Matemática no mundo da Economia

Platão costumava dizer que os números governam o mundo, Galileu disse que o livro da natureza fora escrito exclusivamente com figuras e símbolos matemáticos, Santo Agostinho profetizou que sem os recursos da matemática não nos seria possível compreender muitas passagens da Santa Escritura.

A matemática sempre esteve presente no desenvolvimento da civilização. Se faz presente por formas, padrões e probabilidades, em que os números são os indivíduos que escoram toda essa matéria.

Pois bem, para além de aforismos matemáticos, os números são apenas a porta de entrada, uma rota pela qual podemos mergulhar nesse impressionante mundo e que tem correlações com outras grandes áreas do conhecimento, como engenharia, medicina, genética, inteligência artificial, música, tecnologia e tantas outras. E aqui não falamos de apenas da alta formação em matemática pura ou aplicada, mas também da formação básica para crianças e jovens, que serão as gerações responsáveis por aprimorar – sob o ombro de gigantes – todo o conhecimento pretérito gerado.

[caption id="attachment_10408" align="aligncenter" width="458"] Alfabeto grego: até hoje empregado nas fórmulas matemáticas[/caption]

Nessa linha, durante o século XIX, as ciências econômicas foram fortemente influenciadas pelos métodos de modelagem matemática inspiradas nas ciências naturais, em particular a física. Um dos objetivos era aproximar um pouco mais a economia de uma ciência exata, fornecendo resultados mais facilmente quantificáveis ​​e replicáveis.

Talvez os primeiros modelos econômicos parecidos com os que utilizamos hoje são o de Thomas Malthus, sobre a demografia, e o de von Tuhnen, utilizando uma análise marginal para calcular o aluguel de terras.

Mas o grande destaque mesmo fica para o pioneiro Auguste Cournot (1801-1877), que com o ferramental matemático abriu um novo caminho para a compreensão da Economia. Cournot, o leitor economista sabe, trabalhou no conceito de equilíbrio e utilizou seu modelo de duopólio para a caracterização do equilíbrio de uma economia oligopolista.

Seus herdeiros foram Leon Walras (1834-1910), que formalizou melhor a noção de um equilíbrio geral, William S. Jevons (1835-1882), trabalhando no conceito da utilidade marginal, Francis Y. Edgeworth (1845-1926), aquele da Caixa de Edgeworth e que utilizou cálculos infinitesimais e introduziu as tão famosas curvas de indiferenças que todo jovem economista confronta nas aulas de Microeconomia, e que depois foram finalmente desenhadas pelo grande Vilfredo Pareto (1848-1923), desenvolvedor do Princípio de Pareto (se você é economista e não sabe o que é isso, recomendo voltar para os livros).


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A despeito das contribuições dessas lendas da economia, Alfred Marshall (1842-1924) talvez foi quem mais contribuiu para a transformação da economia numa ciência profundamente baseada no raciocínio matemático, dando luz a ideia de oferta e demanda, utilidade marginal e custos de produção, também sendo um dos “fundadores” da escola neoclássica.

Mais tarde, em 1944, fomos apresentados pelo matemático John von Neumann (1903-1957) e pelo economista Oskar Morgenstern (1902-1977) a tão famosa Teoria dos Jogos, cujo leitor curioso pode conhecer mais no artigo dos nossos amigos do PorQue.com (Entenda o que é a Teoria dos Jogos).

Enfim, há diversos outros famosos economistas que lançaram mão da matemática para desenvolver suas contribuições para a ciência, como Irving Fisher (1867-1947), Frank Ramsey (1903-1930), Paul Samuelson (1915-2009), Wassily Leontief (1906-1999), Kenneth Arrow (1921-2017), Robert Solow (1924), além de tantos outros.

Mas, afinal de contas, o que é a matemática e o que ela tem a haver com a economia? Sendo ela a forma essencial de análise lógica, realizada com utilização de números e símbolos, que lança mão do processo dedutivo, levando suas conclusões de resultados particulares para o geral de casos da mesma natureza, tem tudo a haver. Sem ela não haveria como evidenciar vários temas da economia tais como: equações do equilíbrio produto x consumo, os conjuntos, as relações, as funções, o teorema do valor médio, as séries temporais, os cálculos diferenciais e infinitesimais, por exemplo, nem como desenvolver gráficos, derivadas, logaritmos, integrais etc.

Veja, caro leitor, todas as fórmulas empregadas: derivadas, funções de otimização, espaço discreto, limites e integrais são na realidade ferramentas do economista, são formas que buscam dar harmonia e clarividência para uma realidade que, sabidamente, é complexa e caótica, e, claro, trata-se de relações entre pessoas e relações líquidas. Mas caso não saibam, até o caos pode ser modelado [1].

E desse bojo de fatores, a matemática passou a ter um papel importante não só no momento da construção de cenários e constatações da situação atual, mas também para compreender como chegamos até aqui e, principalmente, quais são as projeções para os próximos anos ou décadas, considerando tudo mais constante (ceteris paribus).

Lembramos que toda ciência possui dois aspectos. Uma ciência, para ser ciência, tem que possuir aspectos explicativos, na qual se tenta demonstrar a causalidade dos fenômenos. Por outro lado, a ciência deve ter um aspecto preditivo, leia-se, fazer previsões.

A sociedade americana de econometria adotava como lema a frase que dizia que “ciência é fazer previsões”. Imagine não levar em consideração as projeções da dinâmica da dívida pública para tomada de decisão na condução da política monetária? Imagine não possuir os dados de crescimento econômico previsto para os próximos anos, levando em consideração uma série de indicadores desagregados para compor o produto interno bruto de uma economia? Ou imagine não conseguir estimar o impacto de uma guerra de preços entre duas empresas para o consumidor? Apenas com instrumentos sofisticados de matemática e linguagem de programação tais analises são não só possíveis como também passiveis de serem testadas e refutadas.

Na economia, muitos dos resultados são práticos e diretos, tendo efeitos diretos na vida dos agentes econômicos e na interação entre eles. Como por exemplo, o Brasil é campeão dos últimos lugares quando o tema é nível de produtividade do trabalhador, e muito da produtividade (a relação entre a quantidade ou valor produzido e a quantidade ou o valor dos insumos aplicados à produção) de uma sociedade é decorrente da aplicação de ciências que se fundamentam na matemática. Daí a sua relação com a matriz produto, renda, consumo e poupança, que por consequência trazem maior nível de bem-estar e riqueza para a população.

São infinitos os exemplos que podemos oferecer sobre os instrumentos matemáticos utilizados no dia a dia do economista, tanto na elaboração de teorias como na tomada de decisão. E antes que comecem as críticas, é evidente que sabemos das falhas dos modelos, das incertezas envolvidas, das hipóteses implementadas e de toda a problemática envolvida com tais premissas, contudo não devemos cair no canto da sereia, muitas das vezes apregoados por certo economistas “exóticos” que tentam desmontar todo o aparato matemático, desmerecendo todo o primor da econometria e estatística, ao passo que valorizam uma longa e exaustiva retorica prolixa e por vezes vazia. No Brasil temos o estranho costume de valorizar economistas dessa categoria, ao passo que o mundo moderno (mesmo no campo heterodoxo) é embebido do mundo da matemática e teoremas.

Para finalizar, uma interessante constatação: o prêmio Nobel de 2015, Jean Tirole, tem uma formação bastante curiosa: Estudou matemática, psicologia, sociologia e economia, trabalha com economia e psicologia, teoria dos jogos, etc. O que cabe notar é que Tirole não lida exatamente com economia “pura”, mas com campos que ainda não foram explorados e que necessitam no aparato econométrico para fazer essa longa travessia para o desconhecido.

Mais dados, menos groselha. Por uma economia mais lúcida.

Pedro Lula Mota, editor do Terraço Econômico

Arthur Lula Mota, editor do Terraço Econômico

[1] Sistemas complexos e teoria do Caos: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/4249/4249_3.PDF

 
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