Se Eduardo Cunha delatar, para onde vai a economia?

Na semana passada, o ilustre ex-deputado (e ex-presidente da Câmara dos Deputados) Eduardo Cunha foi preso preventivamente na Operação Lava Jato. Cunha foi peça-chave no impeachment de Dilma Rousseff e agora anda bradando que poderá ser conhecido por derrubar dois presidentes.

Com toda a sua influência, é bem provável que Cunha saiba muita coisa que possa ser útil para a Lava Jato, o que lhe renderia um bom acordo de Delação Premiada – mesmo considerando que diversas outras delações já ocorreram e que, segundo os procuradores da operação, ele terá de esforçar-se bastante com as informações (“cuspir sangue”, segundo eles) para virar delator.

No momento em que o Brasil parece ter colocado uma agenda econômica para resolver seus problemas fiscais, liderada pela equipe nomeada por Michel Temer, uma delação de Cunha que envolva o atual presidente pode causar grandes estragos na economia. Quais seriam esses abalos?

Primeiramente, reforça-se que para ter o benefício da delação premiada, Cunha deve fornecer informações novas e relevantes para a investigação e ainda deve provar tudo para ter seu acordo homologado. Suponhamos que Cunha possua tais informações, qual a próxima casa no tabuleiro?

Cenário 1 – Cunha delata e derruba Michel Temer rapidamente, antes da aprovação de reformas.

Caso Eduardo Cunha forneça informações e prove que o presidente Michel Temer esteve envolvido em práticas corruptas no âmbito da Lava Jato, é bem provável que a economia brasileira sofra mais um pouco. E isso não tem nada a ver com gostar ou não da agenda de Michel Temer. Uma delação que derrube o presidente gera novas incertezas quanto à equipe econômica, pois o presidente da Câmara dos Deputados deve convocar novas eleições (caso Temer caia até o final do ano) e, assim, introduzimos mais um fator de risco para a já combalida economia brasileira.

A perspectiva de curto prazo seria de desvalorização do real (com investidores saindo do país), queda dos índices de mercado, provável aumento dos juros com o risco crescente e quem sabe até um pouquinho a mais de inflação, nossa boa e velha conhecida.

Para um prazo mais longo, o resultado da eleição convocada pelo presidente da Câmara – ou pela eleição indireta caso Temer caia em 2017 com uma possível delação – é que irá dizer. Mas uma troca de presidente aliada a uma troca da equipe econômica chacoalharia a economia brasileira. Adiaríamos por mais algum tempo a já mirrada perspectiva de recuperação.

Cenário 2 – Cunha delata, derruba Michel Temer mas com algumas reformas já aprovadas, como a PEC 241.

Neste cenário, o risco é menor que no anterior, porém muito grande e deve desestabilizar sim a frágil economia tupiniquim. Novamente uma desvalorização cambial, aumento dos juros, pequeno repique inflacionário, mas com a proteção de que pelo menos os gastos públicos já possuem um teto e o presidente eleito no pleito convocado para preencher a vaga de Temer teria muitas dificuldades em desfazer a PEC 241. E ainda mais dificuldade para aprovar outras reformas necessárias para que a PEC se sustente (leia-se: reforma previdenciária).

Por que? Bem, a votação da PEC 241 nos fornece uma estimativa do apoio parlamentar que o governo atual desfruta. Uma mudança de linha do chefe de estado pode mudar completamente esse apoio.

Suponhamos que nosso cenário 2 se concretize e que as eleições são vencidas por Lula (sim, sabemos que ele pode ser preso amanhã e que estaria inabilitado, mas é ele quem lidera as atuais pesquisas de intenção de voto) ou por algum parlamentar (no caso de eleição indireta) de oposição, um cenário muito improvável. Será que Lula ou alguém da oposição teria o mesmo apoio que Temer possui, depois de tudo que aconteceu em nossa história recente?

Difícil saber. Mas é mais um fator de risco para a nossa economia. A incerteza para caminhar na agenda de reformas aumenta consideravelmente. Podemos pensar, por exemplo, que a agenda de concessões e privatizações poderia estar descartada. Menos investimentos entrando no país.

Neste caso, o que determinaria os rumos da agenda de reformas no prazo mais longo seria novamente o próximo mandatário, mas com menor grau de liberdade para agir com política fiscal. Isso pode ser entendido com menor margem de manobra para derrubar ainda mais a economia ou com menor poder para construir uma coalizão. Entretanto, o risco para a economia é maior no caso de uma eleição direta – maior incerteza quanto ao candidato vencedor – e menor no caso de eleição indireta, já que a base do governo atual é quem determinaria o próximo presidente, que provavelmente estaria alinhado com a pauta de reformas já em discussão.

De qualquer forma, mesmo com o risco para economia mais baixo que no Cenário 1, é ainda uma fonte de turbulência para a capenga recuperação brasileira.

Cenário 3 – Cunha delata, mas não incrimina Temer, somente seus aliados.

Caso Cunha delate e não consiga (ou não queira) incriminar o atual presidente, mas seu núcleo de apoio, como Romero Jucá, Eliseu Padilha, Moreira Franco etc, temos um cenário em que a equipe econômica é preservada e o presidente se mantém no cargo bancando seus maestros da economia, mesmo com perda de parte do apoio parlamentar articulado pelos seus fiéis escudeiros.

É um cenário que ainda adiciona risco ao país, com os mesmos efeitos qualitativos dos cenários anteriores, mas em menor magnitude. As reformas pós PEC 241 contarão com menor probabilidade de serem aprovadas e o país andaria capengando até as eleições de 2018. Ainda assim, muito perigoso para a frágil situação fiscal em que nos encontramos.

Em todos os cenários, Eduardo Cunha é um homem que pode trazer instabilidade ao país caso denuncie algum “peixe grande” e consiga provar que o conteúdo de sua denúncia é verdadeiro, obtendo assim o benefício de uma delação premiada – talvez algum tempo a menos na prisão e penas mais leves para seus familiares (aqui pediremos a consulta aos nossos leitores advogados!).

Se um dos dois primeiros cenários se materializar (com baixa probabilidade do Cenário 1 ocorrer, dado o tempo que leva para negociar o acordo entre as autoridades e o preso e a celeridade com que a PEC 241 está sendo votada), este será o preço que pagaremos para tentarmos melhorar o nosso ambiente político de práticas de corrupção. Um pouco mais de instabilidade até que decidamos nas urnas, lá em 2018 muito provavelmente, quem continuará a comandar o país e tocará as reformas. Vivendo e aprendendo.

O House of Cards Brasileiro ainda não acabou. A próxima temporada promete fortes emoções…e “que Deus tenha misericórdia deste país”.

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Leonardo Palhuca

Doutorando em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg. Interessado em macroeconomia - política monetária e política fiscal - e no buraco negro das instituições. Escreveu para o Terraço Econômico entre 2014 e 2018.
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