Terraço Econômico | por Arthur Solow*
A cotação do dólar é assunto de grande parte da mídia, seja impressa ou digital. Depois de um período na casa dos R$2,30, a moeda americana passou para patamares superiores, chegando nessa semana ao valor de R$2,60, voltando para R$2,52 na sexta-feira. Quais são os motivos para essa subida em tão pouco tempo? Há ganhadores ou perdedores neste novo cenário do dólar caro? São essas questões que serão debatidas neste artigo.
[caption id="attachment_2199" align="aligncenter" width="508"]Dólar, por que sobes tanto?
Muitas pessoas se perguntam atualmente quais seriam os motivos para a subida brusca do dólar frente ao real. Enumero três motivos principais tanto pelo lado interno (comportamento da economia brasileira) como pelo externo (crescimento da economia mundial)
Razões internas para enfraquecimento do real:
- Piora no quadro das contas externas (o déficit em conta corrente superou 3,7%/PIB, o maior em 12 anos). De forma simples, quando há déficit, está saindo mais dólares do que entrando, e por isso, há muita oferta de reais e alta demanda por dólares, puxando a cotação da moeda americana.
- Baixo crescimento do PIB (expectativa de elevação de 0,3% em 2014), o que desanima investidores que esperavam que o Brasil crescesse de modo semelhante aos pares emergentes. Muitos deles começam a olhar com mais carinho para o Peru e México.
- Intervenção constante do governo na economia, em diversos setores, o que acaba afugentando investimentos estrangeiro dado a elevação do Risco Institucional. Além disso, indefinições políticas, como a demora para a definição do ministro da fazenda, continuidade ou não da política econômica, acabam repelindo investidores.
Razões externas para fortalecimento do dólar:
- A economia americana volta a crescer, mostrando sinais de recuperação desde a crise iniciada em 2008. Com isso, o BC pôde rever sua política de juros próximas a zero, uma vez que encerrou o programa de compras de título. Supondo uma subida dos juros americanos, parte do fluxo de capitais voltará para os EUA (como já vem acontecendo), pressionando as moedas dos países emergentes.
- Redução no ritmo de crescimento chinês. Por ser um grande importador de commodities agrícolas, a redução na perspectiva de crescimento na China e da própria cotação do minério de ferro inibe investimentos em empresas brasileiras que se beneficiam da exportação desse bem, (Gerdau, Vale, etc). Com isso, a demanda por reais se reduz.
- Por fim, há a discussão do crescimento dos países emergentes em geral, com a Rússia com problemas políticos, a Índia com problemas sociais, a China desacelerando e o Brasil com o seu “voo de galinha”. Desse modo, as moedas dos países emergentes se desvalorizam frente ao dólar.
Mas quem ganha e quem perde com a subida do dólar?
Como se sabe, em qualquer ocasião ou evento, sempre há vencedores e perdedores, ou, se preferir, alguém que se beneficia com uma determinada situação e outro que é prejudicado. Quanto à subida recente do dólar, a situação não é diferente:
Maiores Beneficiados
Sem dúvida, os que se dão melhor com o dólar caro são os exportadores, que ao vender seus produtos para outros países recebem em dólares e, quando transformam o montante em reais, obtém maior valor em moeda nacional. São exemplos desse grupo de empresas a EMBRAER, VALE, GERDAU e empresários autônomos especializados na exportação de produtos nacionais para o exterior.
Há ainda os turistas que visitam o Brasil se beneficiando do real desvalorizado. É possível comprar mais caipirinhas com menos dólares….! Se bem que tenho a singela impressão que o fator preço não é determinante para a decisão do nosso querido Gringo hipotético!
Os prejudicados
Por outro lado, há um grupo que não está nem um pouco confortável com a oscilação crescente da moeda americana frente ao real. Como é possível deduzir, os importadores são os maiores prejudicados, uma vez que compram os produtos em dólares e, para isso, necessitam de mais reais para realizar o câmbio. Empresas que se enquadram nesse grupo, por exemplo, são as varejistas (RENNER, HERING, etc), e marcas de carros de luxo (FERRARI, AUDI, etc.)[1]. Outras empresas que são prejudicadas são aquelas que têm parte de sua dívida denominada em dólares, isto é, contraíram dívidas no passado para aproveitar o dólar barato de outras épocas. Aqui, as mais lembradas são SABESP, CESP, Petrobrás, entre outras.
Por fim, os viajantes são bastante prejudicados pela alta do dólar. Fazer compras no exterior ficou mais caro, mas tenho a impressão que a leva de turistas brasileiros na 5a avenida em NY ou nos outlets em Miami não vai cair drasticamente. O que vai mudar, ao que parece, é que a famosa regra “multiplica por dois o valor do notebook/câmera/camiseta para ver o preço em reais” não cola mais. Provavelmente, haverá redução na compra de bens ditos supérfluos.[2] De qualquer forma, os gastos dos brasileiros no exterior somaram US$ 2,38mi, o maior para um mês de setembro e o segunda maior da série histórica desde 1947, só perdendo para a cifra de julho/2014, com US$2,41m.
Para onde vamos? (e a profecia autorrealizável)
No último boletim Focus – que reúne a resumo das expectativas de mercado a respeito de alguns indicadores da economia brasileira – datado de 14/11/2014, a projeção para a moeda americana para o final de 2015 já está em R$2,72. Há 4 semanas, estava em R$2,47. Dessa forma, a cotação do dólar parece estar sofrendo com um aspecto bastante discutido por nós economistas: a profecia autorrealizável:
Uma profecia autorrealizável ou autorrealizada é um prognóstico que, ao se tornar uma crença, provoca a sua própria concretização. Quando as pessoas esperam ou acreditam que algo acontecerá, agem como se a profecia ou previsão já fosse real e assim a previsão acaba por se realizar efetivamente. Ou seja, ao ser assumida como verdadeira – embora seja falsa – uma previsão pode influenciar o comportamento das pessoas, seja por medo ou por confusão lógica, de modo que a reação delas acaba por tornar a profecia real. (Fonte: Wikipedia)
Com a deterioração das expectativas para a economia brasileira e as indefinições do governo atual, a demanda por reais se retrai ao mesmo tempo que a oferta permanece a mesma, ocasionando a redução do valor da moeda. A variação brusca da moeda americana é prejudicial para a efetivação dos negócios e para o crescimento econômico.
O caso da última sexta-feira, dia 21/11, é interessante. Com boatos pela escolha de Joaquim Levy para o cargo de ministro da Fazenda, a cotação do dólar caiu 2% em apena um dia, voltando a casa de R$2,52. Segundo noticiou a Folha de São Paulo, “pessoas próximas a Levy dizem que ele dificilmente deixaria seu posto no Bradesco se não for para comandar a economia”. De qualquer forma, nenhum dos lados confirmou a informação.
Assim, a única certeza é que, por fatores internos e externos, o dólar não volta mais para a casa dos R$ 1,60 – 1,80 por um período prolongado. De resto, só nos resta especular.
* Arthur Solow Economista, é redator do Terraço Econômico
[1] As marcas de luxo de automóveis tem maior poder para repassar os aumentos dos custos na forma de maiores preços finais, afinal, os consumidores desses carros tem alto poder aquisitivo. O mesmo não pode ser falado das empresas varejistas, que tem poder limitado para repassar preços, e por isso vão ter que sacrificar sua margem de lucro
[2] A compra de um Iphone pode se enquadrar nessa categoria?