Tsumoney?

Com a mudança de governo o Brasil vai voar? Vamos receber uma enxurrada de investimentos de fora que vai nos fazer ricos? A bolsa de valores vai se valorizar absurdamente com o retorno dos “gringos”? É uma tese muito difundida, principalmente por quem apoiava firmemente o impeachment e que a única solução para a nossa economia seria a troca presidencial.

Pois bem, a troca aconteceu. E agora, já estamos sendo inundados?

Para verificarmos se o tsunami financeiro que vem de fora já está nos atingindo, vamos a alguns dados que podemos obter junto ao Banco Central que mostram um pouco do apetite dos estrangeiros nas terras onde canta o sabiá no período recente, mais precisamente desde o primeiro mês da gestão Dilma Rousseff em 2011.

A série mais longa (de 1995 em diante) está disponível e enviamos aos solicitantes, mas para concentrarmos no atual ciclo econômico brasileiro, foquemos nos últimos 6 anos. Nos gráficos, em azul são os dólares entrando no Brasil e em laranja os nossos reais convertidos em dólares saindo do país. A linha preta refere-se sempre à diferença entre eles.

Investimento Estrangeiro Direto (IED)

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O que vemos para o IED não é nada de tsunami financeiro. Aliás, o IED é bem estável ao longo do tempo e podemos até enxergar uma média de 10 bilhões de dólares mensais no período. Mesmo com a solução do problema político que vivíamos, o IED não disparou. E nem irá disparar tão cedo.

Como é um investimento de mais longo prazo, muitos outros fatores entram na análise dos investidores além de somente a troca de presidentes e a entrada de capitais para esse tipo de investimento parece muito menos suscetível aos ciclos econômicos. Então, passemos para o fluxo de dólares que é mais volátil.

 

Investimento em Portfólio (Ações + Renda Fixa)

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Investimentos em portfólio referem-se aos dólares que entram no país (ou saem, na área laranja) e são alocados em títulos de renda fixa (ou fundos que investem nisso) e em ações (ou fundos que investem em ações).

Aqui vemos uma certa recuperação desse tipo de capital vindo para o Brasil. Vemos claramente que o volume mensal de dólares entrando no Brasil caiu mais de 50% entre janeiro de 2015 e janeiro de 2016 e então passou a se recuperar, mas de forma volátil ainda. E muito longe de ser um Tsumoney, já que nem recuperamos ainda o volume mensal que entrava em 2013 e 2014.

Se daqui para a frente o volume crescerá e se estabilizará em uma média mensal alta para justificar ser chamado de tsunami financeiro, é difícil dizer. Para que possamos chamar o fenômeno de tsunami de dólares, teríamos de chegar próximos do nível mais alto que já presenciamos no Brasil: 26 bilhões de dólares mensais entrando, algo obtido nos 12 meses anteriores à crise de 2008. Apesar da liquidez externa em abundância, o mundo e o Brasil ainda vão crescer lentamente para justificar uma avalanche financeira.

Investimento em Ações

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E já que o tsunami prefere a bolsa de valores, onde “seus lucros podem ser astronômicos”, vamos olhar somente o capital que entrou para a compra de ações, deixando de lado os investimentos em renda fixa, muito ajudado pela imensa inabilidade fiscal brasileira, que permitiu juros nos títulos públicos da ordem de 17% ao ano em 2015/2016.

Novamente o padrão se segue: uma recuperação modesta da entrada mensal de capital que reverteu o péssimo ano de 2015 quando encerramos o ano com volume mais de 50% menor que no começo do ano.

Estamos lentamente atraindo “os gringos” para a nossa bolsa de valores, recuperando volumes mensais que vimos em 2013 e 2014. E novamente teremos uma longa jornada até recuperarmos (se recuperarmos) o volume do período recorde: 19 bilhões ao mês também nos 12 meses anteriores à crise financeira de 2008.

Se naquela época pudemos chamar o fenômeno de Tsumoney, teremos que praticamente TRIPLICAR o volume mensal de entrada de recursos para a compra de ações visto atualmente. Difícil acreditar, dado o prognóstico de crescimento lento da economia brasileira.

Bolsa de Valores e os Estrangeiros

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Por fim, como os gringos estão se comportando na Bolsa de Valores desde que Dilma tomou posse pela primeira vez?

Está ficando monótono, mas é isso mesmo que você pensou. O padrão segue: em 2015 o volume movimentado na Bolsa de Valores pelos investidores estrangeiros diminuiu consideravelmente. Mas ao mesmo tempo, a participação dos “gringos” nas negociações no mercado subiu. Paradoxo? Não, os demais investidores saíram mais rapidamente que os estrangeiros.

A Bolsa de Valores apresentou bons ganhos ultimamente, sendo o melhor investimento de 2016 com valorização de 49,8% até o fim de outubro. Estamos a caminho de recuperar a máxima de 73.516 pontos obtida em maio de 2008, mas muita calma nessa hora.

E os “gringos” voltaram a se movimentar no mercado em 2016, mas ainda não voltaram ao volume negociado em 2011, por exemplo. Uma recuperação, sim. Mas longe de um tsunami gringo em nossa Bolsa de Valores.

E a nossa conclusão?

Bem, não nos parece que um tsunami financeiro esteja acontecendo no Brasil. Há alguns sinais de recuperação, principalmente no mercado de ações com a reversão da tendência de 2015 quando os estrangeiros compraram bem menos, movimento obviamente acompanhado pelo principal índice de mercado brasileiro. Mesmo que o problema político tenha sido resolvido (parcialmente, a Lava Jato ainda continua assustando), o retorno dos estrangeiros não foi tão brutal assim. Ainda estão receosos?

Lentamente estamos recuperando o volume que víamos em tempos “normais”, como em 2011 e 2012, antes da completa ruptura com o arcabouço macroeconômico que dava certa estabilidade aos investidores estrangeiros.

Mas muita calma nessa hora, ainda não estamos nos afogando em uma onda gigante. Talvez isso sequer aconteça e a recuperação seja gradual, como vemos atualmente. Prudência e canja de galinha não faz mal a ninguém. E parece que os estrangeiros sabem disso.

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Leonardo Palhuca

Doutorando em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg. Interessado em macroeconomia - política monetária e política fiscal - e no buraco negro das instituições. Escreveu para o Terraço Econômico entre 2014 e 2018.
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