“O acesso à educação de qualidade é a garantia de oportunidades e possibilidade de transformação da vida do indivíduo, além do desenvolvimento do país”.
É comum ouvir a frase acima em discursos de candidatos ou entrevistas de intelectuais. O raciocínio é simples: se quisermos reduzir nossas desigualdades sociais, o carro-chefe deve ser a garantia de educação de qualidade, acessível a todos os indivíduos. Seria essa mesmo a salvação nacional?
Artigo recente, publicado pelo IPEA, intitulado “Educação, Desigualdade e Redução da Pobreza no Brasil”, escrito por Marcelo Medeiros, Rogério Barbosa e Flavio Carvalhaes traz uma importante contribuição para esse tema.
Os autores buscaram simular, através de equações salariais, o que aconteceria com o nível e a distribuição de renda se a força de trabalho tivesse pelo menos determinados níveis de educação: médio completo, superior incompleto e superior completo (variando o tipo de curso concluído). Mantendo todas as demais variáveis sob controle, foram recortados quatro momentos históricos em que poderia ter ocorrido uma “revolução educacional”: 1956 (Plano de Metas); 1974 (pico de crescimento econômico durante o regime militar); 1988 (promulgação da Constituição Cidadã) e 1994 (Plano Real).
A comparação deu-se através da simulação do índice Gini que seria observado no ano de 2010, com aquele efetivamente observado na realidade. Os resultados mostram que apenas o efeito da melhora educacional da população economicamente ativa não faria uma queda abrupta da desigualdade observada no Brasil. Em alguns casos, inclusive, aumentaria a desigualdade em curto/médio-prazo. Para que o efeito sobre a desigualdade fosse mais forte, seria necessário massificar o acesso ao ensino superior. Em apenas poucos casos, a redução da desigualdade superaria 10% apenas pelos efeitos educacionais.
Isso acontece por variadas razões, mas, em especial, devido à inércia demográfica (o tempo necessário para que os trabalhadores mais educados substituam os anteriores e tornem-se maioria disponível no mercado). Desta forma, os frutos colhidos pela revolução educacional se manifestariam depois de décadas e, mesmo assim, seriam tímidos.
Além disso, para fazer as simulações, os autores assumiram hipóteses bastante otimistas, que dificilmente se manifestam na prática. Por exemplo, foi assumido que a melhora educacional teria o mesmo efeito para todos os indivíduos da população, desconsiderando as características demográficas e as diferenças de origem desses indivíduos. Também se considerou que o mercado absorveria totalmente os profissionais mais qualificados – algo impensável na prática – principalmente quando se observa, atualmente, uma taxa de desemprego quase duas vezes maior entre mestres e doutores. Outro ponto desconsiderado foram as redes de convívio social de cada indivíduo e como isso facilita ou dificulta o ingresso no mercado de trabalho.
Evidentemente, após ler e analisar o artigo, a conclusão não deve ser abandonar os investimentos em educação. Ela continua sendo importante para o desenvolvimento econômico do país, no entanto não é ela a grande responsável pela redução dos níveis de pobreza e desigualdade. Não devemos induzir, a partir de um caso particular de superação de adversidades e ascensão social através da educação, que ela seria o elemento mais importante para massificar o processo.
Além da educação, conforme citam os próprios autores, o país deve pensar em outras medidas, como aquelas tomadas no passado recente: valorização do salário mínimo, programas de transferência de renda e formalização dos empregos.
São cruciais, portanto, reformas estruturais, como a tributária e a modernização de leis trabalhistas, sem contar as reformas fiscais para tornar o Estado brasileiro sustentável a longo-prazo, e assim, garantindo um bom ambiente de negócios e segurança jurídica para que o potencial obtido com a eventual melhora nos índices de educação possa se reverter em ganhos de produtividade e redução expressiva da pobreza e desigualdade social.