Desenvolvimento Sustentável: um novo pensamento econômico

A Economia é o motor da nossa sociedade, é o modo que encontramos para nos organizar. Contudo, a busca incessante pelo desenvolvimento econômico a qualquer custo trouxe sérias consequências não somente sociais, mas principalmente ambientais. Mas então qual o caminho que devemos traçar a partir daqui? Interromper o desenvolvimento? Frear a economia? Na realidade, não. Basta olharmos para o propósito da Economia enquanto ciência: assumir a escassez dos recursos e buscar sua máxima eficiência. Portanto, basta aplicarmos este princípio nos problemas ambientais que começamos a descobrir ideias e soluções sustentáveis para o planeta e para a humanidade. E é assim que surge o embrião de um novo pensamento econômico: a Economia Ecológica.

“Para frente e para cima”, esse era o cerne do pensamento econômico que guiou as economias do século XX para o cenário em que nos encontramos atualmente. Ainda hoje, quando olhamos para uma nação e queremos saber se ela está prosperando ou não o primeiro indício que buscamos é o PIB, o Produto Interno Bruto, que basicamente mede o quanto aquele país produziu naquele período, e quando dividimos isso pelo número de habitantes, temos uma média da produção por cada habitante, que é chamado de PIB per capita, e quanto maior for este índice, maior o nosso entendimento de que esta nação está prosperando e evoluindo. Mas será que esse tipo de entendimento está correto? Para frente e para cima? A que custo? E até quando?

Evidentemente que o resultado do PIB é muito importante, mas um questionamento ainda mais importante deve estar sempre presente: Qual é a rocha que fundamenta a construção desses números? Quero dizer, o mais importante não deve ser o simples resultado da economia de um país, mas sim o caminho que foi trilhado para a construção deste resultado, ou seja, os custos e as consequências. Com isso pretendo alertar que este pensamento econômico de crescimento a todo custo, que está fundamentado nos livros e pensamentos do século XX e que por sua vez está enraizado nos séculos anteriores, tem um preço, um preço bem caro, e a conta está chegando.

A economista e professora da Universidade de Oxford, Kate Raworth, nos lembra logo no primeiro capítulo de seu livro “Economia Donut – uma alternativa ao crescimento a qualquer custo” que, na Grécia Antiga, Aristóteles distingue a “Economia”, descrita por Xenofonte, da “Crematística”, que se trata da arte de adquirir riqueza. Aparentemente esse conceito parece ter se perdido no século XX. Nós nos esquecemos que os recursos não são infinitos, nós nos perdemos de nossa origem. Veja, o conceito de economia criado por Xenofonte era “a arte de gerir um lar”, agora se por acaso perguntássemos a um cidadão qualquer o significado de economia, teríamos uma resposta muito mais próxima da definição de Crematística. Os conceitos parecem ter se fundido e o objetivo da economia parece ter mudado.

Mudanças climáticas, desertificação do solo, crise hídrica, perda de biodiversidade, derretimento das geleiras, acidificação dos oceanos, poluição do ar, crise populacional e crise de resíduos. Inúmeros problemas que são frutos diretos ou indiretos do pensamento de crescimento a qualquer custo. Ignacy Sachs já nos alertava “urbanização não pode ser sinônimo de desenvolvimento”, ou seja, não podemos tratar uma nação nociva ao planeta como uma nação desenvolvida. Tendo isso em mente Kate Raworth trata de definir o economista do século XXI: capaz de aprender, desaprender e reaprender com facilidade, o economista deste século tem a missão de, segundo ela, reinventar o modo como pensamos a economia e o desenvolvimento afim de garantir sustentabilidade e prosperidade para o planeta e para a humanidade. Um modelo de desenvolvimento social que pode ser muito conveniente para a discussão seria então o descrito pelo ecossocioeconomista (como ele prefere ser chamado) Ignacy Sachs, que descreve um modelo chamado de Ecodesenvolvimento Sustentável, que é sustentado por um importante tripé: objetivos éticos e sociais, responsabilidade ambiental e viabilidade econômica. Ou seja, seria uma série de políticas voltadas para o desenvolvimento tecnológico e social, mas que levem em consideração as condicionalidades do meio-ambiente e, por fim, para serem executadas precisam ser viáveis economicamente. Contudo, o próprio professor reconhece as dificuldades políticas de se implementar este plano de desenvolvimento.

Agora a missão nos dada por Kate parece ser ainda mais impossível de ser implementada na prática, mas o que nós precisamos é dar um passo de cada vez rumo a uma sociedade responsável social, ambiental e economicamente. A maior dificuldade hoje na visão de Sachs é conscientizar os líderes políticos e a população, e para isso o caminho é um só: educar as futuras gerações com programas de ensino sobre sustentabilidade e política de maneira interativa e descomplicada nas escolas. Além disso, outro importante passo é pensar em soluções práticas para os atuais problemas, um de cada vez, e observar se essas soluções podem ser aplicadas na prática.

Um dos grandes problemas que enfrentamos hoje é a crise de resíduos, ou seja, o excesso de lixo que produzimos. Além disso, devido ao clima mais quente, seco e o excesso de fertilizantes químicos, o nosso solo está morrendo. Mas o que o lixo que produzimos tem a ver com o solo? Tudo. O nosso lixo é, em grande parte, orgânico e pode ser usado em indústrias de compostagem para produzir adubo orgânico, que pode ser vendido ou doado para fazendas locais a fim de que elas possam nutrir melhor o solo, sem depender de fertilizantes químicos e devolvendo a vida a ele. As fazendas produzem o alimento, nós consumimos e geramos resíduos desses alimentos, que juntamente com outros resíduos como a serragem, podem ser coletados e enviados para a compostagem que transforma tudo em adubo, que será enviado para as fazendas, fechando o ciclo. 

San Francisco, na Califórnia, é uma cidade que serve de exemplo para esse modelo de coleta seletiva, com mais de 800 mil habitantes, os moradores da cidade possuem três lixeiras: uma azul, para o lixo reciclável, uma verde para o lixo orgânico (que vai para a compostagem) e uma preta, para o restante do lixo. Para que haja um incentivo para as pessoas colaborarem com a separação do lixo, o governo cobra para retirar o lixo caso o mesmo não esteja separado. O resultado? A cidade recolhe mais de 700 toneladas de lixo orgânico por dia. Segundo o próprio governador da Califórnia, Gavin Newson, em poucos anos, San Francisco se tornou um exemplo de uma metrópole sustentável e com uma economia crescente.

Outro grande desafio no caminho de uma sociedade sustentavelmente desenvolvida é a geração de energia limpa. A nossa atual tecnologia nos permite gerar energia de diferentes formas e com impacto ambiental quase zero: energia solar, energia eólica, energia por hidrogênio, energia gerada por imãs e muitas outras. Mais recentemente, alunos da PUC em Curitiba-PR desenvolveram uma hélice eólica helicoidal que pode gerar energia mesmo com o vento fraco do dia-a-dia. Essa hélice gera até 300 kW por mês, o suficiente para alimentar uma família de consumo comum, mas eles foram além, e resolveram colocar placas fotovoltaicas nas hélices, assim, quando o vento não for o suficiente, normalmente o sol que incide sobre as placas deve suprir a falta de movimento das hélices. Com isso, podemos notar que o grande desafio para uma energia limpa não está na geração de energia em si, mas no armazenamento, uma vez que as baterias atuais são nocivas ao meio ambiente, além disso, o custo para implantação dessas ideias ainda é muito caro. 

Não podemos olhar para a energia renovável como um único método, mas sim como um conjunto de métodos que juntos podem se complementar. Cada país e região do mundo tem a sua peculiaridade, e deve buscar aquilo que faça sentido no seu contexto. A Islândia é um exemplo de como usar aquilo que temos ao nosso alcance: Com 100% de sua eletricidade oriunda de energia renovável, o país soube muito bem aproveitar a intensa atividade vulcânica sob o solo como uma fonte de energia geotérmica. E não é só a Islândia que tem se importado em zerar o impacto de carbono na energia, a Toyota se utilizou do conceito de “Smart Cities” para idealizar um projeto de uma cidade inteira inteligente e sustentável no Japão, com impacto zero e promovendo a natureza e a saúde: a “Toyota Woven City”.

Ainda estamos muito longe do ideal enquanto sociedade, mas esses pequenos passos que vem sendo dados ao redor do mundo nos motivam a seguir em frente. Basta que cada um de nós tenha consciência de que não mudar nossos hábitos é uma escolha suicida, precisamos da mudança. Mas nada disso será possível com políticos irresponsáveis que só pensam no próprio bolso, precisamos de pessoas competentes e responsáveis que saibam gerir a humanidade, com uma visão do futuro, e somos nós quem fazemos a escolha.

Aos poucos novas ideias e soluções vão surgindo rumo ao Ecodesenvolvimento Sustentável descrito por Ignacy Sachs, novas soluções para os problemas ambientais e sociais que enfrentamos vão surgir nas cabeças de estudantes engajados ao redor do planeta, aos poucos novos economistas começarão a entender seu papel na sociedade assim como descreveu Kate Raworth. Assim a nossa “missão impossível” se torna cada vez mais possível. Por isso lembre-se: Você é responsável pelo mundo que construímos, é você quem escreve a história que será lida pelos seus netos e bisnetos. Por isso, seja lá qual for o seu propósito, não se omita, se engaje.

Nícolas Godoi

Estudante de Economia – UFSCar

Referências

RAWORTH, Kate. “Economia Donut – uma alternativa ao crescimento a qualquer custo”. Rio de Janeiro: Zahar, 2019.

SACHS, Ignacy. “Caminhos para o desenvolvimento sustentável”. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.

VEIGA, José Eli. “Sustentabilidade: a legitimação de um novo valor”. São Paulo: Senac, 2019.

ROMEIRO, Ademar. “Economia ou economia política da sustentabilidade”. Campinas: IE/Unicamp, 2001.

CAVALCANTI, Clóvis. “Economia e ecologia: problemas da governança ambiental no Brasil”. Rio de Janeiro: Revista Ibero Americana de Economia Ecológica, 2004.

Documentário: “Kiss the ground”. Netflix, 2020.

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