2017 o ano da retomada?

Hmmm… não tenha tanta certeza assim.

Certo otimismo com a atividade econômica em 2017 vem sendo ventilado nas últimas semanas e vários analistas apostam em uma recuperação modesta, mas vital para sairmos do  fundo do poço que cavamos durante o biênio 2015-2016. Mas essa “saída” está tão próxima assim?

No último dia 15 o Banco Central soltou o seu “PIB”, o IBC-Br, um indicador coincidente do PIB que tenta capturar o passo mensal da atividade econômica. O IBC-Br indicou uma retração brutal da atividade econômica em 2016, um acumulado de -4,34%, marginalmente pior que a retração de -4,28% em 2015, também medida pelo IBC-Br. Um sinal que ainda estamos na parte de queda da curva e não no começo de subida.

Ainda não temos o número oficial do PIB em 2016 que o IBGE só vai divulgará em março, mas podemos dizer que deve ficar entre -3,5% e -3,6%. O primeiro número vem da mediana do relatório FOCUS e o segundo do monitor do PIB do IBRE – Instituto Brasileiro de Economia da FGV-RJ. Com a queda acumulada entre 2015 e 2016 estamos de volta ao mesmo nível de PIB de 2011, conforme mostra o gráfico abaixo:

[caption id="attachment_9115" align="aligncenter" width="1264"] Fonte: Monitor do PIB – IBRE-FGV; Elaboração Própria[/caption]

Olhando para os diversos componentes do PIB, em suas duas principais óticas -oferta e demanda-, retornamos aos mesmos níveis de alguns anos trás. O PIB do comércio voltou para o mesmo nível de 2011 e a indústria para o nível de 2008/2009. Toda essa tragédia está registrada no próximo gráfico:

[caption id="attachment_9106" align="aligncenter" width="1215"] Fonte: Monitor do PIB – IBRE-FGV; Elaboração Própria[/caption]

Agora, sob a ótica da demanda, o investimento está menor do que em 2008. O consumo das famílias também voltou para o patamar de 2011. O único componente que não sofreu severamente foi o consumo do governo. Importações sofreram regressões significativas com a desvalorização cambial e queda na renda interna, essa queda nas importações até ajudam no PIB, uma vez que aumentam as exportações líquidas (exportações menos importações), as exportações continuam próximas da média dos últimos 10 anos.

[caption id="attachment_9108" align="aligncenter" width="1264"] Fonte: Monitor do PIB – IBRE-FGV; Elaboração Própria[/caption]

Toda essa análise do péssimo desempenho de 2015/2016 serve para dizer que a atividade em 2017 vai sofrer muito. Quando a atividade econômica de um ano é muito ruim, ela impacta estatisticamente a do próximo ano. Este efeito negativo que o ano anterior traz sobre o próximo ano é o chamado carry-over ou em bom porutuguês: o carrego estatístico. Esse efeito nada mais é que o crescimento resultado do PIB de 2017, caso ele permaneça no mesmo nível do PIB do último trimestre do ano anterior. Podemos dizer que é o impulso que 2016 deixa na atividade econômica de 2017, uma espécie de inércia.

O crescimento da economia em 2017, ou em qualquer ano, pode ser decomposto, grosso modo, em duas partes:

A segunda parte da igualdade é o quanto a economia de fato cresce apenas em 2017, excluindo os efeitos negativos carregados de 2016. O gráfico abaixo mostra um exercício interessante: calculamos aqui o carrego estatístico ano a ano. E o segundo gráfico decompõe o quanto do crescimento de cada ano, desde 1996, se refere ao carrego e ao crescimento de fato. Interessante notar o enorme efeito positivo do carrego em 2010 e também seu efeito negativo em 2016, visto que em 2015 a atividade despencou.

[caption id="attachment_9109" align="aligncenter" width="1333"] Fonte: Monitor do PIB – IBRE-FGV e IBGE; Elaboração Própria[/caption] [caption id="attachment_9110" align="aligncenter" width="1331"] Fonte: Monitor do PIB – IBRE-FGV e IBGE; Elaboração Própria[/caption]

E como vem o carrego para 2017? Negativo. Assumindo com base na projeção do IBRE, que o PIB em 2016 vai se retrair na casa de -3,6%, chegamos a uma queda de  -1.75% do PIB do  terceiro para o quatro trimestre de 2016. Precisamos do PIB do quarto trimestre para calcular o carrego, que é feito da seguinte forma:

Quatro vezes o PIB do quatro trimestre do ano anterior, dividido pela soma de todos os PIBs trimestrais, menos 1. Assim chegamos ao carrego estatístico que o ano de 2016 deixa para 2017, que é de -0,6%. Caso a economia cresça zero de fato esse ano, o número apurado para 2017 será de -0,6% e não zero.

Para a economia brasileira alcançar o crescimento previsto na mediana das estimativas do relatório FOCUS, que está em 0,48%, o país precisa crescer ao longo do ano, desconsiderando o carrego, 1,1%. Algo que parece um pouco distante. Por isso, se a atividade econômica for um pouco pior que o esperado em 2017, um PIB zero ou negativo não deve ser uma surpresa. Na escuridão em que se encontra a economia brasileira, o carrego pode ser o grande bicho papão de 2017.

 

Victor Candido

Mestre em economia pela Universidade de Brasília (UnB). Economista pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Foi economista-chefe de uma das maiores corretoras de valores do país, economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento e atualmente é sócio e economista de uma gestora de fundos de investimento. Foi pesquisador do CPDOC (O Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) da FGV-RJ. Ajudou a fundar o Terraço Econômico em 2014.
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