Esta semana o país completará o terceiro mês da interinidade do presidente Michel Temer. Esses praticamente 90 dias se aproximam daquela velha marca simbólica dos 100 dias de “trégua” que os agentes da sociedade tendem a dar a um novo governo (embora este tenha sofrido manifestos desde o primeiro dia). Muita coisa já mudou, principalmente na composição do governo e muita coisa ainda está por mudar. Dito isto, acredito que valha a pena avaliarmos qual é o cenário para o possível presidente encarar nos meses seguintes.
Há vários riscos considerados de natureza política no horizonte que podem muito atrapalhar o (lento) andamento das medidas fiscais, podendo – no jargão comum – dar aquela “azedada” nas expectativas e reverter todo o lento processo atual de mudança de ciclo recessivo para um de estabilização-expansão. Dentre tais riscos políticos, podemos elencar alguns:
- O principal, necessariamente, é de que com o continuo avanço da Lava Jato podemos ver figuras cruciais da nova base governista serem atingidas e, por que não, o próprio presidente;
- Não podemos nos esquecer que dentro do governo há ministros que são possíveis candidatos potenciais às eleições em 2018 (como José Serra e Henrique Meirelles), e que irão ponderar quanto ao benefício do sucesso ou não do governo atual, em que já há boatos de interesse numa possível reeleição;
- Não há almoço grátis: consumado o processo de impeachment, a conta política chega e os aliados de Temer irão cobrá-la, com grandes chances de demandarem liberações de verbas em troca desse apoio, sobretudo neste ano de eleições municipais;
Juntamente com este cenário político ainda repleto de incertezas, o país está situado num contexto global de grandes turbulências, fator que irá impactar de forma tão decisiva aqui quanto a consolidação ou não do processo de afastamento da Presidente. Podemos destacar:
- As maiores economias têm registrado desempenho abaixo do esperado. Dentre elas, o grande destaque são os Estados Unidos, com fraco desempenho no segundo trimestre, que dentre outros fatores, levou ao adiamento do aumento dos juros por parte do FED (banco central dos EUA);
- As remunerações dos títulos públicos dos principais países continuam a ceder, com muitos papéis já pagando juros negativos, o que aumenta a atratividade dos títulos brasileiros – sobretudo na quase consolidação do impeachment;
- Os preços de petróleo e outras commodities voltaram a recuar, situação que pode frear os ânimos internos, dada a nossa ainda elevada dependência;
- Uma notícia boa é que os ativos da maioria dos emergentes já apresentaram um longo processo de ajustamento de preços, com destaque para a expressiva desvalorização cambial observada no passado recente;
- Voltamos para um quadro de abundante liquidez global, com as principais autoridades monetárias do mundo adotando medidas de estímulo monetário.
Embora um cenário político nacional e econômico internacional de vetores positivos e negativos, os mercados, por ora, parecem confiar na capacidade do novo governo de acomodar os riscos e avançar com uma agenda mínima de reformas que devem mirar a reversão no médio prazo da trajetória de deterioração fiscal. Outro fator que também tem ajudado a consolidar as melhores expectativas nos mercados é a recuperação (ainda que lenta) da atividade, assunto que já tratei em outro texto (Começou a retomada da economia brasileira?)
Tudo isso é relevante, ainda mais agora quando começar a pipocar boatos de uma possível reeleição de Michel Temer. O fato é que a reeleição e o fracasso do ajuste fiscal estão em barcos diferentes. Em outras palavras, caso falhe no campo fiscal, será muito difícil criar um ambiente favorável à reeleição.
Portanto, o governo Temer está condenado a perseguir o ajuste fiscal. Caso falhe, entrará na história para uma parcela da sociedade como um governo fraco e incompetente, ao passo que para outra será lembrada como golpista, seja qual for o resultado.
Arthur, editor do Terraço Econômico