O Pote de Ouro de Bezos: a Computação em Nuvem

Quando as pessoas pensam na fortuna de Jeff Bezos, fundador da Amazon, geralmente elas tem na cabeça a imagem de armazéns robotizados, complexas cadeias de suprimento e caixas de papelão com um sorriso convidativo impresso nelas. Essa é uma visão do senso comum que poderia estar correta, mas não é esse o caso.

Ao contrário do que pode parecer, a fortuna de Bezos não deriva das atividades logísticas da Amazon ou de seus produtos próprios; ela sequer deriva de algo físico! A fonte maior da riqueza da Amazon vem na verdade de sua plataforma de computação em nuvem (cloud computing), a AWS.

Mas não é somente a Amazon que se beneficia dos potenciais lucrativos das nuvens. Microsoft, Google, Alibaba Group e IBM também apostam pesado nesse mercado e ampliam seus investimentos a cada ano. E não é sem razão. Segundo algumas pesquisas, o mercado de computação em nuvem tende a faturar mais de U$ 1 trilhão em 2030 e as perspectivas de possíveis utilizações futuras tendem a crescer conforme cada vez mais empresas entram nesse mercado.

Todavia, o que é a computação em nuvem?

Computação em nuvem é um termo usado para designar o conjunto de serviços que oferecem operacionalidade de computação por meio de servidores de dados dispersos em diferentes locais. Pense no serviço mais popular de computação em nuvem, a armazenagem de dados, como exemplo. Quando você salva seus vídeos e fotos no OneDrive, por exemplo, você está utilizando uma funcionalidade de computação em nuvem para guardar seus dados em um servidor ou em um conjunto de servidores externos. Você não precisa comprometer a memória do seu computador, basta dispersar suas informações em uma rede de servidores. Dessa forma, pense na computação em nuvem como a virtualização do seu computador.

Em geral, existe 3 tipos principais de serviços de nuvem:

IaaS (Infrastructure as a Service): são os serviços de oferta de API e de infraestrutura de computação virtual. É o mais geral (e geralmente o mais caro) dos serviços de computação em nuvem. O IaaS pode ofertar desde soluções de desktop até bancos de dados e servidores físicos. O dominante dessa parte do mercado é justamente a AWS;

SaaS (Software as a Service): são os serviços que permitem que os usuários utilizem aplicativos por meio da nuvem. De longe é a parte do mercado em maior expansão. Os aplicativos podem ir desde emails e organogramas até redes sociais inteiras. O exemplo mais notório desse serviço é o Office 365 da Microsoft;

PaaS (Plataform as a Service): são serviços que funcionam como intermediários entre o SaaS e o IaaS. Eles permitem que o usuário tenha uma plataforma de desenvolvimento de aplicações em nuvem e ofertam a infraestrutura necessária para desenhar, construir, testar e rodar tais aplicações. Exemplos de serviços de PaaS são Google App Engine, Microsoft Azure e a AWS;

Olhando para a demanda de mercado, o continente americano ainda é o maior consumidor de serviços de computação em nuvem; apesar de um crescimento expressivo da demanda asiática nos últimos anos. Segundo dados da Flexera, as Américas ainda são representativas de mais da metade da demanda do mercado para fins corporativos:

Fonte: Flexera (2021)


Os dados para a América incluem os mercados dos Estados Unidos, México, Brasil e Canadá e a Ásia-Pacífico engloba apenas Austrália, Índia, Japão e Coreia do Sul.

Olhando para a oferta desse mercado, fica claro a posição dominante da Amazon. A AWS representa sozinha 34% do mercado, seguida pelo Microsoft Azure por uma diferença de mais de 10%. Os outros nomes de peso que se seguem incluem Google Cloud, Allibaba, SalesForce e IBM:

Fonte: Statista (2022)

Em verdade, a AWS é tão importante para a Amazon que corresponde a fatias cada vez maiores de sua receita total. Ao contrário do senso comum, a Amazon perde bastante em suas operações na plataforma de vendas e produtos próprios; sobretudo no mercado internacional fora dos Estados Unidos. Em 2017, por exemplo, a empresa só não operou em total prejuízo devido as receitas da AWS terem compensado as perdas do mercado internacional:

Fonte: Elaboração a partir dos Annual Reports da Amazon (2015 – 2021)

Todavia, apesar de a Amazon ter o maior market share do mercado de computação em nuvem, é a Microsoft que consegue gerar um volume absoluto maior de receitas. Em termos de receita, o mercado como um todo vem apresentando volumes cada vez maiores:

Fonte: Elaboração a partir dos Annual Reports (2015 – 2021)

Contudo, mesmo com todo esse crescimento recente, o mercado de computação em nuvem enfrenta duas limitações críticas em curto prazo. A primeira é que muitos dos investimentos em computação em nuvem são muito recentes e ainda não atingiram seu break-even point. Em razão disso, apesar das receitas crescerem, a maioria das empresas, tirando Microsoft e Amazon, apresentam perdas de lucro operacional com os serviços de nuvem:

Fonte: Elaboração a partir dos Annual Reports (2015 – 2022)

A segunda limitação é que a taxa de crescimento das receitas dos serviços de nuvem tem caído ou estagnado para a maioria das empresas nos últimos anos. Segundo o Synergy Group, consultoria líder no mercado de computação em nuvem, essa redução do crescimento se deve tanto a Lei dos Grandes Números (conforme um mercado cresce em tamanho é natural que as taxas de crescimento caiam) como fatores macroeconômicos; com sinais de possível recessão nos Estados Unidos, elevação de juros globais tornando empréstimos para investimentos em infraestrutura de nuvem mais caros e o dólar mais apreciado tornando investimentos em serviços de nuvem mais caros para os mercados asiáticos.

Fonte: Elaboração a partir dos Annual Reports (2015 – 2021)

Essas notícias de redução na taxa de crescimento são particularmente preocupantes para empresas como a Amazon, que dependem bastante delas para fechar as contas. A preocupação com a viabilidade futura dos investimentos em computação em nuvem é tão grande que as ações da Amazon chegaram a cair mais de 5% e sua capitalização caiu para abaixo de U$ 1 trilhão após os resultados do Quarto Trimestre de 2022 terem mostrado uma redução das receitas da AWS.

Entretanto, as possibilidades da computação em nuvem são muito grandes para se jogar o bebê junto com a água. Como pontua a McKinsey, a expectativa é que a computação em nuvem tenha impacto sobre a produtividade de diversos setores até 2030, o que justifica decisões como a da AWS de manter a ampliação de investimentos mesmo com o desaquecimento atual do mercado, mesmo com todas as controvérsias que isso poderá trazer.

Sávio Coelho

Analista Financeiro e de Dados. Tem interesse nas áreas de teoria da firma, política fiscal e finanças quantitativas.
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