Gustavo Tasso
Nos últimos 20 anos, sobretudo após a constituição cidadã de 1988, o Brasil optou pela triste escolha de ausentar-se do debate sobre a reforma da previdência. O país falhou sob este aspecto. Em 2015, nos encontramos em crise econômica com forte recessão, devido principalmente ao descontrole dos gastos públicos e à ineficácia da ‘’nova matriz econômica’’. Sob esta ótica, o ajuste fiscal é o primeiro passo para a retomada do crescimento no longo prazo. É curioso ressaltar o descompasso da classe política em relação ao tema. Ao ausentar-se da agenda de longo prazo que passa pela reforma do sistema previdenciário brasileiro, o Brasil dá largos passos rumo ao precipício econômico.
Panorama
Ao analisar a situação demográfica de um país e o seu reflexo na previdência, vemos a seguinte estrutura. [1]
Apesar de nosso bônus demográfico estar acabando, o Brasil ainda é classificado como um país jovem e possui um gasto com previdência em % do PIB extremamente alto.
O déficit brasileiro somente com gastos da previdência (incluindo despesas do INSS, União, Estados e Municípios) foi de 3,1% do PIB em 2014. Em valores absolutos, representa um déficit de cerca de R$ 160 bilhões – equivalente a 5 anos de arrecadação da CPMFs.
Mas afinal, por que nossa estrutura previdenciária está com problemas?
Dentre os fatores que contribuem para a insustentabilidade do sistema previdenciário brasileiro, podemos destacar três: incentivos inadequados, mudança demográfica e indexação do benefício ao salário mínimo.
1. Incentivos inadequados:Aposentadoria – Quando se analisa a média de idade de aposentadoria em uma amostra de mais de 100 países (desenvolvidos/subdesenvolvidos), temos que para homens a média se aproxima de 64,9 anos e para mulheres 64 anos. [2] Agora se calcularmos a média da expectativa de vida para esses países, teremos algo próximo de 74 anos para homens e 77,9 anos para mulheres. De maneira geral, isto significa que, em média, as pessoas possuem entre 10-14 anos de benefícios previdenciários. Entretanto, o Brasil é um caso curioso: Possuímos três tipos de aposentadoria: por idade, por tempo de contribuição e por invalidez. Quando comparamos o fator idade, a média brasileira não é tão distante da média global, mas quando analisamos a aposentadoria por tempo de contribuição é que a situação fica extremamente preocupante. Dados do IBGE mostram que a expectativa média de vida no Brasil é de 71 anos para homens e 78,3 anos para as mulheres, sendo que a média de anos de recebimento do benefício das mulheres é de 26 anos, cerca de duas vezes o número de anos se comparado à média global.
Pensão – Outra distorção da Previdência Brasileira refere-se à generosidade do desenho institucional das regras de pensão. O Brasil é o único país no mundo que paga 100% do valor da pensão e ainda de forma vitalícia. As regras para recebimento de pensão consistem em um tempo mínimo de contribuição de 18 meses, 2 anos de casamento ou união estável, sendo que o valor engloba 100% do benefício independentemente de haver filhos ou não.. O resultado dessa estrutura jurídica branda é de que o Brasil gasta cerca de 3,6% do PIB apenas com pensão, enquanto a média mundial é de 1,4%, ou seja, gastamos 250% a mais que a média mundial.
2. Transição demográfica
Em 1980, o Brasil possuía cerca de 7,2 milhões de idosos e uma PEA (População Economicamente Ativa) de 66 milhões, isso gerava uma razão de dependência demográfica de aproximadamente 10%. Hoje, a situação vem mudando. O Brasil passa por um momento de transição demográfica, com a taxa de natalidade caindo e a expectativa de vida aumentando. Com isso estamos reduzindo consideravelmente a população jovem do país e aumentando a de idosos. Analisando as projeções demográficas para 2050, podemos constatar que o Brasil terá uma população idosa de 66,5 milhões e uma PEA de 128 milhões, nos levando à uma razão de dependência demográfica de quase 50%. Sob este cenário, as pessoas se aposentariam entre 52 e 55 anos e receberiam quase 40 anos de benefícios previdenciários. Caso isso se concretize, em 2050 somente em gastos previdenciários, o Brasil gastaria cerca de 12,2% do PIB.
3. Indexação do benefício ao salário mínimo
Nesses 20 anos, descontado a inflação, o gasto com previdência cresceu em valores reais cerca de 260% devido à indexação do benefício ao salário mínimo.
Caos Macroeconômico
A generosidade do sistema previdenciário brasileiro impacta diretamente a taxa de investimento do Brasil. Pesquisa feita pelos pesquisadores Ricardo Brito e Paulo Minari mostra que para 91% da população o padrão de vida é mantido na aposentadoria apenas com os programas de previdência. Desta forma, a taxa de investimento no país é extremamente baixa, pois não se tem estímulos para poupar. Além disso, os impactos da trajetória da despesa com a previdência geram desconfiança em relação, trazendo maior risco de insolvência e afetando a taxa de juros do país. Portanto, a atual estrutura previdenciária é insustentável.
Parece que desta vez, somente o viés econômico pode salvar o político, caso contrário, no longo prazo a conta não vai fechar, assim como já não fecha hoje em dia.
Gustavo Tasso Graduando em administração pela FEA USP Membro da Liga de Mercado Financeiro FEA USP
Notas [1] Ver pesquisa completa em: http://goo.gl/u7gUZb [2] Para mais detalhes, ver: http://goo.gl/UkxJas