A economia brasileira se encontra em crise. A opinião dos economistas diverge em relação aos principais motivos que levaram o país para baixo, mas há certo consenso em dizer que o aprofundamento desse cenário se deu em uma crise de confiança dos agentes. A confiança é um elemento fundamental para determinar as ações dos indivíduos, em conjunto com outros fatores, principalmente em relação às variáveis de consumo e investimento. Se consumidores ou empresários não estiverem confiantes de que o país se enquadra em um bom cenário econômico, dando possibilidades de crescimento de renda e receita, eles não irão optar por consumir ou investir, mas sim por manterem-se cautelosos.
A confiança dos agentes também tem uma íntima relação com as expectativas, que são nada mais do que previsões sobre o cenário econômico e que conduzem as ações do empresário e do consumidor. Os agentes buscam sempre a estabilidade e a menor possibilidade de risco em suas ações, ou seja, para se sentirem seguros precisam dispor de informações relevantes sobre as variáveis econômicas e sobre o movimento das mesmas no futuro. Confiança e expectativas andam juntas, uma vez que se os agentes não estão confiantes no presente, é muito provável que suas expectativas para o futuro não sejam agradáveis. Conforme já havia registrado Keynes (1936, cap. 12), o chamado “estado de confiança”[1] é fundamental no processo de investimento, uma vez que os empresários devem confiar nas expectativas, no sentido de que somente renunciarão à liquidez e suas vantagens se sentirem otimistas na confirmação das mesmas no futuro. Os empresários devem confiar em suas próprias perspectivas, pois para que a maioria dos investimentos se concretize no longo prazo, é necessário que eles permaneçam otimistas para a confirmação de suas vantagens.
Porém, como mensurar algo tão subjetivo como a confiança dos agentes? A melhor opção encontrada foi o desenvolvimento dos chamados índices de confiança, extremamente difundidos nos meios econômicos. Diversas entidades desenvolveram, de acordo com suas próprias metodologias, formas de mensurar e criar índices de confiança capazes de captar a opinião do empresariado ou do consumidor sobre as variáveis econômicas. Esses índices examinam tendências gerais, de modo que, quando o índice de confiança entra em declínio, indica grandes possibilidades de a atividade avaliada também entrar em queda. Porém, esses índices realmente registram uma tendência verdadeira? São realmente condizentes com o que ocorre no ambiente econômico?
O Índice de Confiança do Consumidor (ICC) é coletado mensalmente pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (sendo que outras entidades também coletam esse tipo de índice), com base em perguntas dicotômicas nos moldes do indicador de confiança de Michigan, criado em 1950. A metodologia foi adaptada para a realidade brasileira, sendo que o principal objetivo é identificar o “humor” e percepção dos consumidores em relação as suas condições financeiras atuais e suas perspectivas futuras. O Índice também agrega em sua composição divisões por faixa de renda e sexo, a fim de obter uma média entre a opinião dos diferentes públicos consumidores.
Analisando o índice, percebemos a partir do gráfico abaixo a deterioração da confiança e consequente acompanhamento desta queda nas despesas em consumo. O consumo dos agentes está fortemente ligado à sua renda disponível e à taxa de juros. Estes fatores, por sua vez, estão relacionados a outros dois importantes aspectos econômicos: o desemprego e o acesso ao crédito. Visto que atualmente temos uma taxa elevada de desemprego e altas taxas de juros que dificultam o acesso ao crédito, é evidente o movimento de queda que está evidenciado no gráfico abaixo. Apesar da confiança do consumidor ter tido uma leve melhora no segundo trimestre de 2016, a recuperação do consumo é mais lenta.
Despesa de Consumo das Famílias e ICC – São Paulo
Fonte: Elaboração Própria com dados do IBGE e Fecomércio-SP.Como principais impactos desse fato, temos uma quebra no ciclo produtivo uma vez que o produto final não está sendo consumido como antes. O setor de Serviços e o de Varejo são os primeiros a sofrerem com a queda do consumo, uma vez que são atividades que estão em contato direto com o consumidor. Mas logo os outros setores também sentem os problemas da baixa demanda, iniciando um problema cíclico. Analisando o Índice de Volume de Vendas no Comércio Varejista, o ICC continua acompanhando o padrão de queda. Um dos componentes do ICC, o ICEA (Índice de Condições Econômicas Atuais) também demonstra bem como a insatisfação e a incerteza da população com suas condições financeiras influenciam drasticamente no consumo e no setor varejista.
Volume de Vendas no Comércio Varejista e ICC – São Paulo
Fonte: Elaboração Própria com dados do IBGE e Fecomércio-SP.Outro índice muito importante utilizado como indicativo da atividade econômica é a confiança do empresário. Também divulgado pela Fecomercio-SP, o ICEC (Índice de Confiança do Empresário do Comércio) é produzido a partir de informações sobre as percepções dos empresários em relação às condições econômicas, seu setor de atuação e sua empresa. As principais perguntas envolvem as perspectivas de investimento, contratação de empregados e situação dos estoques, também possuindo variações a respeito do tamanho da empresa e níveis de faturamento.
Conforme o gráfico abaixo, o ICEC vem mostrando uma trajetória de deterioração, assim como o Índice de Receita Nominal de Vendas no Varejo. Os empresários demonstram certo receio em investir na expansão do negócio, visto que as vendas não caminham numa direção positiva. Esse fato se deve em muito à queda de consumo das famílias, fazendo com que muitos empresários acabem por demitir funcionários para manterem certa margem de lucro, e, deste modo, o quadro cíclico de desemprego, queda de consumo e desaceleração da atividade acaba sendo agravado.
Indicadores do Comércio Varejista
Fonte: Elaboração Própria com base em dados da Fecomércio-SP e Banco Sidra, IBGE. Do exposto, pode-se concluir que os índices de confiança, apesar de sua subjetividade, retratam em grande parcela a realidade econômica. Os agentes perderam sua confiança na economia, reproduzindo expectativas ruins em seus planos de ações. É necessário que as autoridades econômicas e políticas tenham transparência em suas ações futuras, tentando resgatar a confiança dos agentes na economia e mudar suas expectativas, que após um breve suspiro estão novamente esboçando trajetória de queda.Délis Magalhães – Formada em Economia pela UNESP – FCLAR. Economista especializada em análise de assuntos macroeconômicos e apaixonada pelos debates sobre conjuntura econômica, cenário nacional e internacional.
[1] KEYNES, J. M.; A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. 2. Ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985.