Não vamos cumprir a meta fiscal

Largamos tão mal quanto o Usain Bolt. Largamos tão mal quanto o Usain Bolt.[/caption]

O nosso querido velocista Usain Bolt é famoso por largar mal. Mas logo após os 20 metros o jamaicano dá um sprint e vence com facilidade. Com folga para até dar uma desacelerada no final. A cada corrida, ele bate seus próprios recordes, de centésimo em centésimo (dizem as más línguas que seu contrato de patrocínio prevê bônus por quebra de recordes. Neste caso, realmente quebrar o próprio recorde umas três vezes por ano parece ser uma boa ideia).

Mas o que ele tem a ver com o nosso ministro Joaquim Levy como sugere nosso título? Bom, parece que nosso ajuste fiscal tem um estilo um tanto quanto “Bolt” de ser: estamos buscando economizar 1,2% do nosso PIB antes do pagamento de juros – o superávit primário – para reestabelecer a sanidade das contas públicas, mas dada a lenta largada, precisamos dar um Sprint no final, só que, ao invés de centésimos de segundo, estamos falando de bilhões de reais. Vamos aos números:

Com o resultado do primeiro trimestre divulgado (economizamos R$ 3,6 bilhões), largamos mal, igual ao velocista!

O gráfico abaixo mostra o resultado primário do Governo Central em relação à sua arrecadação desde 1997 separado por trimestre.

Resultado Primário do Governo Central por Trimestre 1997-2015. [caption id="attachment_3957" align="aligncenter" width="716"]Fonte: Tesouro Nacional. Elaboração própria. Fonte: Tesouro Nacional. Elaboração própria.[/caption]

Repararam que, desde o início de nossa série, o resultado é sempre melhor nos dois primeiros trimestres do ano? Isso é compreensível dada a maior arrecadação que ocorre no verão e no outono na Terra Brasilis. Esta maior arrecadação é a oportunidade que temos para pular à frente na largada, se quisermos economizar ao longo do ano fiscal. Mas, em 2015, não mantivemos o padrão e isso pode nos custar o atingimento da meta.

Assim, o pífio resultado do primeiro trimestre de 2015 está bem parecido com a largada do nosso jamaicano recordista mundial. E nisso concordamos com o Mansueto Almeida e com o Fernando Dantas: desperdiçamos (mais) uma chance. E ai, para vencermos os 100m rasos, qual velocidade teremos que atingir no nosso sprint dos últimos 3/4 da corrida?

Vamos a uma simplificação, sem entrar nos pormenores da sazonalidade, para entender nosso desafio:

– Acompanhando a última projeção que o FMI fez para o PIB brasileiro, de queda de 1%, o PIB no Brasil no acumulado de 2015 será de R$ 5,466 trilhões;

– O Joaquim Levy prometeu um resultado primário do governo federal de 1,2% do PIB, ou de R$ 64 bilhões;

– No primeiro trimestre de 2015 foram economizados R$ 3,6 bilhões somente, muito abaixo do que precisamos para atingir a meta proposta com folga;

– Para chegarmos à meta, então, devemos economizar nos 3 trimestres restantes algo em torno de R$ 60 bilhões. Ou uns R$ 20 bilhões por trimestre – uns R$ 6 bilhões por mês;

– Com a arrecadação na casa dos 37% do PIB o setor público terá que economizar 60 bilhões no restante do ano de um montante de R$ 1.5 trilhão que vai arrecadar de Abril a Dezembro.

– Como o Governo Central é responsável por uns 60% dessa arrecadação, resta a ele economizar na média uns R$ 4 bilhões por mês ou 4% de sua receita daqui pra frente.

O gráfico abaixo mostra o comportamento do resultado primário do Governo Central em relação à sua arrecadação e a linha pontilhada indica como devemos nos comportar na média para atingirmos a meta proposta.

Resultado Primário do Governo Central Mensal em % da Arrecadação [caption id="attachment_3956" align="aligncenter" width="724"]Fonte: Tesouro Nacional. Elaboração própria. Fonte: Tesouro Nacional. Elaboração própria.[/caption]

Além de termos que acelerar a economia ao longo do ano, estamos correndo com vento contrário. A linha de tendência indica uma queda na poupança mensal do Governo Central ao longo do tempo. Isso se dá pelo fato de a despesa ser muito difícil de ser cortada, seja por fatores legais, seja por fatores políticos.

O sprint que teremos de dar para alcançarmos a meta não é impossível. Porém, dado o histórico e o comportamento dos gastos públicos ao longo dos anos e dos trimestres e os entraves para corte de gastos, fica difícil acreditar que iremos dar uma de Usain Bolt e cumprir a meta fiscal estabelecida.

Há três fatores que podem nos dar esperança para o torcedor mais fanático:

  • repare no primeiro gráfico que de 2009 para cá o 4º Trimestre vem “diuturnamente” sendo muito bom para a poupança do Governo Central e pode nos ajudar no atingimento da meta de 1,2% do PIB. Mas algo nos diz que a modalidade não poderá ser alterada neste ano de atletismo para ciclismo;
  • como estamos vendo o resultado em relação à arrecadação, o Governo pode, ao invés de cortar os gastos, elevar sua receita. Mas numa economia estagnada, talvez isso piore ainda mais a atividade econômica;
  • nossa última esperança seria uma ajudinha dos Estados e Municípios. Como estamos olhando os gastos e arrecadação do governo central no gráfico, caso os Estados e Municípios consigam economizar mais do que suas metas nos últimos trimestres, podemos ganhar um empurrão e a meta pode ser atingida.

Tem antidoping nessa corrida?

Lara Siqueira de Oliveira

Leonardo Palhuca

     

Leonardo Palhuca

Doutorando em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg. Interessado em macroeconomia - política monetária e política fiscal - e no buraco negro das instituições. Escreveu para o Terraço Econômico entre 2014 e 2018.

2 Comentários

  1. Ótima lembrança, análise e comparação. Se me permite, acrescentaria, pelo histórico desse governo, uma comparação com Lance Armstrong… mas isso veremos no final do ano. Parabéns pelo site.

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