “e penso em tais medidas porque elas complicam a vida de todos e pioram a economia”.

Algo que pode ajudar nessa formação de opinião sobre o andamento da economia é uma análise histórica do que já ocorreu dentro de um país. Por exemplo: nos anos 1980 tivemos no Brasil uma quantidade considerável de experimentos econômicos heterodoxos que buscavam encontrar uma solução aos problemas, dentre eles, o congelamento de preços – que resultou em menor acesso a produtos e, em vez de resolver o problema, apenas o aumentou. Por algum motivo, decidiu-se nos últimos anos repetir a experiência com os preços dos combustíveis e da energia elétrica e, adivinhem? Os resultados foram análogos: preços maiores e outras jabuticabas.

Toda dicotomia direta – bem e mal, ótimo ou péssimo, heterodoxia pura ou ortodoxia ao máximo – mostra extremos que não necessariamente são saudáveis. Lembremo-nos, por exemplo, que o Programa Bolsa Família foi modelado por um economista tido como liberal e de formação conhecida como ortodoxa (Ricardo Paes de Barros). De maneira análoga, as medidas de ampliação do crédito no pós-crise de 2008 realmente fizeram o Brasil sofrer menos com a crise do que muitos outros países do mundo (ao menos naquela ) – isso sem falar em outras medidas como a lei de falências e a criação do crédito consignado, também desenvolvidos por economistas tidos como liberais durante o governo Lula.

Por fim, é preciso estar atento e manter o ceticismo sobre economistas que tenham muito mais certezas do que dúvidas, pois a economia é uma ciência social sem respostas fechadas. Ou melhor, como diria o gênio Millôr Fernandes:

“Se você não tem dúvidas, é porque está mal informado…”

Arthur Solow – Editor Terraço Econômico

Caio Augusto – Editor Terraço Econômico

Notas

[1] https://www.nexojornal.com.br/grafico/2016/10/26/As-receitas-e-despesas-do-governo-federal-desde-1997 [2] http://www.valor.com.br/brasil/mosaico-orcamentario

Arthur Solow

Economista nato da Escola de Economia de São Paulo da FGV. Parente distante - diz ele - do prêmio Nobel de Economia Robert Solow, que, segundo rumores, utilizava um nome artístico haja vista a complexidade do sobrenome. Pós graduado na FGV em Business Analytics e Big Data, pois, afinal, a verdade encontra-se nos dados. Fez de tudo um pouco: foi analista de crédito e carteiras para FIDCs; depois trabalhou com planejamento estratégico e análise de dados; em seguida uma experiência em assessoria política na ALESP e atualmente é especialista em Educação Financeira em uma fintech. E no meio do caminho ainda arrumou tempo para fundar o Terraço Econômico em 2014 =)
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