A velha ilusão do pote de ouro no fim do arco íris

Uma das histórias que Benjamim Graham (mentor de Warren Buffet)  gostava de contar em suas palestras era a de um  homem do petróleo que foi para o céu e pediu a São Pedro para deixá-lo entrar, quando então este lhe disse: “Desculpe, mas a área dos homens do petróleo está cheia aqui, como você pode ver olhando pelo portão”. O homem respondeu: “Isso é muito ruim, mas você permite que eu diga apenas quatro palavras a eles?”. Ao que São Pedro respondeu: “Sem problemas”. Foi aí que o ho­mem gritou em alto e bom som: “Descobriram petróleo no inferno!”. Imediatamente, todos os homens do petróleo começaram a marchar para fora do céu e a seguir direto para as regiões baixas. Então, São Pedro disse: “Essa foi uma proeza muito boa. Agora, há bastante es­paço; venha por aqui”. O homem do petróleo coçou a cabeça e disse: “Acho que vou com o resto dos rapazes. Afinal de contas, pode haver alguma verdade nesse boato”.

Nesta história existem dois pontos interessantes: o primeiro fala da relação do boato, muito comum no mercado financeiro, o outro é ganância propriamente dita; ambos levam as pessoas a fazerem loucuras e irem “até o inferno” pra conseguirem o que querem. O inferno também  pode significar a facilidade  de se ganhar  dinheiro sem muito esforço, conforme o título do artigo enuncia. Mas o que leva as pessoas a serem enganadas ou se iludirem com tanta facilidade? Vamos analisar algumas características que há muito tempo são estudas em finanças  comportamentais, explicando  o que leva as pessoas a fazerem estas loucuras, seja no mercado  financeiro, ou em investimentos mirabolantes de pirâmides financeiras (de tempos em tempos enunciados como marketing de multinível).

Recompensa

Quando percebemos alguma coisa valiosa em nosso sistema de recompensas, desejamos a posse do objeto de nossa atenção.  Este sistema de recompensas é composto por neurônios que, predominantemente, se comunicam por intermédio do neurotransmissor. A dopamina tem sido chamada de “química do prazer” porque as pessoas que são eletricamente estimuladas por ela sentem uma intensa sensação de bem-estar.

Em um famoso experimento realizado em 1954 [1], pesquisadores colocaram eletrodos no “centro do prazer” do cérebro de ratos. Quando era dada aos ratos a oportunidade de pressionar uma alavanca para estimular esse centro, eles o faziam compulsivamente. Na verdade, muitos dos ratos morreram de exaustão. Os ratos recusavam comida, água e até mesmo sexo, preferindo a auto-estimulação com os eletrodos. A princípio, a dopamina recebeu todos os créditos pelo comportamento dos ratos na busca desenfreada por prazer. Pesquisas posteriores revelaram que os eletrodos estimularam mais do que apenas o suprimento de dopamina no cérebro. Eles também desencadearam a liberação de opiáceos e endorfinas no cérebro dos animais. Hoje, já se sabe que a dopamina atua no sistema de recompensa de três maneiras: (1) motivando a busca por recompensa (2) melhorando o aprendizado e (3) aumentando a concentração e a atenção. Os efeitos psicológicos da liberação de dopamina incluem: melhora do humor, euforia e entusiasmo.

Auto confiança & Arrogância

“Há dois tipos de pessoas que perdem dinheiro: aquelas que não sabem nada e aquelas que sabem tudo!”

  1. Lenzner

O excesso de confiança quanto às suas habilidades, de modo geral, pode afetar seu futuro financeiro. Um exemplo voltado às finanças: começar um negócio é um investimento arriscado, e, de fato, a maioria dos novos negócios fracassa. Quando perguntaram [2] a 2.994 donos de novos negócios sobre suas chances de sucesso, 70% disseram acreditar que seriam bem-sucedidos, mas somente 39% disseram que qualquer negócio como o seu teria as mesmas chances de sucesso. Por que razão alguns novos empresários acreditam ter aproximadamente o dobro de chance de sucesso? Por puro excesso de confiança. De acordo com uma pesquisa do jornal Washington Post [1], 94% dos americanos disseram que estão “acima da média” em honestidade; 86%, “acima da média” em inteligência; e 19%, “acima da média” em beleza física. O problema com a autoconfiança é o excesso. Como vimos na pesquisa do Washington Post, a maioria dos americanos é excessivamente confiante. Em muitas áreas, acreditar nas próprias habilidades pode gerar uma profecia auto-realizável de sucesso, mas no mercado financeiro o excesso de confiança prejudica seriamente a performance e os resultados.

Podemos lembrar das bolhas financeiras, no ano de 2000. As ações da Internet estavam, claramente, experimentando uma bolha financeira. Ainda assim, os investidores continuavam a despejar dinheiro nelas de modo frenético — como se estivessem esperando, confiantemente, que um tolo ainda maior do que eles próprios pudesse comprar deles aquelas ações, por um preço ainda maior, em algum momento do futuro. Em minha mente, não havia melhor exemplo de arrogância. A arrogância é um dos estados emocionais mais perigosos que um investidor pode experimentar, já que, com freqüência, ela antecede os momentos das maiores perdas.

Uma pesquisa da Gallup/Paine Webber [2] com investidores individuais, no início de 2001, demonstrou esse excesso de confiança. Chamou a atenção o fato de muitos dos pesquisados terem tido algum resultado negativo recente, logo após o colapso da bolha das ações de tecnologia. Quando lhes perguntaram qual seria o retorno no mercado de ações nos doze meses seguintes, responderam, em média, 10,3%. Quando perguntaram quanto esperavam ganhar com seu portfólio, a resposta foi, em média, 11,7%. Em geral, os investidores sempre esperam retornos acima da média.

Efeito Manada & Prova Social

É relativamente fácil ver efeitos manada se observarmos para onde o dinheiro está indo e também onde está concentrada a atenção da mídia. No entanto, não é fácil identificar onde está a próxima (nova) pastagem. Além disso, é especialmente difícil precaver-se para não entrar no efeito. A pressão social e dos pares pode ser realmente intensa. A presença de líderes carismáticos ou autoritários impede, com freqüência, a dissensão. Afinal, soa socialmente inaceitável contradizer o líder do grupo, mesmo quando os membros são encorajados a fazê-lo. E por isso que a deferência à autoridade também provoca o efeito manada.

Nos mercados, o comportamento de manada usualmente resulta em perdas para os retardatários. Os investidores que sucumbem à “prova social” e ao “efeito manada” dependem da tomada crítica de decisão de outras pessoas. Quando se prova que o líder está errado, a maioria dos investidores que o seguiam perde a fé e debanda. Entretanto, em muitos casos, intensos mecanismos de defesa são acionados, impedindo que alguns do grupo reconheçam que suas crenças e seus líderes estão errados.

Com freqüência, aprendemos o que devemos fazer em uma situação incerta simplesmente observando outras pessoas. Ficamos esperando a ação dos outros para confirmar o curso correto de nossa própria ação, em vez de assumir a responsabilidade de compreender o que está acontecendo. O psicólogo Robert Cialdini chama essa busca por confirmação de “prova social”. A validação social nos fornece um atalho mental. Em vez de elaborar e solucionar cada passo de um problema, optamos por simplesmente observar nossos amigos e colegas e seguimos suas dicas. Conforme escrito por Rolf Dobelli [3] a “Prova social, às vezes indistintamente designada como instinto gregário, significa: comporto-me de modo correto quando me comporto como os outros. Em outros termos: quanto mais pessoas acharem uma ideia correta, mais correta essa ideia será — o que, naturalmente, é absurdo”.

Esta prática de efeito manada, conforme visto, foi um dos motivos da bolha da Internet, no início deste século. Mesmo após a nova economia da Internet ter se mostrado uma fantasia, muitas pessoas que acreditavam piamente nas ações continuaram com tal proselitismo. Isso nao só acontece no mercado financeiro: de tempos em tempos aparecem pseudo-empresas vendendo produtos  magníficos e revolucionários; o problma é que usam como estratégia  de venda o conhecido marketing  de multinivel ou pra alguns  como um complexo golpe de pirâmide. O marketing multinível é uma prática existente no mundo, mas no Brasil acaba designando esquemas fraudulentos. O meio de identificar uma pirâmide financeira é relativamente simples: observe qual a maior fonte de receita da empresa; se for parte considerável algo como a “entrada de novos vendedores” e não as receitas advinda da prestação de serviço ou venda do produto, há uma possibilidade imensa de fraude [6].

Independente  do nome da estratégia, os responsáveis por esses negócios escusos  usam técnicas de aproximação de novos membros que remetem a este pote no fim do arco-íris, ou melhor, a conseguir dinheiro fácil sem muita dificuldade. Basicamente angariam pessoas, que então precisam selecionar outras pra entrarem no “esquema”; todas precisam  entrar com um investimento  mínimo, que são  repassados  para os que estão  acima da estrutura. Para que o esquema tenha sucesso, é feito uma triagem da rede de contatos destas pessoas e convidam  para uma reunião, no qual apresentam o negócio  e mostram as “recompensas” de entrarem  no time. As pessoas que sempre apresentam o negócio são líderes carismático que usam a auto-cofiança e a prova social, mostrando supostamente que todos podem ser vencedores e realizar seus sonhos. Além disso  mostram como várias  pessoas  estão ganhando  dinheiro (efeito manada). Estas reuniões são espetáculos e até mesmo as pessoas mais racionais envolvidas saem determinadas a angariar mais gente para o esquema. O próprio Bill Ackman que é dono da Pershing Square, um fundo de investimentos com mais de 12 bilhões de dólares em carteira [4], vem tentando há quase três anos provar que a Herbalife é um esquema de pirâmide. Além disso, o investidor aponta que os revendedores ganham mais dinheiro angariando novos membros para a rede do que vendendo produtos, de fato, sendo que a maioria dos que entram neste tipo de negócio perdem dinheiro.

Por que alguém continuaria a se identificar com o tal estilo de pensamento que provara estar errado e, ainda por cima, continuar a falar sobre ele? É muito difícil para algumas pessoas aceitar a derrota. Assim, em um movimento remanescente de aversão à perda, elas se agarram a qualquer sinal de esperança, tentando até mesmo conseguir novos adeptos. Na cabeça desses indivíduos, quanto maior o número de pessoas que acreditam em sua doutrina, mais provável que eles estejam certos. “Comportamento de manada e investi­mento”, que começava citando o dito sarcástico de Keynes: “O senso comum ensina que é melhor para nossa reputação fracassar de modo convencional que ter êxito de modo não convencional.”

Scharfstein e Stein [5] construíram um mo­delo matemático demonstrando que, em certas circunstâncias, é melhor estra­tégia para administradores de investimentos imitar as ações dos outros do que confiar no próprio discernimento. O ambiente do modelo de Scharfstein-Stein era um pouco diferente do contexto do Concurso de Beleza, mas o raciocínio que o motivava era o mesmo: se um administrador de investimentos ou revendedor de cosméstios seguir a multidão, e as coisas derem errado, ele dividirá a culpa com os outros; se ele seguir uma estratégia contrária, será o único responsável por seus erros.

“O que quer enriquecer depressa é homem de olho maligno, porém não sabe que a pobreza há de vir sobre ele”. Provérbios 28:22

 

Anderson Pizzutti Bortolotto – Formado em Física pela UEL e Administração de Empresas pela FECEA, como especialização em Engenharia de Produção e Educação Matemática pela UEL. Consultor em Finanças e Controladoria, além de ser professor de Física. Possui mais de 12 anos de experiência na área financeira e controladoria de empresas de grande e médio porte pelo Brasil. Também atuou no Mercado financeiro como Analista de Investimentos em um Fundo de Investimentos. Apaixonado por números, investimentos e cortar custos, além de mudar a sorte das empresas, principalmente aquelas com graves problemas financeiros.

Notas [1] Desvendando a Mente do Investidor – O Domínio da Mente Sobre o Dinheiro –  Richard Peterson [2] A Lógica do Mercado de Ações – JOHN R. NOFSINGER [3] A Arte de Pensar Claramente – Rolf Dobelli [4] http://veja.abril.com.br/economia/fracassa-nova-tentativa-de-bill-ackman-de-provar-que-herbalife-e-piramide/ [5] Como Os Mercados Quebram – a Lógica Das Catástrofes Econômicas – John Cassidy [6] http://exame.abril.com.br/pme/afinal-qual-a-diferenca-entre-piramide-e-marketing-multinivel/

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