Guia do Pessimildo para 2020

Terraço Econômico | por Leonardo Palhuca lesma

O ano de 2015 já começou com previsões nada animadoras para a economia brasileira. Segundo o último Boletim Focus, os agentes esperam um crescimento de 0.5% para a economia nacional. Outras entidades também colocam o crescimento brasileiro na categoria “Pibinho”.

Como parece que 2015 está perdido, o que esperar então dos anos seguintes? 2016, 2017…2020? Bom, arrisco a dizer que o crescimento será baixo e aqui apresento os motivos para tal conclusão. Como o título diz, se você está no time dos Pessimildos, pode usar o artigo como um Guia.

1 – Regressão à Média

Um dos fenômenos mais observado em economia é o que convencionamos de chamar de “Regressão à Média”. Aplicado ao crescimento econômico, o fenômeno significa que um país cresce, em média, a certa taxa (relacionada com fatores que discutiremos posteriormente) e períodos de crescimento mais altos ou mais baixos tenderão a acabar e retornar para a média, caso nenhuma mudança nos fatores determinantes do crescimento seja alterado.

Se aceitarmos que o que ocorreu no Brasil entre 2003 e 2008 foi um choque externo que, infelizmente, acabou, tenderemos a voltar para o nosso crescimento médio.

Entre 1977 e 2014 a economia brasileira cresceu em média 2.8% ao ano. Entretanto, essa média foi elevada por conta do período recente, quando em média o país cresceu 3.2% ao ano (desde 2002). Assim, se o país voltar para a sua média, a tendência é um crescimento abaixo de 2.8% ao ano.

O gráfico abaixo mostra o comportamento da economia e o crescimento médio linear. Voltaremos para a média?

[caption id="attachment_2524" align="aligncenter" width="533"]Fonte: Banco Central do Brasil Fonte: Banco Central do Brasil[/caption]

Lawrence Summers e Lant Pritchett estudam os casos de rápido crescimento e concluem que mesmo os milagres asiáticos tendem a voltar para seu crescimento médio. Uma conclusão interessante é que o crescimento passado robusto não é um bom balizador do crescimento futuro e é mais prudente apostar num crescimento médio de longo prazo determinado por algumas variáveis: investimento, crescimento da população e produtividade – esta última ligada a instituições, educação, ambiente de negócios.

2 – Fim do Ciclo de Commodities

Conforme argumentado, o crescimento recente do Brasil esteve ligado a um choque externo. Se você acompanha as discussões econômicas, já sabe que estamos falando do boom de commodities       que beneficiou o valor das nossas exportações e contribuiu para o crescimento econômico do período. Duvida?

O gráfico abaixo indica a taxa de crescimento do PIB brasileiro com a taxa de crescimento de um índice de commodities (excluindo petróleo) calculado pelo FMI.

[caption id="attachment_2522" align="aligncenter" width="535"]Fonte: FMI e Quartz [3] Fonte: FMI e Quartz [/caption]

 Parece fácil notar que o comportamento da economia brasileira está bem correlacionado com o comportamento dos preços das commodities. Com a desaceleração na Europa e na China, a expectativa é que a alta do preço dos produtos que exportamos não se mantenha (Deutsche Bank) e, assim, nosso crescimento poderá ser bem fraquinho nos próximos anos.

Mas, teríamos como evitar essa dependência? Sim! Caso tivéssemos melhorado nossos determinantes de crescimento (a lembrar: investimento, crescimento da população e produtividade), o futuro nos reservaria um cenário mais benigno.

Fizemos a lição de casa?

3 – Investimento

O que podemos fazer com o dinheiro extra que ganhamos no Natal? Podemos guardar no banco ou podemos gastar! O mesmo acontece com o Brasil. Durante o período de alta no preço das commodities, poderíamos ter investido mais em portos, aeroportos, estradas, ferrovias, hidrovias, etc., ou poderíamos gastar com roupas e outros apetrechos.

O gráfico abaixo com a Taxa de Investimento (Formação Bruta de Capital Fixo) sobre o PIB indica que não aumentamos muito a parcela de nossa renda que investimos para produzirmos mais no futuro. É verdade que houve um considerável aumento entre 2003 e 2008, mas parece ter sido um fenômeno temporário. A taxa de investimento caminha novamente para o nível anterior, ao redor de 17% do PIB (alguém aí lembrou da regressão à média?).

Assim, temos mais um fator que joga contra um crescimento futuro mais robusto.

[caption id="attachment_2523" align="aligncenter" width="535"]Fonte: IBGE Fonte: IBGE – Contas Nacionais[/caption]

4 – Produtividade

Já que não aumentamos o investimento, pelo menos melhoramos a produtividade da nossa economia, correto? Em outras palavras aprimoramos a utilização de nossos recursos para produzirmos os bens e serviços?

Não! Ao medirmos o crescimento produtividade do trabalho (quanto de renda um trabalhador médio produz em 1 hora trabalhada) o resultado é desanimador. Desde 1982 o crescimento médio da produtividade do trabalho no Brasil é de 0.79%. Isso é bom ou ruim?

Na comparação com países que apresentavam níveis de produtividade semelhantes em 1982 (1 hora trabalhada produzia em média de US$ 7 a US$ 10) a nossa taxa de crescimento de produtividade é pífia e o resultado ao longo de 3 décadas aparece no gráfico abaixo.

[caption id="attachment_2519" align="aligncenter" width="534"]Fonte: Total Economy Database [6] Fonte: Total Economy Database [/caption]

Agora, se considerarmos que o crescimento da renda per capita está bastante ligado ao crescimento da produtividade, e caso não tenhamos feito nada para melhorar a nossa utilização de recursos, é de se esperar que a renda per capita cresça por volta de 0.5% a 1%. Estarrecedor!

Além disso, pouco foi feito para melhorarmos alguns fatores que influenciam a produtividade, como o ambiente de negócios, o sistema judicial, etc. Meu querido Anders Åslund argumenta que durante a bonança, reformas são deixadas de lado e o Brasil não é exceção.

5 – Capital Humano

Outro fator importante que influencia o crescimento econômico de longo prazo é o que chamamos de “capital humano”(uma expressão mais bacana para “educação”). Caso a educação da força de trabalho seja alta, teremos trabalhadores mais produtivos, ideias mais inovadoras e potencialmente maior crescimento econômico.

E então, como vamos nesse quesito?

Aqui sou um pouco menos pessimista. O gráfico abaixo aponta para um crescimento robusto do Índice de Educação medido pela ONU (calculado usando a escolaridade média e a escolaridade média esperada ao nascer, sendo 1.00 o nível mais alto do índice) para o cálculo do famoso IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Desde a década de 80, ganhamos bastante terreno. Mas algo que pode preocupar é a recente estagnação do índice.

Apesar dos conhecidos problemas de qualidade do nosso ensino, já é um começo termos mais pessoas nas escolas. Se pensarmos que o pessoal da década de 80 é quem está no início de seus anos no mercado de trabalho e nosso Índice de Educação era bem baixo à época, talvez no futuro a qualificação da força de trabalho seja superior à de hoje. Isso pode impactar positivamente na Produtividade do Trabalho, discutida acima, caso a estagnação observada desde 2008 seja passageira.

[caption id="attachment_2520" align="aligncenter" width="534"]Fonte: ONU - Índice de Desenvolvimento Humano [7] Fonte: ONU – Índice de Desenvolvimento Humano[/caption]

6 – Demografia

Como estamos tratando do crescimento do PIB total, precisamos considerar também o crescimento populacional. A ideia é simples: maior população, mais pessoas para trabalhar, maior crescimento do produto. Assim, uma parcela do crescimento econômico está ligado ao crescimento da força de trabalho.

Conforme o gráfico abaixo ilustra, a taxa de crescimento populacional vem caindo ao longo dos anos (linha vermelha) e já se encontra abaixo de 1% ao ano. A projeção do IBGE (a partir das barras claras) para a população brasileira indica que o crescimento vegetativo será menor que 0.5% ao ano. Ou seja, depender do crescimento da força de trabalho para crescer mais de 1% ao ano nos próximos anos não é uma aposta segura.

[caption id="attachment_2521" align="aligncenter" width="539"]Fonte: IBGE Fonte: IBGE[/caption]

Conclusão

Conforme vimos, podemos estar retornando à nossa tendência de crescimento de longo prazo, após um período de bonança externa que tende a acabar (se já não acabou) e, assim, dependeremos do nosso investimento, do aumento da produtividade e do aumento da nossa força de trabalho para gerarmos aqueles números bonitos de crescimento do PIB – 4.5%, 5%…7.5%.

Quanto ao investimento, vimos que não fizemos a lição de casa e praticamente torramos a nossa renda extra. Não aumentamos o nosso investimento de forma permanente (muito menos nossa poupança para financiar o investimento). Daqui, não espere uma contribuição ao crescimento econômico nos próximos anos.

Apesar de um leve aumento da produtividade em anos recentes, ela ainda cresce a taxas muito baixas e, desta forma, contribuirá pouco para o crescimento econômico nos próximos anos. A não ser que a melhoria da escolaridade impacte significativamente na produtividade do Brasil. Daqui, esperemos um crescimento de 0.5%-1% ao ano. Vamos dar uma canja para a educação que melhorou e chegamos a algo como 1%-1.5% ao ano – que seria o crescimento da renda per capita.

Como os dados e projeções do IBGE indicam, o aumento da população vem caindo e isso implica em menor crescimento da renda total, mas sem impacto na renda per capita: mais 0.5% daqui pra frente desse fator para o PIB total.

Por fim, arriscaria numa conta de padeiro os seguintes números para uma média dos próximos anos: PIB crescendo a 2% ao ano na média e PIB per capita crescendo a 1.5% ao ano na média. A conclusão é do meu Otimildo interior.

Leonardo Palhuca

 

Leonardo Palhuca

Doutorando em Economia pela Albert-Ludwigs-Universität Freiburg. Interessado em macroeconomia - política monetária e política fiscal - e no buraco negro das instituições. Escreveu para o Terraço Econômico entre 2014 e 2018.

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