Era década de 90. À medida que as tecnologias da informação se disseminavam, ficou claro que a simples alocação eficiente de recursos tangíveis não era mais suficiente para garantir vantagem competitiva. Os instrumentos de gestão baseados apenas em indicadores contábeis e financeiros se tornaram obsoletos, conforme apontado por Kaplan e Norton em 1997. Foi nesse cenário que surgiu uma ferramenta inovadora: o Balanced Scorecard (BSC).
Os professores da Harvard Business School, Kaplan e Norton, apresentaram o BSC como um novo modelo de avaliação de desempenho empresarial. Mais do que simples indicadores, o BSC atua na articulação e comunicação da estratégia em toda a organização, alinhando iniciativas individuais e organizacionais em busca do sucesso comum.
Desde então, o BSC evoluiu e se tornou uma das metodologias mais importantes para o planejamento estratégico, sendo amplamente adotado por grandes corporações em todo o mundo. A simples busca pelo termo “balanced scorecard” no Google retorna, atualmente, mais de 30 milhões de resultados em português, demonstrando como a ferramenta ainda continua relevante.
Para compreender a importância estratégica de uma empresa, olhamos para sua missão, valores e visão de futuro. Grandes pensadores, como Peter Drucker, destacam a vital importância da declaração de missão, que vai além do nome, estatuto ou produto. A Gestão Estratégica, segundo Gluck, Kaufman e Walleck (1980), é um sistema que combina o pensamento estratégico com a tomada de decisão operacional em todos os níveis da organização. Executar a estratégia de longo prazo no dia a dia é um dos maiores desafios das grandes corporações. Foi nesse contexto que Kaplan e Norton propuseram o BSC em 1992, como uma solução para avaliar o desempenho das organizações. O equilíbrio entre objetivos de curto e longo prazos, medidas financeiras e não financeiras, indicadores de tendência e ocorrências, e perspectivas internas e externas tornaram-se fundamentais.
Na era da competição baseada no conhecimento, a capacidade de desenvolver, fomentar e mobilizar ativos intangíveis tornou-se crítica. O BSC, indo além dos indicadores financeiros tradicionais, incorpora medidas operacionais relacionadas à satisfação do cliente, processos internos e capacidade de aprendizado e evolução organizacional. A prática do BSC não apenas conecta processos de negócios à estratégia, mas também assegura que a execução diária esteja alinhada aos interesses da organização. Essa metodologia se tornou uma peça fundamental na gestão estratégica das corporações modernas (De Sordi, 2018).
O BSC propõe a avaliação dos resultados da organização através de quatro perspectivas, conforme figura 1.
Na abordagem da Perspectiva Financeira, o enfoque recai sobre os objetivos financeiros de longo prazo das empresas, que se traduzem na geração de retornos superiores ao capital investido. O Balanced Scorecard (BSC) propõe uma visão integrada, onde os objetivos financeiros atuam como a espinha dorsal, orientando as metas e medidas nas demais perspectivas. Isso evita que os objetivos se tornem desconexos, proporcionando uma narrativa coesa da estratégia organizacional, desde os objetivos financeiros de longo prazo até os processos de clientes, internos e de funcionários (Kaplan e Norton, 1997).
Na Perspectiva dos Clientes, as empresas delineiam os mercados nos quais desejam competir. Essa perspectiva enfatiza a necessidade de alinhar medidas cruciais de desempenho relacionadas aos clientes, como satisfação, fidelidade e lucratividade. Kaplan e Norton (1997) destacam as limitações das medidas financeiras tradicionais, que muitas vezes refletem o passado, incapazes de influenciar proativamente a satisfação e retenção dos clientes. O BSC propõe esclarecer aos funcionários as ações diárias necessárias para o sucesso, alinhando objetivos com atributos como funcionalidade, qualidade, preço, experiência de compra, relações pessoais, imagem e reputação.
Na Perspectiva dos Processos Internos da Empresa, os executivos identificam os processos nos quais a organização deve buscar a excelência para atender aos interesses dos acionistas e clientes. Enquanto sistemas convencionais de medição de desempenho focam em melhorar indicadores de custo, qualidade e tempo de execução, o BSC direciona os requisitos dos sistemas internos com base nas expectativas dos participantes externos. O BSC evoluiu para incorporar o processo de inovação, destacando a importância de identificar as características dos mercados antes de desenvolver produtos e serviços. Isso não negligencia os processos operacionais, que são cruciais para oferecer produtos e serviços, além dos processos de pós-venda que mantêm os serviços após a entrega do produto aos clientes.
A Perspectiva de Aprendizado e Crescimento, a quarta e última, visa desenvolver objetivos e medidas para orientar o aprendizado e crescimento organizacional. O alcance das metas nas perspectivas financeira, de clientes e de processos internos depende diretamente das capacidades humanas e relacionadas à organização. Kaplan e Norton (1997) identificam três fontes principais de aprendizado e crescimento: funcionários, sistemas e alinhamento organizacional. Investimentos significativos em pessoal, sistemas e processos são necessários para alcançar desempenho superior, e os objetivos e medidas desses vetores são integrados ao BSC. A ausência de indicadores específicos destaca a necessidade de construí-los de forma personalizada, alinhados intimamente à estratégia de cada organização.
A integração das perspectivas com a estratégia, segundo Kaplan e Norton (1997), é implementada por meio de quatro processos básicos: tradução da visão de futuro, comunicação e ligação da estratégia, planejamento do negócio e feedback. Esses processos visam transformar a visão de futuro e a estratégia em conceitos claros e formalizados, garantindo a ligação dos objetivos estratégicos com os de todos os departamentos e colaboradores. O planejamento do negócio se torna parte integrante do plano de negócios, incluindo o planejamento financeiro. O feedback monitora o alcance dos objetivos estabelecidos, promovendo ajustes quando necessário, gerando aprendizado estratégico para toda a organização (Padoveze, 2007; Norreklit, 2000).
Buscamos avaliar a contemporaneidade da ferramenta, explorando dados provenientes da base de pesquisa Scopus[1]. Utilizamos os softwares VOSViewer e Gephi para realizar uma análise detalhada das métricas de rede. Durante essa análise, observou-se a centralidade de termos cruciais, como “gerenciamento estratégico” e “controle de qualidade”. Por outro lado, termos associados a “desenvolvimento de produtos” e “sistemas de pontuação” mostraram-se menos proeminentes.
A pesquisa bibliográfica reforça a importância do Balanced Scorecard como um diferencial estratégico em um mercado altamente competitivo. A crescente atenção dedicada pelos acadêmicos nos últimos anos destaca a relevância crescente dos sistemas de mensuração estratégica, que incorporam medidas tanto financeiras quanto não financeiras. O capital intelectual, considerado vital para o alcance de metas organizacionais, é identificado e capitalizado pelo BSC, integrando desenvolvimento humano, intelectual e resultados financeiros.
Dentre as características distintivas do BSC que o tornaram globalmente reconhecido, destacam-se as relações de causa e efeito, promovendo uma integração abrangente em todos os setores da corporação. A eficácia da estratégia depende diretamente da interconexão desses elementos. O processo de feedback, corrigindo desvios indicados pelos indicadores do scorecard, é crucial para o aprendizado organizacional.
O BSC mantém sua relevância como um dos modelos de gestão estratégica mais adotados por grandes empresas desde sua criação nos anos 1990. Sua aceitação maciça na atualidade justifica-se pela sua capacidade comprovada de adaptar-se aos desafios dinâmicos do ambiente empresarial. A estrutura flexível e abrangente do BSC permite a integração eficaz de medidas financeiras e não financeiras, oferecendo uma visão holística do desempenho organizacional.
No panorama das metodologias de gestão estratégica, diversas ferramentas, como OKR, KPI, e matriz SWOT, ganharam destaque. No entanto, o Balanced Scorecard (BSC) se mantém como uma peça central e inegavelmente vital para as grandes empresas na superação de desafios e na busca por resultados excepcionais. Sua capacidade de evoluir e integrar medidas financeiras e não financeiras, proporcionando uma visão holística do desempenho organizacional, destaca-o como uma ferramenta resiliente e adaptável. A pesquisa bibliográfica e a análise de dados da base Scopus reforçam sua posição como um diferencial estratégico, evidenciando sua contemporaneidade e importância inabalável na gestão estratégica moderna.
Dessa forma, a utilização contínua e generalizada do Balanced Scorecard nos dias atuais reflete não apenas sua eficácia histórica, mas também sua capacidade de evoluir, permanecendo como uma ferramenta valiosa na orientação estratégica das organizações. A resiliência e adaptabilidade do BSC destacam-se como fatores essenciais para a sua manutenção como uma prática essencial na gestão estratégica moderna.
Eder de Souza Domingues
O autor é um profissional com formação diversificada em Matemática e Gestão de Negócios. É Mestre em Governança, Tecnologia e Inovação pela Universidade Católica de Brasília. Com uma abordagem holística, traz uma perspectiva multidisciplinar para os desafios da superação de resultados na gestão estratégica.
Notas do Texto
[1] A base Scopus é uma das principais bases de dados bibliográficos e de resumos, abrangendo diversas áreas do conhecimento, como ciências, tecnologia, medicina, ciências sociais e artes. Desenvolvida pela Elsevier, uma renomada editora científica, a Scopus é reconhecida por sua extensa cobertura global e por incluir uma ampla variedade de periódicos científicos revisados por pares, conferências e patentes.
Referências Bibliográficas
DE SORDI, José Osvaldo. Gestão por processos: uma abordagem da moderna administração. Saraiva Educação, 5ª edição, p.71. 2018.
DRUCKER, Peter. Management: tasks, responsabilities, practices. Harper & Row, p.78. 1973.
GLUCK, Frederick W.; KAUFMAN, Stephen P., WALLECK, A. Steven. Strategic management for competitive advantage. Harvard Business Review, Jul-Aug. 1980.
KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. The balanced scorecard – measures that drive performance. Harvard business review, v. 70(1), p. 71-79. 1992.
KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A estratégia em ação: Balanced Scorecard. Campus, 7ª Edição. 1997.
PADOVEZE, C.L. Controladoria Estratégica e Operacional. Cengage Learning, p. 122-123. 2007.