Estagflação: a nossa única certeza

Sabe o que acontece quando unimos recessão, juros baixos, desvalorização monetária, escassez de oferta de insumos e produtos, impressão de dinheiro, utilização de reservas e excesso de liquidez no mundo?

Uma coisa chamada de ESTAGFLAÇÃO!

Não há recessão que segure, estamos no olho do furacão de uma tempestade perfeita:

JUROS BAIXOS: é inversamente proporcional à inflação, ou seja, quando altos são instrumento de controle da mesma, quando baixos, do seu afrouxamento, o que se traduz em pressão inflacionária;

DÓLAR ALTO:  impacta a cadeia de suprimento e de bens de capital (lembrem que exportamos commodities e importamos tecnologia – não, o Brasil não mudou, já é assim a mais de um século!) Ora, com a desvalorização da moeda os insumos dobram de preço, valores que serão repassados para o consumidor final, em mais uma pressão inflacionária;

ESCASSEZ DE OFERTA POR IMPACTOS NA CADEIA LOGÍSTICA:  pandemias paralisam a economia, geram uma recessão agressiva a curto prazo, deste modo, a mortalidade inicial de algumas empresas, natural em tempos de volatilidade e caos econômico, atingem em cheio a cadeia de suprimentos! Problemas logísticos ou escassez da oferta de produtos provocam uma gigantesca pressão inflacionária.  Já deu para percebermos que a falta carne, leite, tomate ou produtos industrializados, provocam o galopante aumento nos preços. Falta de insumos e produtos geram, igualmente aos casos supramencionados, uma robusta pressão nos preços;

ESCASSEZ DE OFERTA POR IMPACTOS NA CADEIA PRODUTIVA: outro fator perigoso tem relação com problemas na cadeia produtiva, ou seja, um problema de falta de parafusos ou porcas, pode provocar a paralisia na manutenção do parque industrial, bem como na própria produção em si, seja de veículos, televisores… de toda uma infinidade de produtos. A cadeia produtiva é uma teia de interconexões, todas ligadas e interagindo com alguma sincronia. Dessincronizar, dimana em causar o emperramento de algumas engrenagens do sistema produtivo. Falta de produtos na prateleiras, como já dito antes, consiste numa erva daninha inflacionária.

IMPRESSÃO DE DINHEIRO NO BRASIL E EVENTUAL UTILIZAÇÃO DE RESERVAS INTERNACIONAIS: já foi anunciado pela equipe econômica a impressão de nove bilhões para o socorro dos informais, lógica que, de certa forma, se mostra coerente, no sentido de se tentar manter o patamar de consumo, que agoniza, moribundo e claudicante, em virtude da pandemia.

Todavia, em que pese parecer até uma escolha razoável, em essência, é um verdadeiro desastre: inundar o mercado de água, quando todos já estão quase morrendo afogados.

Ora, se inicialmente o problema tem sido a demanda, devido ao fato das famílias se encontrarem reclusas e, em face do medo, pouco propensas a consumir, ali depois da esquina, quando gradativamente estas famílias voltarem às ruas, encontrarão um colossal e arrepiante problema de escassez oferta, oriundo de um parque industrial totalmente arrasado, uma cadeia logística quebrada, insumos e produtos importados com preços totalmente inviáveis, inflacionados pelo dólar. É, seguramente vai faltar papel higiênico!

“Upa, Upa, Cavalinho Sem Medo”, ai ai… acho que vou tirar o meu Atari do porão, e já estou até me imaginado chegando na casa do “brotinho” com um DeLorean prateado do “De volta para o Futuro”. Sim, tudo nos leva a crer que estamos entrando num buraco de minhoca e retrocedendo o Brasil em quase 40 anos ! Como será que seriam os fiscais do Guedes (em alusão aos fiscais do Sarney)?

Por seu turno, o financiamento da dívida pública por intermédio da inflação, ou seja, imprimindo dinheiro e achatando os salários dos servidores, foi a cachaça mágica usadas sem moderação nos anos 80, o que alimentou uma das mais dramáticas crises contemporâneas de hiperinflação no Brasil. Aliás, é tudo o que a atual equipe econômica do governo sempre renegou de forma quase histriônica. Não é preciso dizer que inflação fortalece teratologicamente a concentração de renda, mas isso é pauta para outros ensaios…

O mais grave disso tudo, é que com a pandemia estamos sofrendo um problema de fluxo temporário e não de estoque. Assim, se num primeiro momento emitimos dinheiro para solucionar este problema de fluxo, aumentando sensivelmente a base monetária, como reverteremos este quadro no momento em que o consumo voltar? Emissão de dívida pressionando os juros pra cima num cenário que já é recessivo?

Não temos como queimar o café! Brincar com base monetária é esbarrar no câmbio, no juros e flertar ferozmente com um surto inflacionário, uma verdadeira pandemia de inflação! COVID-IPCA !

Por fim, utilizar reservas com o risco de perder a “bazuca” nesses momentos de crise, não me parece uma estratégia minimamente razoável, seria como ir para o fronte da guerra portando na mão uma colorida faca de cozinha.  Haja espírito de MacGyver, figura icônica do seriado “Profissão Perigo” dos anos 80, que com um canivete suíço, fazia do abacaxi uma limonada!

EXCESSO DE LIQUIDEZ MUNDIAL: mesmo antes da pandemia já se falava em “excesso de liquidez mundial” e da “perigosa alavancagem das empresas”, tomadas em vultuosos empréstimos – como diria Mark Twain, um banqueiro é um homem que “te empresta o chapéu de chuva quando faz sol e que o tira quando começa a chover”-, e vai faltar chapéu!

De fato, empresas que se embriagavam fartamente em credito fácil e abundante,  sofrerão uma prolongada estiagem creditícia, assim que passada a tempestade.

Ocorre que ainda não vimos os corpos boiando, e não estou falando de vítimas humanas do COVID-19, falo das empresas cuja a tragédia ainda não se vê refletida nos balanços anuais, falseando suas verdadeiras condições de temperatura e pressão para seus credores, que daqui a pouco iniciarão uma cruzada em busca dos seus chapéus de chuva.

É… depois de passar meses estocando um container de atum, agora só consigo pensar: seria boa a hora de começar a fazer estoque de ouro e pedras preciosas?!

Arthur Valle

Mestre em Administração Pública pela EBAPE/FGV, MBA pelo Ibmec e autor das obras Fortuna Imperatrix Mundi – Um alerta para a crise global e A revolução do gás não convencional nos EUA: uma nova corrida do ouro?
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