O candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, voltou a repetir o mantra de que a recessão econômica ocorreu devido à “sabotagem política” sofrida pelo governo Dilma Rousseff no Congresso Nacional. De acordo com o petista, a então Presidente tentou reequilibrar o lado fiscal do país, porém não teve as medidas aprovadas pelo Congresso, que ainda promoveu aumentos de gastos, através da “pauta-bomba”. Será que isso, de fato, aconteceu?
Entre 2015 e abril de 2016, quando Dilma sofreu o impeachment, o governo fez uso de alguns instrumentos para conter a evolução do déficit fiscal. O contingenciamento de gastos foi o mais utilizado, começando em janeiro de 2015, com um bloqueio de R$ 22,8 bilhões nos gastos de custeio. Logo depois, em maio de 2015, houve a eliminação de R$ 69,9 bilhões em despesas públicas, e por fim, encerrando o ano com um novo bloqueio, de R$ 10,7 bilhões. Ainda no início de 2016, em fevereiro, quando o governo Dilma já se encaminhava para o fim, houve outro contingenciamento, com valor de R$ 25 bilhões.
De acordo com estudo da IFI, em 2015 houve recorde em contingenciamento de despesas pelo Governo Federal entre os anos 2010.
O corte de gastos via contingenciamento é mais fácil, por ocorrer via decreto, sem necessidade de aprovação pelo Congresso. Porém, trata-se de uma medida com efeito limitado, e em alguns momentos, negativo. Os gastos cortados via contingenciamento são de despesas discricionárias, deixando as despesas obrigatórias continuarem crescendo. Ou seja, é como tomar aspirina para curar uma dor de cabeça causada por uma crise de hipertensão.
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Tratadas como as principais medidas para conter o crescimento dos gastos, as MPs 664 e 665 foram aprovadas pelo Congresso em maio de 2015. Ambas reviam as regras para concessão de seguro-desemprego, abono salarial, seguro-defeso, pensão por morte e auxílio-doença. Inicialmente, o governo previa economizar R$ 18 bilhões por ano com as medidas, entretanto essa economia acabou reduzida, entre 3 e 4 bilhões de reais, a partir das negociações para aprovação das medidas pelo Congresso Nacional.
Outra proposta apresentada pelo governo foi a PEC 87/2015, em julho de 2015. Ficou conhecida como “PEC da DRU” e previa a prorrogação da Desvinculação de Receitas da União, entre elas aquelas vinculadas ao financiamento da Seguridade Social, como PIS/COFINS e CIDE, até um limite de 30% para aumentar a liberdade no remanejamento de receitas do Orçamento Público. O mecanismo seria encerrado em dezembro de 2015. O projeto foi defendido por Dilma, na abertura dos trabalhos do Congresso em fevereiro de 2016.
Este projeto pouco andou no Congresso Nacional durante o governo Dilma, sendo aprovado após a posse de Michel Temer. Porém, também não teria influência na redução dos gastos públicos, pois trata-se de uma forma de flexibilizar a movimentação orçamentária da União.
A principal pauta-bomba, que poderia elevar o gasto público em quase R$ 270 bilhões em cinco anos, era a PEC 1/2015, conhecida como PEC da Saúde. Ela previa o aumento do percentual investido pela União na Saúde Pública, saindo de 15% até chegar em 18,7%. A proposta teve tramitação normal e foi levada para votação em plenário, no primeiro turno, em março de 2016. Na votação, o então líder do governo Dilma, José Guimarães (PT-CE) apresentou uma Emenda Aglutinativa Substitutiva, que acabou sendo aprovada no lugar da PEC. Com ela, ao invés de 5 anos, a elevação do percentual seria distribuída em 7 anos. Com sua aprovação, o texto voltou à comissão especial para rediscussão, a fim de ser votado em segundo turno. Desde então, não retornou mais à pauta de votações.
Tramitação semelhante teve a PEC 443/2009 , que fixava os salários da Advocacia-Geral da União (AGU), da carreira de delegado da Polícia Federal, das carreiras de delegado de Polícia Civil dos estados e do Distrito Federal e dos procuradores municipais a 90,25% do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A proposta teria impacto de R$ 2,4 bilhão nas contas públicas, de acordo com o Ministério do Planejamento à época. Ela foi aprovada em primeiro turno na Câmara em agosto de 2015, porém não retornou à pauta para ser apreciada no segundo turno.
Dilma havia vetado reajuste de salários entre 53% e 78% para servidores da Justiça Federal. O impacto da derrubada desse veto seria de R$ 36 bilhões, em quatro anos. Pois em novembro de 2015, o Congresso analisou e manteve os vetos da Presidente, mesmo com a maioria votando pela derrubada, não foi possível atingir o número necessário para derrubá-los. Desta forma, o argumento petista não se sustenta na realidade. E fato, o Congresso votou matérias que poderiam elevar o gasto público. Entretanto, nenhuma foi aprovada e promulgada a tempo, com a maioria ainda em análise por Câmara e Senado até a atualidade. Também aprovou itens de interesse do governo no controle dos gastos, como as MPs 664 e 665. Foi o governo que demorou a lançar medidas efetivas para conter o gasto público, como a Reforma da Previdência. De acordo com o ex-ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, a reforma proposta por Temer englobava itens da proposta que estava quase pronta. Tentar reescrever a história, em tempos de amplo acesso às informações, é praticamente impossível. Victor Oliveira Mestrando em Instituições, Organizações e Trabalho (DEP-UFSCar). E-mail: [email protected]