O que é o dólar digital e qual a sua relação com as criptomoedas?

Basicamente desde o pós-segunda guerra temos os Estados Unidos como centro financeiro mais relevante do mundo e o dólar como sendo a “moeda universal”. O universo cripto não deixa de levar isso em consideração e busca ter proximidade com esse fato, tendo desenvolvido algumas alternativas de dólar em formato digital. 

Neste artigo esse é o assunto principal!

Antes mesmo de apresentarmos quais as conexões entre o universo cripto e o que se propõe como sendo dólar digital com relação direta com a moeda fiduciária que você já conhece, vale apresentarmos um breve histórico de como a moeda chegou até aqui. 

Em seguida, falaremos da diferença entre os projetos que perseguem o dólar (as stablecoins) e, ao final, das implicações para a economia como um todo. Vamos lá!

Os caminhos da moeda até aqui

Pare um minuto para pensar: qual a tecnologia mais antiga que envolva dinheiro que você conhece? Seria o cheque? Aquelas moedas conversíveis em ouro que seu bisavô colecionava e ficaram de relíquia familiar? 

Quando olhamos para a história da moeda, a questão vai muito mais longe do que isso.

Os primeiros sinais de integração entre povos no sentido de gerar transações vinham dos chamados excedentes. Alguém que observava alguma sobra em sua plantação e queria um pouco de outra safra tinha de encontrar alguém na ponta oposta. Sobrou milho e você precisa de arroz? Era preciso encontrar que tivesse arroz sobrando e quisesse trocar por milho.

A coisa toda começou a ficar mais tranquila na etapa seguinte, que envolvia colocar o valor das coisas em metais preciosos. Eram mais ricos os países e pessoas que tinham mais ouro, prata e outros do tipo, pois assim tinham maior possibilidade de trocar por bens e serviços que quisessem. Essa foi a era do metalismo

A era das moedas dos Estados Nacionais

De qualquer forma, transportar pedras preciosas não era tão fácil assim. Veio então a etapa seguinte, de ter o papel moeda conversível em algum metal. Em estruturas como a do chamado padrão-ouro, só era possível emitir desse papel moeda o quanto um país tinha em correspondente metálico.

Assim, alcançamos certa maturidade para entender que não era necessariamente importante ter algum “lastro” em metal precioso: vieram então as moedas fiduciárias, emitidas por Bancos Centrais que não são lastreadas em nenhum metal ou ativo, mas tem o seu valor com base na confiança entre as pessoas de que o governo vai ser prudente na emissão de novas unidades e, portanto, vai buscar a estabilidade da moeda.

Mais recentemente o fenômeno observado é o da tokenização, que é quando diferentes ativos são colocados em uma mesma base de comparação, em unidades que se diferenciam apenas pela cotação envolvida. De prédios comerciais, passando por sacas de soja e chegando até mesmo moedas como o dólar, basicamente tudo pode passar por essa verdadeira transformação.

Qual a diferença entre stablecoins e o dólar digital?

Stablecoins são, em resumo, projetos de criptomoeda que buscam acompanhar de alguma maneira a cotação estável de uma moeda fiduciária. Os meios como buscam fazer isso podem ser os mais diversos possíveis: desde a criação de alguma criptomoeda de apoio que sirva de lastro, passando a deter títulos de dívida naquela moeda ou mesmo ter uma reserva equivalente daquela moeda de maneira direta.

Em projetos de criptomoedas temos uma emissão e distribuição descentralizada, que leva em conta a utilização da rede e aspectos amplos em termos geográficos – ou, em bom português: podem até ter alguma ligação com alguma entidade emissora, mas pertencem mais a quem utiliza do que a essa entidade.

Quando falamos do dólar digital, acontece algo diferente: a emissão é feita diretamente por um banco central (como no caso da moeda fiduciária que já conhecemos) e, por mais que exista o ideal parecido com a ideia descentralizada do universo cripto, terá ligação bastante intrínseca à política monetária desse banco central. É o caso do projeto do real digital, capitaneado pelo Banco Central do Brasil.

Por ter essa ligação direta com a política monetária de um banco central, diríamos que, na prática, embora o meio possa ser muito mais fácil – no lugar de usar papel moeda você poderia passar a fazer as transações de maneira totalmente digital -, aspectos como a inflação atrelada àquela moeda seguem intactos. Muda-se o meio mas ficam mantidas todas as demais ineficiências.

Que implicações o dólar digital traz para a economia global?

Existem dois grandes pontos de atenção advindos do dólar digital para a economia global.

Pelo lado positivo, o que acontece é uma verdadeira facilitação de transações ao redor do globo que utilizam o dólar que, como você sabe, já é uma moeda bastante utilizada globalmente como referência de transações. Uma moeda já hegemônica ficaria ainda mais forte e presente ao redor do mundo, com menor dificuldade a cada nova transação.

O lado negativo e pouco apresentado quando projetos que vão nessa direção são colocados na mesa é o fato de que o mundo pode passar por uma verdadeira dolarização da economia. O risco embutido nessa mudança, de maneira bem simplificada, é que mais países ao redor do mundo fiquem dependentes da política monetária dos Estados Unidos e menos ligados a sua própria.

Imagine um exemplo extremo que já aconteceu para refletir sobre esse lado negativo: quando a Argentina dolarizou sua economia, tinha preços de bens e serviços ligados ao dólar sem ter o comportamento parecido na política monetária. Com isso, os impactos seguintes a essa decisão na economia argentina estavam interligados com decisões que não eram comandadas internamente, mas sim na “terra do Tio Sam”.

Pense na diferença que não faz para o dia a dia das pessoas usar alguma moeda “lastreada” em algo que, de uma hora para outra, a cada unidade da outra moeda são necessárias 50 da sua e, de repente, são necessárias 300 unidades ou mais… Agora imagine isso acontecendo com muitos países no mundo ao mesmo tempo.

Dólar digital ou projetos cripto que acompanhem o dólar: o que é melhor?

Levando-se em consideração o aspecto descentralizado e anti-inflacionário dos projetos de criptomoeda e o risco de “acompanhar sem acompanhar” a política monetária (que te apresentamos agora pouco), temos que os projetos que pertencem ao universo cripto mas perseguem a estabilidade do dólar são, ao menos em teoria, melhores opções ao mundo do que a transformação do dólar fiduciário em modelo digital.

Inclusive, dentre as criptomoedas mais negociadas, não é difícil encontrar projetos que buscam a paridade com o dólar em seus mais diversos meios. Não são projetos que iniciaram da noite para o dia, na verdade passam por testes de robustez e resistência o tempo todo.

Não se pode cravar que projetos de dólar digital sejam per se uma bomba relógio, mas é importante ter em mente que não se trata de panaceia, de solução mágica, a ideia de que “bastaria colocar uma moeda forte em diferentes países que situações particulares de cada país estariam resolvidas”. Essa é uma solução simples para um problema complexo, e cuja resposta não é assim tão trivial.

Em todo caso, como existem projetos que vão nessa direção, de tornar essa moeda fiduciária tão presente globalmente em um ativo de fato digital, é importante ter conhecimento do andamento de tudo isso e, como aqui apresentamos, das implicações para o mundo todo.

Seja para entender melhor a respeito de aspectos específicos do universo cripto ou mesmo das relações deste com o sistema financeiro tradicional, não se esqueça de verificar outros artigos aqui nessa coluna e também o Blog da Bitso!

Caio Augusto

Formado em Economia Empresarial e Controladoria pela Universidade de São Paulo (FEA-RP), atualmente cursando o MBA de Gestão Empresarial na FGV. Gosta de discutir economia , política e finanças pessoais de maneira descontraída, simples sem ser simplista. Trabalha como diretor financeiro de negócios familiares no interior de São Paulo e arquiva suas publicações no WordPress Questão de Incentivos. É bastante interessado nos campos de políticas públicas e incentivos econômicos.
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