Sem a reforma da Previdência o governo não vai ter dinheiro para mais nada

Na última terça-feira (15/08/17) o governo anunciou a nova meta fiscal, piorada em relação àquela prevista no começo de 2017, postergando ainda o horizonte de um superávit primário, este que ficou para depois de 2020. Apesar da piora do déficit, ainda estamos distantes da insolvência fiscal: existe o teto dos gastos, uma espécie de seguro contra o desastre. Mas apenas com o teto, sem a reforma da previdência, o país corre o risco de implodir, não fiscalmente, mas socialmente.

A aprovada PEC241, popularmente conhecida como PEC do teto de gastos, coloca fim ao crescimento real do gasto primário do governo de federal pelos próximos 20 anos. Em outras palavras, o gasto só poderá crescer em relação a inflação. O teto afeta apenas despesas primárias, despesas financeiras tais como o pagamento de juros da dívida pública, FIES, Fundeb e transferências constitucionais para estados e municípios não são encapadas pelo teto.

Quando olhamos o orçamento do governo federal a fundo, descobrimos que esmagadora maioria dos gastos são obrigatórios. Salários e aposentadorias de servidores públicos, bem como as despesas previdenciárias, correspondem por mais de 60% o gasto primário do governo, hoje. O tamanho dos gastos obrigatórios dentro do orçamento é assustador, como mostra o gráfico abaixo:

[caption id="attachment_10415" align="aligncenter" width="953"] Fonte: Secretária do Tesouro Nacional – STN e Mosaico do Orçamento – DAPP-FGV[/caption]

O grande vilão dos gastos obrigatórios são os do tipo previdenciário, além de já responder por um pedaço enorme do orçamento federal, tem um crescimento contratado enorme para as próximas décadas, pois o país está envelhecendo rapidamente. E o crescimento anual das despesas previdenciárias será maior que a inflação, seguramente.

Como existe um teto de gastos, então o orçamento fica constante em termos reais; logo, se alguma modalidade dos gastos está crescendo mais rápido que a inflação, os demais gastos precisam ser achatados para que tudo se acomode dentro do orçamento. Como lidar com esse problema?

A solução é inexorável: fazer uma profunda e robusta reforma da previdência, caso contrário com o passar do tempo, e a ação do teto de gastos, todas as outras despesas que não envolvem previdência precisarão ser achatadas, inclusive aquelas ligadas a pagamento de salários de funcionários públicos, custeio das policias, programas assistenciais e investimentos federais.

O primeiro gráfico abaixo, retirado de uma apresentação do Ministério da Fazenda, mostra a dinâmica dos gastos públicos com o teto passando a agir sobre o nível de gastos de 2017. E como seria o crescimento do gasto ao longo do tempo, sem o teto. Já o segundo gráfico, elaborado por este autor, mostra que caso nada seja feito em relação aos gastos previdenciários, e com o teto agindo, em 10 anos, 79% do orçamento será gasto com previdência, enquanto para todo o resto sobrarão apenas 21%.

[caption id="attachment_10416" align="aligncenter" width="1482"] Fonte: Apresentação Ministério da Fazenda; Elaboração Própria[/caption] [caption id="attachment_10417" align="aligncenter" width="1391"] Fonte: Apresentação Ministério da Fazenda; Elaboração Própria[/caption]

O cenário desenhado pelo segundo gráfico é assustador: se hoje o Estado já funciona bastante mal com a quantidade de recursos quetem, imagine um futuro em que o orçamento será cada vez mais compactado; algum cenário de caos social pode ser contemplado seguramente.

Sem a reforma da previdência – a mais importante das reformas fiscais – e também uma ampla reforma que reveja o tamanho da máquina pública, o país não vai ter dinheiro para o básico. Hoje já vemos a policia rodoviária federal deixando de fazer patrulhamento em estradas pois não tem tido o repasse correto de recursos. Hoje! Imagine isso 10 anos à frente com o orçamento para esse tipo de atividade sendo bem menor do que é o atual.

Victor Candido

Mestre em economia pela Universidade de Brasília (UnB). Economista pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Foi economista-chefe de uma das maiores corretoras de valores do país, economista do Banco Interamericano de Desenvolvimento e atualmente é sócio e economista de uma gestora de fundos de investimento. Foi pesquisador do CPDOC (O Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) da FGV-RJ. Ajudou a fundar o Terraço Econômico em 2014.
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