Política econômica dos EUA: o sucesso de Trump depende do fracasso de Trump

A política econômica dos Estados Unidos costuma ser seguida de perto por diversos analistas ao redor do mundo. Embora outras economias tenham ganhado destaque nos últimos anos (a China, por exemplo), no que tange as relações econômico-financeiras entre países, ainda temos o maior protagonismo na terra do Tio Sam.

O mercado financeiro – como “máquina” de processar informações que é – aprendeu a filtrar o que tem de importante entre um tweet e outro. Mas quando o desenho da política econômica traz de volta a ameaça de rodadas sucessivas de proteção comercial, os ânimos costumam se exaltar. Quais os efeitos do aumento nas tarifas de importação do aço?

Ao mesmo tempo, a expansão fiscal feita através de corte nos impostos de empresas gera discussões animadas sobre a sua eficácia. Os EUA irão crescer mais depois da medida? E a que custo? Curiosamente, as duas políticas possuem uma relação inusitada. Para uma dar certo, a outra precisa falhar.

Comecemos com a lógica por traz do corte nos impostos. Ao reduzir a tributação, a produtividade marginal do capital (líquida de tributos, obviamente) aumenta, tornando mais interessante o acúmulo do mesmo nos EUA. Isso atrai para o sofisticado sistema financeiro norte-americano a poupança acumulada em outras economias, aumentando a produção doméstica. Como os EUA não podem ser considerados uma economia sem influência nos preços internacionais, isso pode causar uma realocação de ativos globais. Domesticamente, o PIB sobe, mas o PNB provavelmente, não. Trump corta impostos, os estrangeiros agradecem.

Ao mesmo tempo, abdicar de arrecadação significa – a depender das elasticidades, mas provavelmente – uma deterioração das contas públicas. Vale à pena crescer mais se isso significa uma dívida maior (o que acarretará em uma parcela maior do orçamento público com pagamento de juros, ao invés de, por exemplo, alocar recursos em infraestrutura)? A resposta, curiosamente, coloca economistas que outrora discordariam, em campos semelhantes. A conta parece que não fecha muito bem.

Mas e o aço?

Revisitemos o trabalho publicado em 1957 por Roberto Mundell, International Trade and Factor Mobility. Espectador privilegiado das relações entre EUA e Canadá, ele se perguntou qual o impacto na mobilidade de outros fatores de produção do aumento da tarifa no…aço! O resultado não é intuitivo.

A primeira conclusão é que isso estimularia o fluxo de capital, boa notícia, considerando a primeira política discutida. A segunda, no entanto, é de que a tarifa não teria efeito justamente em função do influxo de capital.

Ao desestimular o comércio internacional, a equalização de preços (de bens e serviços e dos fatores de produção) é, inicialmente, impedida. Os produtos mais baratos não poderão encontrar seu destino nas economias aonde o preço em autarquia é mais alto. Isso significa também, que se, por exemplo, esses setores foram intensivos em capital, o retorno do mesmo é maior. Nesse caso, o capital externo é atraído, diminuindo o custo de bens de capital e aumentando a produtividade do trabalho. Essa combinação faz com que os bens intensivos em capital fiquem mais baratos e os bens intensivos em trabalho, mais caros. Exatamente o que aconteceria sob o comércio internacional! Mundell nos brinda, com mais de 50 anos de antecipação, com uma análise que ajuda a entender a ineficácia do que foi proposto.

Obviamente, o arcabouço teórico no qual Mundell trabalha é simplificado e as imperfeições da realidade impõem outras dificuldades. Mas, se nem no mundo dos mercados mais simplificados essa política (proteção comercial) teria o efeito desejado (quanto mais positivo), imagine na vida real, onde as retaliações trazem o resultado para o campo negativo, conta paga sempre pelas famílias.

A política econômica de Trump só dará certo se a política econômica de Trump der errado. Um paradoxo que talvez não caiba em 280 caracteres.

João Ricardo Costa Filho Professor do Ibmec-SP, do Mestrado Profissional da EESP-FGV e da FAAP.

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