Na semana que passou, provavelmente você viu filas enormes em postos de gasolina, até mesmo deve ter se aventurado em alguma fila em busca de encher o tanque do seu carro, ainda sem a nova alíquota de PIS/COFINS que aumentou. Para quem anda de carro foi uma boa prensada na carteira, deveras revoltante. Mas a culpa não foi de Temer ou Meirelles – eles foram obrigados a aumentar esse imposto – mas sim foi graças a um verdadeiro golpe de alguns deputados, que defendem meia dúzia de empresários que os elegeram, às custas do povo de um país inteiro.
No Brasil existe uma farra do boi, uma festança sem fim, um open bar bancado por toda a sociedade chamada REFIS. É um programa onde a receita federal negocia com seus devedores as suas dívidas, em termos bastantes camaradas. Experimente você ficar um ano sem declarar seu imposto de renda pessoa física…
O Refis já virou uma cultura da vida econômica no Brasil, uma vez que sucessivos REFIS vem acontecendo ao longo do tempo, ou seja, o agente econômico tem total incentivo em atrasar seus impostos e esperar pelo próximo REFIS, quando haverá um desconto generoso no montante devido e nos juros e moras incidentes – em suma, é mais barato deixar para depois. Geraldo Samor apontou brilhantemente os problemas de risco moral – moral hazard – em um post em seu site.
O governo brasileiro tem um crédito para receber de tributos atrasados, de aproximadamente R$300 bilhões. Boa parte desse dinheiro é completamente irrecuperável, pois existem empresas e pessoas que faliram ou já faleceram. A parte que sobra pode ser decomposta em duas: (1) empresas e pessoas em situação delicada, onde precisam escolher o que vão deixar de pagar para manterem suas atividades; alguns empresários em tempos de crise, na necessidade de preservarem caixa e manterem suas operações acabam por deixar os tributos em atraso e (2) indivíduos que de propósito deixam os impostos em atraso, sabendo que um REFIS salvador virá.
O grupo (1) merece atenção especial, obviamente, pois é de interesse de toda a sociedade que boas empresas, que um dia já foram boas pagadoras de tributos, mas que passam por um momento complicado fruto do ciclo econômico tenham direito a negociarem suas dívidas com o fisco, desde que provem que passam por dificuldades e que possuam condições de reverterem a marcha. Já os incluídos no grupo (2) merecem ser exemplarmente punidos, caso seja constatado que sua dívida foi apenas um movimento tático para pagar menos impostos.
O problema disso está na fiscalização: as notificações demoram anos para chegar aos devedores, quando a dívida chega ao ponto de ser executada, a justiça concede milhares de liminares que impedem a execução do débito. Esse lento processo de cobrança inclusive faz que os agentes do grupo (1) se tornem agentes do grupo (2). Outro subproduto indesejável de um perdão benevolente e fiscalização falha é que as empresas acabam por fazer capital de giro em cima do tributo não pago. Em um país onde as elevadas taxas de juros para capital de giro sufocam empresas, é bastante racional essa escolha, mesmo em tempos de bonança econômica.
O próximo REFIS está tendo seus termos discutidos na câmara dos deputados. O governo esperava uma arrecadação próxima de R$13 bilhões, porém o relator da proposta, o nobre Deputado Newton Cardoso Jr (PMDB-MG) decidiu ser mais generoso nos descontos do Refis, e caso sua proposta seja aceita e votada, a arrecadação cai para próximo de R$500 milhões, uma queda de mais de 90%. A sociedade vai arcar com os R$12,5 bilhões que o nobre Deputado deu de desconto para poucos felizes empresários e indivíduos. Samor também nota que Deputados e Senadores possuem dívidas com o fisco, na casa dos R$3 bilhões.
E o que o combustível mais caro na bomba tem com isso tudo? Tudo, pois o governo precisa urgentemente de uma nova fonte de receitas para garantir a meta fiscal desse ano. Com a atividade econômica patinando, a arrecadação não voltou e é preciso garantir o controle fiscal. Com medo de ficar sem o dinheiro do REFIS, o governo garantiu aproximadamente R$10 bilhões para esse ano com o aumento do PIS/CONFINS e ainda cortou mais R$5,9 bilhões em despesas.
O congresso nacional tomou uma medida descabida, contra a sociedade brasileira, para proteger um pequeno grupo de empresários, indivíduos e políticos. Enquanto todos nós pagamos mais impostos. Não culpe o governo Temer, culpe a câmara pelo aumento dos combustíveis, cobre a conta de quem merece ser cobrado, deputados e senadores. Lembre-se que enquanto você coloca gasolina mais cara no tanque, algum político vai estar rindo ao lado de um empresário beneficiado.