Enquanto o noticiário econômico segue movimentado pelo onipresente debate em torno da reforma da Previdência e pelo contínuo encolhimento das previsões do PIB, o Brasil real, aquele em que a iniciativa privada vive seu cotidiano, observa um impressionante número e volume de operações de fusões e aquisições. Os exemplos se multiplicam.
A Natura anunciou a compra da rival Avon. Juntas, ambas as empresas vão representar a quarta potência mundial do setor de cosméticos. Com o novo controle dividido em 76% para a Natura e 24% para a Avon, a operação foi concluída tomando por base um valuation de US$ 3,7 bilhões para a Avon. Já no setor de alimentos, a Marfrig e a BRF anunciaram, no início de junho, que estão em tratativas para uma fusão. A combinação pode criar um grupo avaliado em cerca de R$ 28 bilhões e têm como objetivo ganhar porte para rivalizar com a JBS, a maior do setor em todo o mundo.
Essa transação, a ser concretizada, não está entre as 241 anunciadas entre janeiro e abril de 2019, número 21% maior do que as ocorridas em 2018. O recente anúncio de que o PIB nacional encolheu 0,2% no primeiro trimestre do ano e o consequente desânimo geral com as perspectivas de crescimento econômico para 2019, mesmo com a esperada aprovação da reforma da Previdência, deveriam sugerir cautela aos investidores. No entanto, o apetite por aquisições e fusões em negócios de extraordinário volume revela que há outra maneira de enxergar a atual fase do mercado brasileiro. Companhias saudáveis financeiramente entendem que esse é o período ideal para ir às compras. Graças ao marasmo econômico, existe uma expressiva quantidade de empresas disponíveis na praça à preços muito inferiores aos que seriam cobrados caso o Brasil estivesse esbanjando crescimento. Várias dessas companhias se tornaram eficientes depois de seguidos cortes de custos nos tempos de vacas magras. Com a aposta numa aprovação de uma nova Previdência e a promessa de que, além dela, outras medidas de impacto econômico serão tomadas pelo governo, é razoável imaginar que os ventos favoráveis para quem investir agora soprem já em 2020. Os exemplos são inúmeros.
A atual disputa travada pelo controle da Netshoes, por exemplo, põe frente a frente uma empresa gigante que quer botar os pés no ramo de artigos esportivos, o Magazine Luiza (última oferta: 94 milhões de dólares), e uma que pretende se consolidar nesse mercado, a Centauro (lance de 115 milhões de dólares). Em setores como o de saúde e o de educação, o que move as aquisições é a consolidação de mercado. A Hapvida, que opera planos de saúde no Norte e no Nordeste, garante uma atuação nacional ao adquirir o Grupo São Francisco, concorrente que está no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste, por R$ 5 bilhões. No âmbito educacional, a Arco levou o Sistema Positivo de Ensino, do Grupo Positivo, por R$ 1,7 bilhão. Com as compras e fusões, as companhias procuram os chamados ganhos de sinergia: eliminando-se redundâncias operacionais, os custos são reduzidos; ao costurarem as complementaridades, faturam mais. É uma questão de competitividade. Assim, mercados eficientes acabam sempre beneficiando, no fim das contas, nós: os consumidores.