O caso do preço da água em São Sebastião e o falso liberalismo

Abundaram notícias sobre as fortes chuvas que vêm castigando o Litoral Norte de São Paulo desde o começo de fevereiro de 2023. São Sebastião é a cidade mais atingida. Deslizamentos de terra e enchentes são comuns nessa época do ano nesta cidade. 

Até agora, 65 pessoas já morreram devido a esses desastres.

Comovidos pelos desastres, a classe política não demorou para propor soluções para amenizar essa tragédia. Foi destinada para a região R$: 7 milhões por parte do governo federal. Muitos estabelecimentos já fazem campanha para arrecadar mantimentos para ajudar as vítimas.

De toda a cobertura exibida na TV, talvez uma tenha causado mais revolta nos telespectadores.  A reportagem foi ao vivo e o repórter relata que o litro de água estava sendo vendido a R$: 93,00 reais numa localidade próxima dali.

Levando em conta que tudo o que o repórter disse foi verdade, que o litro de água estava sendo vendido por R$: 93,00 reais (quando que em situações normais custaria R$: 2,00), há motivos econômicos para esse aumento. Numa situação de calamidade, o ofertante corre riscos que devem ser repassados para os compradores. A chance dele ser saqueado aumenta, existe o risco de outro desastre natural, risco dele mesmo sentir a falta desse insumo… Enfim, tudo isso é levado em conta nesse novo preço. 

Movido pelo interesse em ajudar as famílias desabrigadas e pelo entusiasmo do momento, o deputado federal Nikolas Ferreira criou um projeto de lei que visa criminalizar o aumento de preços, sem justa causa, de produtos essenciais nas situações de emergência social, calamidade pública e epidemia. O projeto de lei prevê multa mais detenção de 2 a 5 anos.

Vale ressaltar que no Código de Defesa do Consumidor já existe esse proibição:  

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

X – elevar sem justa causa o preço de produtos ou serviços.

O deputado mais votado da história de Minas Gerais parece ter se esquecido do discurso que defende com tanto entusiasmo. 

Tanto o projeto de lei quanto a lei que já está em vigor, dão margem a interpretações equivocadas por parte dos tribunais. Por exemplo, o termo “justa causa” não possui uma definição clara do que seja. Ora, não é natural que haja uma elevação de preços quando existe a escassez de um bem?

Outro problema é a brecha que se abre para a interpretação do termo “preços excessivos”. Qual o limite de preço para que ele deixe de ser normal e torne-se excessivo? Quem vai calcular isso? Sem a ajuda do mercado, toda a estratégia estatal vira um intervencionismo burro. Saindo da esfera jurídica e entrando na econômica, não há motivo algum para a aprovação desse projeto.

Tanto o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor quanto o projeto de lei do deputado federal atentam contra a liberdade do comerciante em vender seu produto pelo preço que ele acha justo. Ambos incentivam o comerciante a repetir a fórmula do fracasso: controle de preços, feita pelo estado, frente a uma escassez de oferta. E quem não fizer, será punido. Essa atitude vai de encontro com a maior ferramenta que a Ciência Econômico nos deu no combate à pobreza – o Liberalismo.

O problema dessa punição é o surgimento de um mercado paralelo. Se os estabelecimentos não podem vender seus produtos pelos preços que eles quiserem, nada impede de algum consumidor comprar uma grande quantidade deste produto e vender seu estoque. Esse ofertante venderá ainda mais caro, pois existe um risco adicional dele ser pego pelos “fiscais do Nikolas”. Ou seja, a medida que tinha como objetivo proteger os mais vulneráveis acaba por fazer seu exato oposto – e gerar ainda mais desabastecimentos do produto.

O papel dos preços numa sociedade de livre mercado é sinalizar a falta ou abundância de algum determinado bem. Quando existe a carestia de um bem, é natural que seu preço aumente. Essa elevação de preços sinaliza aos ofertantes que existe uma demanda que não está sendo atendida neste momento. E então é criado um incentivo para que os ofertantes vendam seus produtos nesse local – aumentando sua oferta. Com o aumento da quantidade ofertada, o preço cai. That’s all, folks.

Se, ao contrário do mercado, fosse estabelecido um controle de preços por algum burocrata estatal, qual incentivo teria o comerciante de ofertar seu produto nessa região? Por exemplo, se existe uma lei que cria um valor máximo para a venda, por que o comerciante enfrentaria estradas cheias de lama, incertezas quanto ao clima, adversidades logísticas, etc, para ofertar seu produto?

Outro ponto importante é que com a elevação dos preços, as pessoas só comprarão o essencial, evitando desperdícios. Até os mais ricos evitarão o desperdício, pois sabem que essa situação é passageira. A distribuição de pessoas que compram água se tornará mais efetiva.

Por fim, o que o estado poderia fazer para mitigar os estragos? 2 alternativas me vem à cabeça: uma provisória e outra preventiva. A primeira é a isenção dos impostos que incidem nesse produto. Como os custos ficam menores, há um incentivo para ofertar uma quantidade maior desse bem. A segunda é incentivar a leitura de livros de economia – de preferência a microeconomia – que expliquem o funcionamento do mercado para os integrantes da nossa classe política. Muito ajuda quem não atrapalha.

Maxwell Marcos
Graduado em Economia

Terraço Econômico

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