A carta como pretexto: a cronologia dos fatos entre Dilma e Temer

“Verba volant, scripta manent” (As palavras voam, os escritos permanecem) Michel Temer, vice-presidente do Brasil e presidente do PMDB

Parecia mais uma segunda-feira qualquer, mas o dia 7 de dezembro de 2015 ficaria marcado como um dia histórico para a jovem democracia tupiniquim: a data na qual o vice-presidente da república, Michel Temer, enviou uma carta endereçada à atual presidente, Dilma Rousseff, mencionando a falta de confiança nele e no PMDB, o menosprezo do governo e o sentimento de parecer um “vice decorativo”. [1]

Fora de contexto, a carta pareceria um fato estranho, meio sem sentido, mas claramente aqui não é o caso. Basta ver a cronologia dos fatos, que a estratégia do vice-presidente salta aos olhos. Acompanhe comigo, caro amigo, não há o que Temer.

d e tA carta que não era de amor, tampouco de terror… Foto: UOL

Um pouco antes…

Quatro dias antes da famigerada carta de desabafo de Temer, no dia 03/12, o atual presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, também do PMDB, lia decisão para abrir o processo de impeachment e criava uma comissão para analisar o caso. Desde então, Temer não havia se manifestado quanto à abertura do rito contra Dilma Rousseff, sua companheira de chapa.

A carta, para muitos, como para a ex-senadora Marina Silva, significava a ruptura do PMDB com o Palácio do Planalto. Contudo, para outros, era apenas uma forma de mostrar o seu próprio descontentamento com a forma que Dilma lidava com a base aliada. Para mim, foi um oportunismo barato dada a situação delicada que já se encontrava o governo.

Contudo, apesar de a maré subir durante o dia, as águas voltam à noite…

Janeiro/2016, mês de sol e calmaria

Em mês de recesso da Câmara e no Senado, os ânimos exaltados foram substituídos por água de coco e brisa do mar. Os deputados e senadores zarparam de Brasília, deixando Michel Temer com uma “ponta de arrependimento”, conforme disseram aliados dele no dia 12/01. [2]

Pouco tempo depois, no dia 20/01, Temer conversou cara a cara com Dilma em Brasília, depois de mais de um mês de afastamento do meio político presidencial. Entre outras coisas, na reunião de apenas meia hora, falou que o governo precisava ouvir mais do que falar e ser mais servo, evitando apenas dar ordens [3].

Parecia que vice e presidente voltavam a se entender, ou pelo menos a ter uma relação um pouco mais amistosa. Mas, em fevereiro, a maré voltou, com ressaca e tudo… Fevereiro/2016:’Aí meu Deus/ me dei mal/ bateu à minha porta/ o Japonês da Federal!

Logo depois do carnaval, e com o aprofundamento das investigações do Triplex do Guarujá e do sítio em Atibaia, supostamente de propriedade do ex-presidente Lula, a relação Dilma-Temer voltou a estremecer.

Em 12/02, Dilma chamou Temer de última hora na mobilização contra o mosquito Aedes Egypt, transmissor do vírus Zika. Dias depois, em 15/02, o vice-presidente não compareceu à primeira reunião da coordenação política do governo em 2016. E, finalmente, em 19/02, Temer afirmou que o PMDB terá candidato para a presidência em 2018, mostrando que, se a ruptura a curto-prazo é uma incógnita, a médio-prazo parece certa. [4]

E como tudo começou, numa segunda-feira, mas agora no dia 22/02, o idealizador das campanhas presidências de Lula e Dilma, o marqueteiro João Santana, teve sua prisão decretada pelo juiz Sergio Moro, devido a investigações em curso promovidas pela Operação Lava-Jato.

Como uma areia movediça, o PMDB e o seu presidente, Michel Temer, vem se apoiando em quem tem mais força momentânea: quando o governo se enfraquece, o partido aliado (risos) se afasta, como se o problema não fosse dele; quando o governo ganha algum fôlego, retorna-se ao mesmo discurso do “deixa disso” e da não conspiração.

Não adianta adivinhar o futuro, é preciso esperar os próximos capítulos nos âmbitos políticos e policiais. A certeza é uma só: a carta de Michel Temer continua extremamente atual.

arthur-assin       Notas [1] O conteúdo completo da carta está neste link:  http://goo.gl/LB0te4. No mesmo dia, a assessoria de Michel Temer declarou que estava surpresa com a divulgação da Carta à imprensa. Convenhamos, em 2015, quem manda uma carta [impressa] e não sabe do risco de vazamento dos dados? [2] Temer se arrepende de ter enviado a Carta: http://goo.gl/OMx6G8. [3] Veja aqui o que mais foi falado na reunião: http://goo.gl/gkFC0i [4] Você encontra todas essas informações nos links: http://goo.gl/Amv6iS, http://goo.gl/tHaeHY e http://goo.gl/dzVgES

Arthur Solow

Economista nato da Escola de Economia de São Paulo da FGV. Parente distante - diz ele - do prêmio Nobel de Economia Robert Solow, que, segundo rumores, utilizava um nome artístico haja vista a complexidade do sobrenome. Pós graduado na FGV em Business Analytics e Big Data, pois, afinal, a verdade encontra-se nos dados. Fez de tudo um pouco: foi analista de crédito e carteiras para FIDCs; depois trabalhou com planejamento estratégico e análise de dados; em seguida uma experiência em assessoria política na ALESP e atualmente é especialista em Educação Financeira em uma fintech. E no meio do caminho ainda arrumou tempo para fundar o Terraço Econômico em 2014 =)

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