A nova regulação dos condo-hotéis

No auge da euforia com os lançamentos dos condo-hotéis próximos a dois grandes eventos mundiais que aconteceriam aqui no Brasil (Copa do Mundo – 2014 e Olimpíadas – 2016, conforme destacado no texto anterior da série de artigos em parceria com a STX), apareceram ofertas tentadoras de rendimento alto e baixo risco nesse mercado. A CVM, autarquia federal que regula o mercado financeiro, começou a olhar com mais atenção esse movimento, com o objetivo de proteger o investidor (principalmente o investidor novato, que não tinha tanto dinheiro, mas começava a se interessar pelas ofertas de condo-hotéis) e tornar essas operações mais seguras para todos os participantes envolvidos.

Afinal, sem regras bem definidas, era difícil saber quais eram os limites de atuação de cada participante e os direitos e deveres dos investidores. Na realidade, havia sim uma regulação que incidia sobre as ofertas de condo-hotéis, na verdade, duas: a Deliberação CVM nº 734, de 17 de Março de 2015 (“Deliberação CVM nº 734/2015”) e a Instrução CVM nº 400, de 29 de dezembro de 2003 (“Instrução CVM nº 400/2003”). Enquanto a primeira tratava sobre a dispensa de registro no caso de ofertas de Contratos de Investimento Coletivos (CICs), a segunda discutia as regras de distribuição de valores mobiliários. 

Quanto a esse último assunto, o entendimento que os CICs, ou seja, as ofertas de condo-hotéis configuram valores mobiliários está fundamentado por meio do artigo 2º, inciso IX, da Lei nº 6.385/76. Não havia dúvidas quanto a isso. Contudo, com o avanço das operações e ofertas de condo-hotéis em todo o Brasil, conforme relatado acima, a CVM entendeu que era o momento de chamar os grandes players do mercado e pensar formas de tornar esse tipo de investimento algo seguro e transparente. Alguns materiais extra-oficiais, como este aqui, começaram a ser divulgados discutindo maneiras de aprimorar esse mercado, mencionando cases anteriores e levantando conceitos fundamentais que envolviam o mercado de condo-hotéis. 

Foi por meio da Audiência Pública SDM 08/2016 que a CVM trouxe os participantes do segmento de condo-hotéis e discutiu alternativas e melhores práticas para aprimorar o mercado. A própria STX enviou suas contribuições, que podem ser vistas aqui. De qualquer forma, a audiência pública foi uma maneira democrática de ouvir os participantes, seja eles ofertantes, assessores legais, administradores, ou quaisquer outros que quisessem se manifestar sobre o tema. 

A nova instrução da CVM para condo-hotéis

Assim, a CVM coletou a opinião, analisou os argumentos dos participantes e, após algum período de trabalho, publicou uma nova instrução que regulava os contratos de investimentos coletivos, ou seja, a oferta de condo-hotéis: a Instrução CVM nº 602/2018, em 27 de agosto de 2018. Abaixo destacamos as principais alterações que foram realizadas nessa nova regulação:

Esta tabela ou partes dela podem ser reproduzidos desde que colocada a fonte/elaboração.
Elaboração: Terraço Econômico. Fontes utilizadas para a criação da tabela: 1) CVM edita norma para regular ofertas de condo-hotel (Folha); 2) Nova Instrução da CVM sobre condo-hotéis (Jota).

Há ainda um ponto que não foi propriamente alterado, mas foi avaliado pela CVM e rejeitado pelos participantes na Audiência Pública: a possibilidade de restringir as ofertas de CICs para investidores qualificados, ou seja, às pessoas naturais ou jurídicas que possuam, ao menos, R$ 1.000.000 (um milhão de reais) de patrimônio. Com o abandono dessa ideia, qualquer pessoa está apta a participar e entrar como investidor em uma operação de condo-hotel. O mercado entendeu que a participação do ‘varejo’ era fundamental para fomentar as operações e, adicionalmente, as alterações propostas pela autarquia para os materiais que compõem a oferta e que poderiam subsidiar uma melhor decisão por parte dos investidores.

Há um ponto da tabela acima que vale a pena discutir um pouco mais, que é a obrigação de registro da oferta na CVM. Os incorporadores e ofertantes entenderam que o crivo inicial da autarquia, apesar de tornar o processo um pouco mais moroso, dava mais segurança jurídica para as operações, uma vez que a ausência de registro poderia gerar muitas suspensões das operações já em andamento. Para que esse novo processo de validação não atrasasse o lançamento dos empreendimentos, a CVM informou que haverá o deferimento automático do pedido de registro da oferta de CICs caso a autarquia não se manifestasse após 20 (vinte) dias úteis contados do protocolo do pedido de registro.

A nova regulação e suas perspectivas

Pode-se dizer que a nova regulamentação tende a diminuir a quantidade de negócios neste modelo no setor hoteleiro, já que dificulta a realização de ofertas públicas que não cumprem as exigências da CVM. Por outro lado, a norma oferece mais segurança aos investidores e seleciona projetos de maior qualidade ao elevar o ‘sarrafo’ nas ofertas de condo-hotéis. 

O fato é que, desde a entrada da nova regulação, as operações de CICs tem se adaptado para garantir segurança e uma oferta de acordo com a legislação vigente, Conforme comentado no texto anterior desta série, as operações de condo-hotéis tem ficado na casa de R$ 500 milhões ao ano. Se pegarmos as ofertas em análise no site da CVM, válidas para 2019 e 2020, chegamos ao valor de R$ 205,5 milhões, embora neste valor não conste as que foram dispensadas de registro pela autarquia. Embora ainda tímidas, essas operações já contam com um arcabouço legal mais seguro e transparente para todos os participantes envolvidos no negócio. Essa é a condição primordial para que o mercado decole, uma vez que eventuais inseguranças jurídicas podem afugentar o interesse dos investidores.

Importante notar que ainda há uma dúvida: nos últimos artigos desta série foi falado sobre a origem desse segmento e como funciona para quem participa das ofertas de condo-hotéis. Mas não raramente há uma certa confusão na diferenciação entre os condo-hotéis e os fundos de investimento imobiliários (os FIIs). Se você também se confunde um pouco com esses temas, temos boas notícias: esse é justamente o assunto do nosso próximo artigo, então fique ligado!

Arthur Solow

Economista nato da Escola de Economia de São Paulo da FGV. Parente distante - diz ele - do prêmio Nobel de Economia Robert Solow, que, segundo rumores, utilizava um nome artístico haja vista a complexidade do sobrenome. Pós graduado na FGV em Business Analytics e Big Data, pois, afinal, a verdade encontra-se nos dados. Fez de tudo um pouco: foi analista de crédito e carteiras para FIDCs; depois trabalhou com planejamento estratégico e análise de dados; em seguida uma experiência em assessoria política na ALESP e atualmente é especialista em Educação Financeira em uma fintech. E no meio do caminho ainda arrumou tempo para fundar o Terraço Econômico em 2014 =)
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