O mínimo que você precisa saber sobre comércio internacional

O comércio internacional é um dos fenômenos econômicos mais importantes da história. Em termos absolutos, o nível de exportações no mundo se multiplicou por mais de quarenta vezes desde o início do século XX. Na mesma época, o valor de todas as exportações somadas equivalia a aproximadamente 10% do PIB global. Hoje, a mesma soma está na casa de 25% do PIB global. A magnitude dos números impressiona, a abertura comercial no Brasil já foi chamada de “mãe de todas as reformas”, mas será que realmente sabemos o mínimo necessário sobre comércio internacional? Bem, vamos lá!

Por que trocas de bens e serviços entre países acontecem?

É simples, necessidade. Numa explicação um pouco mais elaborada, essa necessidade é ilustrada por dois conceitos da ciência econômica:

  1. Custo de oportunidade: aquilo que você deixa de produzir ao tomar uma decisão;
  2. Vantagem comparativa: a capacidade de produzir um bem ou serviço sob custos de oportunidade inferiores quando comparado a um terceiro;

No primeiro, dado que os recursos econômicos (no sentido mais amplo da expressão) são escassos, pessoas para trabalhar, dinheiro para investir, terra para construir, tempo, etc., serão destinados a determinadas oportunidades de produção (fabricação de aviões, por exemplo) enquanto outras serão abdicadas (cultivo de soja, em outro exemplo).

No segundo, dado que pessoas, empresas ou países possuem dotações diferentes (número de pessoas aptas ao trabalho num país, nível educacional dessas pessoas, disponibilidade de recursos naturais, extensão territorial, etc), os custos de produção também serão diferentes. Em última instância, mesmo que um único país seja capaz de produzir aviões e soja (exemplo que será claramente utilizado para antagonismos), é comparativamente mais vantajoso que se especialize em uma das opções, venda-a no mercado de forma competitiva e compre aquilo que abriu mão de produzir a preços relativamente inferiores.

Globalizações

O processo de integração comercial entre nações ao longo do tempo também é chamado (às vezes pejorativamente) de globalização. Contudo, o processo de globalização pode ser divido em três fases relativas à natureza das trocas conduzidas.

A primeira fase, pré-globalização, é anterior ao século XIX e está ligada primariamente ao colonialismo, onde o fluxo de trocas se dava entre os grandes impérios e suas múltiplas colônias. Até então, a soma de todas importações e exportações que aconteciam no mundo dividida pelo PIB global não ultrapassava 10%.

A primeira onda de globalização começou no início do século XIX e foi impulsionada pelos avanços da primeira revolução industrial. Nesse período o comércio era notadamente intersetorial (produtos importados eram de setores econômicos diferentes dos exportados). Foi durante a época que as exportações entre nações da Europa ocidental, por exemplo, foi de 1% a 10% do PIB da região. O fim dessa primeira onda foi marcado pela queda do liberalismo político e econômico, e ascensão nacionalismo político.

A segunda onda de globalização aconteceu após o término da Segunda Guerra Mundial e foi impulsionada pelos avanços tecnológicos (e consequente redução dos custos de transação). Avião civil e comercial, melhorias na marinha mercantil, difusão do telefone são exemplos desses avanços, além da própria natureza das trocas com o ganho de importância do comércio intra-setorial (produtos importados eram intermediários usados na produção daquilo que seria exportado posteriormente, possibilitando maior grau de especialização produtiva das nações).

As duas grandes vitórias do comércio internacional

Aumento da eficiência econômica

Evidências empíricas apontam que há correlação entre crescimento econômico e crescimento do comércio internacional (enquanto fração do PIB). Essa associação está embasada em alguns fatores:

  • Competição: empresas que adotam novas tecnologias disponíveis mediante maior integração comercial tendem substituir empresas que não tiram proveito de tais inovações;
  • Economias de escala: empresas que exportam seus produtos trabalham com maiores demandas e, sob condições adequadas, produzem mais praticando preços por unidade menores que a concorrência;
  • Aprendizado e aquisição de conhecimento: empresas que competem internacionalmente são expostas a tecnologias, práticas setoriais e de mercado que podem ser absorvidas e se transformam em vantagens competitivas;

Aumento do bem-estar das famílias

Um maior grau de abertura comercial altera a oferta e demanda de bens e serviços em determinado país. Sendo assim, os mercados locais são impactados, os preços e afetam as famílias (isso é, pessoas comuns, consumidores e assalariados).

Algo que não é óbvio e pode passar despercebido na passagem acima é o seguinte: afetam as famílias, mesmo quando elas não trabalham em setores expostos à competição internacional. Numa economia nacional, seus diversos setores são interligados, logo, importações e exportações propagam seus efeitos para setores “abertos” e “fechados” através de mudanças no padrão de consumo (disponibilidade de bens ou serviços novos, ou a preços mais baixos) ou nível salarial (relações comerciais aumentam a demanda por trabalhadores de setores específicos, resultando em salários mais altos).

É isso, chegamos ao fim do mínimo que você precisa saber sobre comércio internacional. É um mar de rosas, certo? Não. A literatura sobre o tema é vasta, mas lembre-se ao menos de uma coisa: a abertura comercial, via de regra, é positiva para um país. Por que o caso do Brasil (ou de qualquer outro) seria diferente? Sabe a resposta? Não estou interessado. Eu não sei, mas sigo buscando…

Esse texto foi inspirado pela leitura de Our World in Data – Trade and Globalization.

Paulo Silveira

Graduando em Análise e Desenvolvimento de Sistemas pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) e ex-graduando em Economia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Trabalha com gestão de produtos digitais em startups brasileiras. Produz conteúdo sobre economia e tecnologia. Foi um dos vencedores do concurso nacional de resenhas organizado pelo Conselho Federal de Economia em 2017, escrevendo sobre a obra 'Princípios de Economia Política e Tributação' de David Ricardo.
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