Convidados Especiais | Mônica de Bolle
A pergunta que mexe com corações e mentes de economistas, com as paixões arraigadas e com um sentimento por vezes equivocado de inferioridade perante as chamadas “ciências exatas”, tem, por incrível que pareça, uma resposta clara. Economia é ciência. Do mesmo modo que a “Ciência Política” é ciência, que a Sociologia é ciência, e que tantas outras ciências são, afinal de contas, ciência. O fato de ser ciência não deriva do uso da matemática para ilustrar argumentos, ou de modelos para mapear conclusões e certificar-se de intuições. Economia é ciência porque fornece a base para o pensamento sistemático, para a reflexão fundamentada sobre as questões que afetam as sociedades em diferentes épocas.
A Economia nasceu de um ramo da filosofia, depois se transformou em Economia Política, para, no século XX, perder a “Política” e virar só “Economia”. Penso que isso foi uma pena. Ao perder a “Política”, o ensino de Economia perdeu, também, a “História” e tornou-se cada vez mais técnico, mais matemático, mais árido, mais rarefeito. A matemática e os modelos são instrumentos fundamentais para o economista. Sem eles, é difícil organizar e sistematizar o pensamento, “provar”, conquanto isso seja possível, uma intuição. Mas isso não quer dizer que as ferramentas possam suplantar o conteúdo que o economista tem de ter. E o conteúdo depende de uma interdisciplinariedade maior, uma comunicação com as outras ciências sociais. Como fica mais rica, por exemplo, a compreensão da crise de 2008 quando a confrontamos com as grandes crises econômicas da história. Como é revelador entender que, em Economia, nada se cria, nada se perde, mas tudo sempre, sempre se transforma. E as transformações caem num ponto cego se não tivermos o referencial histórico.
Essa visão mais abrangente da Ciência Econômica explica um pouco, quiçá muito, do sucesso do livro de Thomas Piketty. O livro, como toda obra humana, tem vícios e virtudes. Muitos têm discutido os vícios, às vezes de modo tediosamente minucioso. Mas, a virtude! É a virtude que explica o sucesso. E, a virtude de Piketty é ter trazido à tona a história enterrada dos últimos trezentos anos para situar a discussão atual sobre a desigualdade nos países desenvolvidos. Por certo, muitos continuarão a procurar pêlo em ovo, ou a dissecar os argumentos de forma mais criteriosa avançando esse que é o mais fascinante dos debates da atualidade.
Economia é ciência? É. História, também. Só temos a ganhar se juntarmos as duas disciplinas, sem perder as ferramentas que sempre nos foram úteis, ainda que possamos questionar a capacidade de nos darem as respostas para as perguntas que interessam. Nossos alunos, sem dúvida, hão de agradecer.
Monica Baumgarten de Bolle
PhD em Economia pela London School of Economics
Economista do FMI entre 2000 e 2005 e desde 2007 Sócia da Galanto Consultoria