Nobel 2008: Paul Krugman | por Ana Maria Bonomi Barufi

Nova Teoria de Comércio Internacional e Nova Geografia Econômica 

Introdução

O norte-americano Paul Krugman foi vencedor do Prêmio Nobel de Economia em 2008 por sua pesquisa em comércio internacional e geografia econômica. Uma de suas principais contribuições à literatura foi integrar economias de escala em modelos de equilíbrio geral, ampliando o entendimento dos fluxos de comércio e da localização da produção em uma economia cada vez mais globalizada. 

Nova teoria de comércio internacional (NTT)

O modelo tradicional de comércio internacional se baseava na teoria das vantagens comparativas, que remonta a David Ricardo, posteriormente aprofundada por Heckscher e Ohlin. O padrão do comércio seria fundamentado nas diferenças entre os países (tecnologia ou acesso a fatores de produção). De maneira geral, esta teoria parecia ser capaz de explicar a maior parte do comércio internacional, mas ao longo do século XX, o aumento do comércio intrasetorial, principalmente entre países desenvolvidos, levou a uma redução de seu poder explicativo. Nesse sentido, um país poderia importar e exportar ao mesmo tempo bens similares. 

Em 1979, Krugman publicou um artigo seminal em que apresentou uma nova teoria de comércio internacional, baseada nas hipóteses de economias de escala e de que os consumidores desejam ter diversidade em seu consumo. 

Alguns anos antes, Dixit e Stiglitz (1977) tinham apresentado um modelo para analisar as preferências dos consumidores por variedade. Com isso, cada produtor, trabalhando com retornos crescentes de escala, se tornaria um tipo de monopolista de sua própria marca, mas competiria com as demais marcas. Firmas teriam incentivos para produzir grande variedade de bens, mas o custo de iniciar a produção faria com que, ao aumentar a produção, elas tivessem custos médios decrescentes, e, portanto, poucas variedades persistiriam no mercado.

Krugman observou que isso poderia explicar porque países com características idênticas comercializam entre si, inclusive dentro do mesmo setor. Faz sentido para cada país se especializar na produção de certa marca (com as vantagens das economias de escala), e os consumidores ao redor do mundo se aproveitam dos consequentes preços mais baixos e da maior diversidade.

No contexto do comércio internacional, conforme barreiras ao comércio caem, as firmas ganham acesso a mercados mais amplos, o que lhes permite ampliar a produção e obter economias de escala. Elas também ficam também expostas à competição externa, o que reduz sua margem, levando algumas empresas a não resistir. Ainda assim, no final das contas o consumidor terá mais opções para escolher, e as vantagens do comércio surgem não devido à especialização, mas sim em função de economias de escala, maior competição e da possibilidade de obter maior variedade de bens.

Custos de transporte decrescentes foram importantes para o crescimento do comércio, e Krugman (1980) os incorporou ao seu modelo de comércio internacional, no formato de custos de iceberg (uma fração dos produtos enviados “derrete” no caminho). Custos de transporte elevados geram um efeito do mercado doméstico, que leva firmas a se concentrarem em mercados proporcionalmente maiores.

A Nova Teoria do Comércio gera predições acuradas sobre o impacto da liberalização do comércio em padrões de comércio, a localização da produção e a remuneração de fatores. Ela pode também ser utilizada para análises de bem-estar.

Nova Geografia Econômica (NEG)

A geografia econômica lida com a decisão do local em que cada bem é produzido, e também com a distribuição de capital e trabalho entre países e regiões. Krugman trouxe a hipótese de economias de escala para esse contexto, propiciando o surgimento da Nova Geografia Econômica.

Ainda em seu artigo sobre comércio internacional, Krugman apontou que se dois países são exatamente iguais, possuirão nível semelhante de bem-estar, mas se eles diferirem apenas em relação ao tamanho da população, aquele com maior população deverá se beneficiar mais de economias de escala, e gerará maior remuneração do trabalho, atraindo mais consumidores e trabalhadores para esta região.

Em 1991, Krugman adaptou esses conceitos ao contexto de uma teoria de localização de trabalhadores e firmas entre regiões. Os principais elementos de seu modelo são que o comércio é possível, mas os custos de transporte o obstruem. Já o trabalho pode se mover entre as regiões, e deve se deslocar para o local com maiores salários reais e maior diversidade de bens. Por fim, as empresas tomam a decisão de se localizar de acordo com o trade-off entre economias de escala e o quanto elas poupam em custos de transporte.

Economistas demoraram muito tempo para trazer explicações de como disparidades espaciais podem surgir, dadas as limitações do arcabouço utilizado anteriormente, baseado em retornos constantes de escala. Starret (1978) apontou em seu Teorema da Impossibilidade Espacial que no modelo de Arrow-Debreu (1954), com retornos constantes de escala, número finito de agentes e locais, espaço homogêneo e transporte com custo, não há equilíbrio competitivo envolvendo troca entre diferentes locais. Desigualdades espaciais e especialização regional só ocorreriam se ao menos uma dessas hipóteses não valesse.

Fujita (1988) já considerava a possibilidade de diferenciação de produtos e economias de escala no nível da firma para explicar a formação endógena da estrutura interna das cidades, mas sem possibilitar desbalanceamentos entre regiões. Na competição imperfeita, as decisões de preço das empresas dependem da distribuição espacial de consumidores e de outras empresas. O modelo também prevê retornos à escala no nível da planta, e o transporte tem custo, de forma que a decisão locacional não é trivial.

A decisão locacional das empresas pode ser afetada pela competição de preços, que é um fator de dispersão, mas conforme elas produzem bens diferenciados, tal fenômeno perde força. As firmas buscam o mercado com custos de transporte mais baixos e maior demanda (efeito de mercado doméstico). Este último elemento poderia significar que as pessoas não poderiam migrar. O modelo do centro-periferia de Krugman resolve esta questão. 

O modelo centro-periferia começa com elementos semelhantes à NTT: competição monopolística, retornos crescentes e preferência por variedade. Além disso, considera a livre migração de trabalhadores qualificados no espaço e entre setores, e leva em conta custos de transporte do tipo iceberg. Seu objetivo é descrever a distribuição no espaço da população e da atividade econômica, considerando duas regiões (a princípio). Firmas e trabalhadores acabam sendo atraídos para o mesmo lugar para reduzir custos de transporte e de envio de bens (corça centrípeta), mas as pessoas também são atraídas por insumos naturais (força centrífuga).

O modelo parte da ideia de que a migração de certos tipos de trabalhadores afeta o bem-estar global e altera a atratividade relativa das regiões, com externalidades sobre o tamanho do mercado de consumo e sobre o mercado de trabalho de ambos os locais. 

Além disso, supõe a existência de duas regiões e dois setores, a indústria operando em competição monopolística (à la Dixit-Stiglitz) e a agricultura sob competição perfeita. Existem dois fatores de produção, um regionalmente imóvel usado na agricultura, e o outro regionalmente móvel e usado na indústria. 

Krugman identifica um processo cumulativo que ocorre pelo tamanho do mercado e seu efeito no custo de vida. O tamanho do mercado leva à concentração da indústria em uma região, e conforme esta região cresce, atrai mais demanda e por consequência motiva a entrada de mais produtores da indústria (efeito do mercado local), promovendo aglomeração deste setor em um único local (com causação circular de efeitos de ligação para frente e para trás, uma força centrípeta). Por outro lado, mercado mais concentrado aumenta a competição por preços, gerando uma força de dispersão (efeito de mercado lotado). 

Os custos de transporte acabam se tornando o fator-chave para determinar a distribuição espacial da indústria. Se eles forem suficientemente baixos, a firma não precisa se localizar no local com maior mercado para conseguir vender no mesmo, e ocorre menor aglomeração. Já se os custos de transporte forem muito elevados, haverá maior incentivo à aglomeração. Portanto, o modelo do centro-periferia traz fatores de convergência, mas também divergência.

Posteriormente, Krugman (1993) estendeu o modelo para múltiplas regiões, e Fujita e Krugman (1995) foram precursores na explicação de como padrões de uso da terra urbanos e para agricultura emergem de forma endógena.

Conclusão

De maneira geral, Fujita e Thisse (2008) destacam que nem tudo o que Krugman trouxe era novo, mas que ele foi capaz de esclarecer os fundamentos microeconômicos por trás das aglomerações e disparidades regionais no nível nacional e internacional, combinando os elementos de competição imperfeita, retornos crescentes e custos de transporte de maneira nova.

Ana Maria Bonomi Barufi

Professora Visitante do Departamento de Economia da UNIFESP e Gerente de Pesquisa e Inovação do Bradesco.

Referências

Arrow, K. and G. Debreu (1954), Existence of an equilibrium for a competitive
economy, Econometrica, 22, pp. 265-290.

Dixit, A.K., Stiglitz, J.E. (1977), Monopolistic competition and optimum product diversity. American Economic Review 67, 297–308.

Fujita, M. (1988), A monopolistic competition model of spatial agglomeration: Differentiated product approach, Regional Science and Urban Economics, 18, 87–124. 

Fujita, M. and P. Krugman, (1995), When is the economy monocentric? von Thü-
nen and Chamberlin unified, Regional Science and Urban Economics, 25, 505–528

Fujita, M.; Thisse, J.F. (2008), New Economic Geography: an appraisal on the occasion of Paul Krugman’s 2008 Nobel Prize in Economic Sciences. Regional Science and Urban Economics, 29, 109-119.

Krugman , P. (1979), Increasing returns, monopolistic competition and international trade, Journal of International Economics, 9, 469-479.

Krugman, P. (1980), Scale economies, product differentiation and the pattern of
trade, American Economic Review, 70, 950–959.

Krugman, P. (1991a), Increasing returns and economic geography, Journal of Political Economy, 99, 483–499.

Krugman, P. (1993), First nature, second nature, and metropolitan location, Journal of Regional Science, 33, 129–144.

Starrett, D. (1978), Market allocations of location choice in a model with free
mobility, Journal of Economic Theory, 17, 21–37.

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