Crimes transnacionais: gangues, armas, drogas e desenvolvimento da América Latina

No dia 1º de dezembro foi realizado em Harvard um seminário sobre Segurança e Desenvolvimento sobre crimes transnacionais: gangues, armas, drogas e desenvolvimento da América Latina com Ricardo Hausmann, João P. de Mello, Steven Dudley e Daniel Mejia, moderado por Thomas Abt. Aqui está um resumo para os leitores do Terraço Econômico sobre os principais pontos debatidos neste evento.

A violência é um dos principais problemas da América Latina. Segundo Ricardo Hausmann diretor do Center for International Development na Universidade de Harvard, a segurança está sempre entre as três principais preocupações na população da região. Ainda segundo ele, a violência tem um peso enorme no bem-estar das pessoas bem como na qualidade de vida. A população que vive em regiões violentas não só muda de comportamento como também começa a ver o mundo de maneira diferente, com outros valores. Por todos esses motivos é fundamental que os economistas ajudem a responder a seguinte pergunta: como os Estados podem construir uma capacidade para garantir segurança aos seus cidadãos?

O crime na América Latina é dominado por organizações transnacionais relacionadas principalmente com o tráfico internacional de drogas. Essas organizações, segundo Steven Dudley, Co-diretor do InSight Crime (uma iniciativa que monitora, analisa e investiga crimes em uma cooperação entre EUA e Colômbia) podem ser divididas em 3 estratos: as organizações ligadas ao tráfico internacional de drogas (que possuem muito capital tanto econômico quanto social e político), as organizações paramilitares (que possuem independência operacional e controlam as economias locais) e as gangues de rua (que recebem colaboração da polícia e de políticos em nível local).

Segundo o economista João Pinho de Mello, Lemann Visiting Scholar na Universidade de Harvard e co-head da América Latina Crime and Policy Network (AL CAPONE) essas gangues de rua também estão infiltradas no sistema prisional. Seus líderes mesmo quando presos continuam controlando do tráfico de drogas de dentro da prisão o que acaba minando a confiança no aparato judicial. Além disso, segundo ele os grandes traficantes também atuam corrompendo políticos das mais variadas esferas. Como o mercado não é regulado, a indústria das drogas não tem condições de fazer lobby junto aos políticos, então a alternativa para conseguir influenciar no governo é a corrupção.

Para Daniel Mejia, PhD em segurança pela Brown University e secretário de segurança de Bogotá, a partir do momento que o governo abre mão de regulamentar o mercado de drogas, alguém irá fazê-lo no seu lugar. É um mercado gigantesco que movimenta bilhões de dólares e que, portanto, tem o envolvimento direto da elite econômica de cada país, o que contribui para a impunidade.

Segundo os especialistas, boa parte da excepcionalidade do crime na América Latina é explicada pelo tráfico de drogas. Outros fatores também geram violência como pobreza, desigualdade social e baixa capacidade estatal de investigar e punir corretamente os criminosos, mas é o tráfico de drogas que gera essa violência extra na região, não explicada por esses outros fatores. Um exemplo claro desse problema aconteceu recentemente na região nordeste do Brasil onde apesar da queda da desigualdade houve um grande aumento da violência nas últimas décadas (sendo que o crescimento do mercado de drogas na região pode ajudar a explicar esse paradoxo).

Também há consenso entre os especialistas de que a estratégia liderada pelo governo dos EUA conhecida como “War on drugs” foi custosa e mal sucedida. Combater as plantações de coca, a parte de menor valor agregado na indústria de drogas não é a melhor alternativa. Segundo Mejia, as ações concentradas nas rotas de distribuição das drogas deram melhores resultados, mas precisam de cooperação internacional, caso contrário o crime apenas muda de lugar. Além disso, é muito importante tratar a questão das drogas como um problema de saúde pública e não apenas criminal, diminuindo os danos para a população em geral.

Para os especialistas, também é fundamental discutir medidas de descriminalização das drogas. Quando o mercado passa a ser regulado pelo Estado, os crimes diminuem ao mesmo tempo em que aumentam as possibilidades de oferecer tratamento de saúde aos usuários. Para Dudley é um desperdício enorme de recursos colocar a força policial atrás do consumidor de maconha, por exemplo.

O modelo desenvolvido por especialistas de Harvard, conhecido por Boston Gun Project, também foi comentado pelos especialistas como algo que poderia ser testado na América Latina. Esse programa tem como objetivo conseguir um cessar-fogo focando nos grupos mais violentos, aqueles que após um trabalho de pesquisa eram identificados como os com maior probabilidade de cometerem homicídios ou morrerem em um. O sistema conta com dois pilares: um de intimidação “nós sabemos quem vocês são” e um de suporte social “mas queremos vocês de volta e oferecemos apoio da comunidade para isso”.  O problema de implementar um modelo desse tipo na América Latina é que ele precisa de muitos dados, que não estão disponíveis na região e também ele funciona melhor em nível municipal e não em organizações nacionais ou transnacionais. Além disso, se o grupo líder mais violento é eliminado, é possível induzir a violência criando uma rivalidade entre os grupos que irão lutar para conquistar aquele espaço.

Por fim, podemos concluir que a violência na América Latina é um problema grave, que reduz intensamente o desenvolvimento econômico da região, mas muito pouco estudado pela academia de forma mais metodológica. Por isso, precisamos de mais dados, estudos e testes que possam ajudar a diminuir o crime na região.

Abaixo o vídeo com o debate completo para os leitores do Terraço interessados nesse assunto.

https://www.facebook.com/HarvardCID/videos/1349040588463691/

Renata K. Velloso Médica, formada em administração pública, vive e trabalha na Califórnia.

 

Renata Velloso

Se de médico e louco todo mundo tem um pouco, Renata tem muito. Logo após se formar em Administração Pública pela EAESP-FGV, trabalhou no mercado financeiro com passagem pelo Citibank, Chase e JPMorgan. Certo dia, cansada da vida boa e rica no ar condicionado, resolveu abandonar tudo para ir estudar Medicina na Unicamp, onde se formou em 2010. Atualmente, além de ser bela e recatada, trabalha com projetos de inovação na área de saúde no Vale do Silício na Califórnia e também é autora do Criando Unicórnios, um livro de empreendedorismo para jovens e adolescentes.
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