O minimalismo, como estilo de vida, é um movimento crescente no período recente, até então circunscrito ao mundo das artes visuais e originário de Nova York, em meados dos anos 50 [1], foi idealizado na contramão da exuberância dos movimentos expressionistas abstratos, procurando valorizar formas elementares, simples, geométricas, apagando o conteúdo representativo, reduzindo a forma visível à sua mais simples expressão e subtraindo o vestígio do autor, ou seja, é o que é.
Contudo, assim como toda arte, nada mais é que uma forma de expressão humana e que pode ser extrapolada e reinventada. E, mais recentemente, o conceito de minimalismo, importado das artes visuais, vem sendo adotado por pessoas comuns como filosofia de vida. Conceitualmente, existem diferentes formas de uma pessoa ser minimalista, mas todas com uma ideia de pensar antes de consumir alguma coisa, ou seja, evitar consumir por impulso ou “só porque está barato”.
[caption id="attachment_9631" align="aligncenter" width="422"] Arte minimalista, apenas simples.[/caption]Uma simplicidade voluntária, que se inicia a partir da redução do consumo e aterrisa em outras áreas da vida: trabalho, alimentação, relações e saúde. A ideia básica é viver com menos, equilibrar-se somente com o necessário, deixando de lado o que pode ser considerado supérfluo. Consumismo excessivo? Falta de tempo? Alto grau de estresse? Carga de trabalho cada vez maior? Depressão, pânico, ansiedade… Estes são alguns sinais e fatores que o minimalismo busca superar.
Enquanto os hippies e os punks pregavam sociedades alternativas, buscando mudar (de forma utópica) o status quo, os minimalistas querem apenas reduzir os ímpetos da sociedade de consumo, sem necessariamente deixar de fazer parte dela. Portanto, não estamos falando de uma subcultura, mas sim de um estilo de vida, como definiu Giddens:
Os estilos de vida são práticas rotinizadas, as rotinas incorporadas em hábitos de vestir, comer, modos de agir e lugares preferidos de encontrar os outros; mas as rotinas seguidas estão reflexivamente abertas à mudança à luz da natureza móvel da auto-identidade. Cada uma das pequenas decisões que uma pessoa toma todo dia – o que vestir, o que comer, como conduzir-se no trabalho, com quem se encontrar à noite – contribui para essas rotinas. E todas essas escolhas (assim como as maiores e mais importantes) são decisões não só sobre como agir mas também sobre quem ser. Quanto mais pós-tradicionais as situações, mais o estilo de vida diz respeito ao próprio centro de auto-identidade, se fazer e refazer [2].
Algumas pessoas limitam o número de coisas que desejam possuir, outras decidem se mudar para uma casa ou apartamento bem menor. Não existe uma regra definida, para os presentes autores vale a regra de não possuir nada que não seja útil ou muito bonito.
Uma das críticas que várias pessoas fazem em relação ao minimalismo é a seguinte: se todo mundo “virar” minimalista o desenvolvimento econômico estaciona e isso acabaria com muitas empresas, comércio e empregos. Será? Não necessariamente.
Primeiro, como comentamos, o minimalismo não é contra o consumo, e sim contra o consumismo, que são coisas significativamente diferentes. Não se defende que as pessoas parem de consumir. Segundo, vale ressaltar que as grandes crises econômicas, como a de 2008 nos EUA, aconteceram por um endividamento originário do excesso e não falta de consumo, patrocinado por toda uma conjuntura econômica, social e política que incentiva cada vez mais a aquisição de bens, troca de materiais, alavancagem financeira, pagamento de juros estratosféricos, fácil acesso ao crédito. O resultado final nós já sabemos.
[caption id="attachment_9630" align="aligncenter" width="500"] Joshua & Ryan são os The Minimalists, além de Podcast semanal, também fizeram um ótimo documentário. Está disponível no Netflix.[/caption]Esse modelo de desenvolvimento baseado no incentivo ao consumo através da facilitação do crédito, que também foi adotado no Brasil nas últimas décadas, não se mostrou saudável no longo prazo. E, aqui, estamos falando dos resultados práticos, como endividamento, desemprego e desmonte de diversas indústrias. Contudo, ainda pode-se inferir resultados mais subjetivos, como queda na qualidade de vida, desentendimentos familiares / relacionamentos e desenvolvimento de problemas de saúde, oriundos desta profunda crise.
Na verdade, o minimalismo pode, sim, prejudicar alguns setores da economia, como por exemplo, o de roupas descartáveis produzidas por trabalhadores que vivem em condições precárias, vendidas a preço de banana nas lojas de fast fashion, ou a de tranqueiras de plástico para cozinha que são usadas pouquíssimas vezes.
Outros setores, por outro lado, podem ser beneficiados. Minimalistas, por exemplo, preferem consumir experiências ao invés de coisas. Dessa maneira, a indústria de turismo, shows e restaurantes pode se fortalecer. Os minimalistas também tendem a poupar mais, o que pode derrubar o risco conjuntural de uma economia e melhorar a qualidade do crédito ofertado pelos os bancos, que podem acabar dispondo de mais dinheiro para emprestar para empreendedores ou projetos mais arriscados.
Até mesmo elevar significativamente a taxa de poupança de uma economia (no Brasil, é consideravelmente baixa), o que favorece no longo prazo a queda de taxas de juros e desenvolvimento de um mercado financeiro mais saudável. Dentro da fórmula básica do PIB, a variável induzida não será mais o C (consumo das famílias), mas sim a I (Investimentos).
Com o desenvolvimento de opções de crowdfunding, os minimalistas podem inclusive usar a sua poupança para apoiar diretamente projetos nos quais eles acreditam. Minimalistas mais abastados podem também atuar como investidores-anjo, financiando diretamente empreendimentos inovadores. Já os mais sensíveis podem doar parte de sua poupança para causas nas quais acreditam, o que impactaria positivamente indivíduos mais vulneráveis.
No longo prazo, esse modelo de consumo mais consciente pode também ajudar o meio ambiente, preservando os escassos recursos naturais. Evidentemente que não somos inocentes ao ponto de acreditar que o movimento se tornará massificado e adotado por todos os agentes, ainda mais levando em conta as grandes “forças” contrárias que existem, porém é essencial evidenciar todos seus benefícios, em especial para a vida de cada indivíduo.
Uma coisa é certa. Ao contrário do que dizem todas as propagandas, satisfeitas as nossas necessidades básicas, mais consumo não significa necessariamente mais felicidade. Pode ser utópico, mas talvez o minimalismo seja a semente para uma economia menos selvagem, e por que não, assim como as coisas que os minimalistas consomem, de melhor qualidade.
Pedro Lula Mota Editor do Terraço Econômico
Renata K. Velloso Médica, formada em administração pública, vive e trabalha na Califórnia.
[1] Minimalismo – Enciclopédia Itaú Cultural
[2] GIDDENS, A. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2002.