A guerra comercial é fake news?

Com os sinais crescentes de que uma guerra comercial é possível e que o sistema comercial multilateral pode não ser capaz de evitá-lo, um grupo de pesquisadores tentou quantificar o impacto de uma mudança nas tarifas em todo o mundo se os países mudassem do sistema de tarifas cooperativas dentro da OMC (Organização Mundial do Comércio) para o estabelecimento de tarifas não cooperativas fora dela.

O resultado encontrado por Alessandro Nicita, economista da Unctad, Marcelo Olarreaga, professor de economia da Universidade de Genebra e Peri da Silva, professor adjunto da Kansas State University, é de que uma guerra comercial com países que exploram seu poder de mercado levaria a um aumento de 32 pontos percentuais na proteção tarifária enfrentada pelo exportador mundial médio.

“A cooperação multilateral na política comercial é a salvaguarda contra as guerras comerciais. Quando os governos definem a política comercial fora dos acordos comerciais, eles exploram seu poder de mercado deslocando a demanda doméstica para produtos produzidos internamente e longe de produtos produzidos no exterior”, apontam os economistas em seu estudo.

Guerra fria?

O desenrolar de guerra comercial internacional parece ter efeitos devastadores, como argumenta o estudo. Essa guerra, contudo, ainda parece estar muito no campo das palavras. Apesar de a imposição de tarifas entre os EUA e a China já ultrapassar a casa do bilhão de dólares, as ameaças não têm se concretizado no mesmo nível das disparadas ácidas de Donald Trump. O presidente norte americano até sinalizou recentemente a sua intenção de retornar ao Tratado do Transpacífico (TPP), que deixou logo no início de seu mandato.

Ainda assim, um outro estudo argumenta que mesmo uma “Guerra Fria Comercial” pode pesar sobre o desenvolvimento econômico global. Uma das principais ameaças são as constantes incertezas sobre a solidez de acordos deste tipo. Os economistas Jerónimo Carballo da universidade de Colorado-Boulder, Kyle Handley da Universidade de Michigan e Nuno Limão da Universidade de Maryland, pontuam que as recessões econômicas podem ser tanto uma causa quanto um efeito de incerteza.

Índice de incerteza na política comercial, 2006-2017

[caption id="attachment_11840" align="aligncenter" width="369"] Pontos isolados e curva média.[/caption] “A incerteza tem repercussões internacionais que podem ser mitigadas através de acordos comerciais internacionais credíveis, como o NAFTA, que forneceu às empresas americanas um valioso seguro contra a ameaça generalizada de uma guerra comercial global durante a crise de 2008. No entanto, o valor de credibilidade e seguro desses acordos está sendo superado por eventos como o Brexit, a renegociação do NAFTA e as ameaças dos EUA de uma guerra comercial, que marca o início de uma ‘guerra fria comercial’”, destacam.   Mercados

A consultoria Capital Economics pontua em um relatório recente que a principal maneira pela qual as tarifas prejudicariam a economia mundial no curto prazo provavelmente seria através de seu impacto nos mercados financeiros e na confiança das empresas. “Se os Estados Unidos e a China acabarem puxando a ponte levadiça uns para os outros, maiores níveis de incerteza e uma significativa queda do mercado podem desencorajar o investimento empresarial e pesar no crescimento global”, explica o economista global da Capital Simon MacAdam.

Para o economista global do UBS, Paul Donovan, a resposta da China aos EUA de elevar os impostos para alguns produtos importados não significa que esteja declarada uma “guerra comercial”.

“A China indicou que seria rude não responder. No entanto, esta não é uma guerra comercial. Os jornalistas sensacionalistas que usam as palavras “guerra comercial” não criam uma guerra comercial. Uma ruptura significativa no comércio tornaria uma guerra comercial, e nós não temos isso. O déficit comercial dos EUA não deve melhorar, é claro”, destaca Donovan.

Formal, ou não, o tema voltou à mesa e os novos capítulos serão acompanhados muito de perto. Em uma análise publicada esta semana, o Credit Suisse reconhece que os investidores estão cada vez mais ansiosos sobre o tema e, com isso, optou por calcular os efeitos de um clima desfavorável ao comércio internacional.

“Nosso trabalho indica que as ações cíclicas com uma alta porcentagem de vendas externas tendem a ser mais ameaçados pelo potencial de aumento das tensões comerciais. Essa exposição pode ser ampliada ainda mais pela detecção da sensibilidade ao dólar e ao mercado (beta)”, revela a equipe do banco, que preparou uma lista de empresas que poderiam ser mais afetadas:

 

E como sabemos que o mercado financeiro vive de notícias, verdadeiras ou não, a noção do impacto de um evento global como este pode fazer a diferença. Segundo o primeiro estudo citado, os exportadores dos EUA enfrentariam um aumento de 27 pontos percentuais nas tarifas externas e os chineses e europeus experimentariam aumentos similares nas tarifas externas. “Alguns países pequenos e pobres, como o Haiti e Honduras, experimentariam aumentos muito maiores nas tarifas. Esses resultados sugerem que uma guerra comercial completa não teria vencedor”, concluem.

Gustavo Kahil Fundador da Money Times.

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