O Pop não poupa ninguém

Nas últimas semanas um novo rockstar econômico surgiu, o menino de ouro da Harvard Press, o sujeito que fez a tradicional editora vender como nunca antes na história daquele país (Estados Unidos): Thomas Piketty (admito que demorou uns 2 dias pra eu aprender a fonia correta). Meus amigos João e Alípio escreveram dois excelentes textos discutindo as ideias do francês do momento, mostradas em seu novo livro “O Capital no século 21” que tem lançamento já confirmado em português e mais de 600 páginas de um argumento de fôlego.

[caption id="" align="aligncenter" width="509"]Image O homem e o livro do momento. Fonte: Harvard Press[/caption]

Piketty não é o primeiro e muito menos será o último popeconomist, e em pouco tempo ele vai cair no esquecimento da mídia e voltará a ser o excelente acadêmico que é.

Mas porque tantos econoAstros?

Keynes, Lucas, Friedman, Krugman, Mankiw, Ricardo, Greenspan, Bernanke, Marshall, Roubini, Stiglitz, Shiller, Ha-joon, e os nacionais, Delfim, Mário Henrique Simonsen, Furtado, Meirelles, Samuel Pessoa, Gianneti, alguns nomes só para ilustrar os pop’s. Mas por que essa turma ficou tão famosa? Alguns de bate-pronto vão responder: são ou foram acadêmicos de grande competência e alguns deles ocuparam altos postos governamentais. Eu discordo dessa resposta. Para mim o holofote máximo é a mídia, e as ideias que esses economistas propõem ou propuseram, e tais ideias são usadas como poderosos argumentos em discussões políticas, por consequência midiática e por envolverem múltiplas interpretações e facetados pontos de vistas. E na maioria das vezes esses economistas vão de bom grado para o debate, e expõe suas ideias com veemência; aliás, nós humildes mortais do Terraço fazemos isso o tempo todo.

[caption id="attachment_630" align="aligncenter" width="508"] Vencedor do prêmio Nobel de economia, Paul Krugman um dos pop’s mais polêmicos! Fonte: Autor Desconhecido.[/caption]

Talvez a ilustração perfeita seja a dos liberais dos anos 80. Naquela época, Milton Friedman chegou a ter um programa de televisão chamado “Free to choose”. Lucas defendia abertamente o liberalismo através de suas ideias das expectativas racionais. Alan Greenspawn, outro paladino liberal, foi à mídia várias vezes e participou de inúmeros debates sobre o papel do setor financeiro na economia americana e a importância de se liberalizar o sistema financeiro. Bom, aí veio a crise do subprime em 2008, e desde então surgiu outro exército de paladinos, agora os ditos Keynesianos. Defendendo um sistema financeiro regulado e uma maior intervenção do governo. Mais uma vez, todos na mídia, defendendo suas ideias com a mesma veemência que um médico defende que beber dois litros de água por dia seja saudável e vai lhe trazer benefícios no longo prazo. Em outras palavras, os economistas, embora adorem aparecer, são usados como instrumentos de verdade, de afirmação por políticos e jornalistas, afinal de contas é sempre bom ter um prêmio Nobel defendendo algo. Dá importância, credibilidade e um ar científico.

[caption id="" align="aligncenter" width="650"]Image Milton Friedman e Keynes, ambos foram capas da revista TIME. Uma das revistas de maior circulação nos Estados Unidos. Fonte: Time Magazine[/caption]

É exatamente na última palavra do parágrafo anterior que mora o problema, científico. Mas afinal, economia é hardscience? Assim como física, matemática ou química? A resposta é não. Apesar de abraçarmos à matemática e o cientificismo dos números e simulações computacionais, não temos como base a ciência pura. Na verdade a economia é uma ciência moral, ou seja, economistas quando dão conselhos não estão se baseando apenas em seus conhecimentos de como o mundo funciona, mas também em seus julgamentos de como o mundo deveria funcionar. É como se fôssemos filósofos ao mesmo tempo em que somos economistas. Existe um conflito de metodologia de construção do conhecimento, ou seja, como uma ciência dita pura por muitos de seus membros. Existe a questão da economia positiva, que é a descrição da economia como ela é, um comportamento científico, afinal de contas algumas proposições econômicas como a lei de oferta e demanda são invariavelmente verdadeiras. E existe a visão normativa, que faz afirmações de como a economia deveria ser, e é exatamente nesse campo que as coisas podem ficar bastante distorcidas.

Para Marx, um mundo ideal deveria ser o da ditadura do proletariado, simplificando. Para Friedman, o perfeito seria um mundo de estado mínimo, onde os indivíduos fossem livres para fazerem qualquer tipo de escolha. Ou seja, uma ciência na qual os seus “cientistas” apontam soluções diferentes para o mesmo problema, no caso, o bem-estar máximo de uma dada sociedade.

Espero que quando você vir Piketty, Roubini, Krugman, ou até mesmo a gente aqui do Terraço defendendo ideias, você se lembre do meu apelo “economia não é ciência pura, não somos cientistas”, sempre que um economista está expressando certeza e em um argumento é sempre bom desconfiar, e pensar por si próprio.

[caption id="" align="aligncenter" width="361"]Image Mick Jagger que desistiu de ser economista, sim, ele largou a London School of Economics e se dedicou aos Stones. Pop por pop, Mick preferiu o rock! Fonte: Autor desconhecido.[/caption]

Se nem o papa que é pop está sempre certo, imaginem nós, meros mortais acadêmicos.

Victor Candido de Oliveira

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Victor Candido

Mestre em economia pela Universidade de Brasília (UnB). Economista pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Foi economista-chefe de uma das maiores corretoras de valores do país, economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento e atualmente é sócio e economista de uma gestora de fundos de investimento. Foi pesquisador do CPDOC (O Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) da FGV-RJ. Ajudou a fundar o Terraço Econômico em 2014.

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