A economia vai sofrer com a crise no mercado de carne?

Com a deflagração da Operação Carne Fraca na última sexta-feira, que descobriu esquemas para aprovar a venda de carne imprópria para o consumo e o uso de produtos fora das especificações em embutidos, por exemplo, muitos já começaram a perguntar: uma crise nesse mercado de carnes pode prejudicar o Brasil e suas exportações, fazendo a economia já combalida sofrer mais ainda?

De bate-pronto: provavelmente não.

Alguns países podem pedir inspeções mais rígidas, algumas explicações sobre o que aconteceu. Podem até proibir a importação de carne brasileira, mas isso não significa que a economia brasileira, como um todo, sofrerá um baque por conta disso.

Por que? Apesar de parecer ser um mercado imenso, com notícias sobre enormes grupos frigoríficos, as exportações de carne brasileiras ainda não são significativas a ponto de causar um grande problema, mesmo se reduzidas a zero (algo que dificilmente ocorrerá). Nossa picanha pode ser muito famosa, mas sua exportação representa menos de 3% (em valor) dos produtos que vendemos aos estrangeiros, segundo dados da ABIEC (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes).

Ainda, as exportações de carnes (in natura, industrializadas, miúdos, tripas e salgada) mantiveram-se basicamente constantes em volume ao longo de 12 anos, mesmo com os esforços de internacionalização dos grupos brasileiros.

O gráfico abaixo mostra que, apesar de as exportações em dólares terem crescido, o volume exportado manteve-se basicamente constante – efeitos de preços internacionais? Ainda, mesmo com a depreciação cambial de 2011 até 2016, o volume manteve-se constante.

[caption id="attachment_9301" align="aligncenter" width="1355"] Fonte: ABIEC e Banco Central do Brasil. Elaboração própria.[/caption]

Conforme mencionado, o gráfico abaixo ilustra a variação cambial e a proporção das exportações que o mercado de carne representa das exportações brasileiras.

[caption id="attachment_9302" align="aligncenter" width="1355"] Fonte: ABIEC, ADVFN e Banco Central do Brasil. Elaboração própria.[/caption]

Novamente, parece que a exportação de carne ficou relativamente constante como proporção das nossas exportações, rondando os 3%. Caiu a 2% após a crise mundial de 2008/2009, talvez fruto de ajustes de consumo. Mas retornou ao patamar anterior e já vem caindo desde 2014. Apesar de mantermos a nossa posição de maior exportador mundial de carnes.

No conjunto da obra, não parece que as exportações de carnes sejam tão importantes quanto o agronegócio como um todo ou quanto o minério de ferro, por exemplo – talvez haja um efeito de ser um produto muito consumido por aqui, assim pensamos que também exportamos tanto e somos muito importantes nisso. Outro ponto é que tais exportações já parecem estar em declínio desde 2014. Não há muito com o que se preocupar em termos macroeconômicos. Já em termos sanitários…

O caso investigado pela Polícia Federal é gravíssimo. Entretanto, mesmo que haja fechamento de mercados aos produtos brasileiros, o impacto na macroeconomia deve ser bastante limitado – para “acalmar” algumas mentes histéricas que já começaram a elaborar teorias conspiratórias sobre o “gigante” mercado de carnes brasileiro e algum vilão norte-americano querendo destruir essa nossa indústria tão pujante.

Mas fica a ressalva que se outros setores não analisados aqui sofrerem sanções (aves ou alimentos processados em geral, por exemplo), o impacto pode ser maior. E fica também a vergonha internacional.

             

Leonardo Palhuca

Doutorando em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg. Interessado em macroeconomia - política monetária e política fiscal - e no buraco negro das instituições. Escreveu para o Terraço Econômico entre 2014 e 2018.
Yogh - Especialistas em WordPress