Quem ganha com a ultra-politização das situações?

O dia 10 de maio guarda um momento muito esperado por uma enorme parte dos brasileiros: o encontro entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o juiz federal paranaense Sérgio Moro. Estes brasileiros se dividem basicamente em dois grupos majoritários: os que profetizaram que “a hora desse senhor iria chegar” e os que acreditam que ele seja poderoso e influente demais para sequer ser investigado. Se você, leitor ou leitora, não se sentiu inserido em nenhum destes dois grupos, junte-se a este que vos escreve: é preciso pensar mais friamente sobre as situações do que o que se tem atualmente.

Um breve levantamento dos últimos quinze anos nos mostra como evoluímos no quesito combate a corrupção. A Operação Lava Jato tem realizado um trabalho diferente no país. Alguns apontam que já houve precedente quando da investigação em CPI do Mensalão, em 2006 [1], ou da atuação de Joaquim Barbosa (para alguns, controversa) no julgamento em STF destes mesmos investigados [2], no início da década de 2010. Porém, a diferença com o atual momento é que efetivamente têm sido apontados os mandantes das operações – diferentemente do resultado em 2006, que colocou o caseiro Francenildo Costa na função de bode expiatório [3] (como se fosse possível que aquele que acusa um crime mais culpado fosse do que aquele que o cometeu) – e, além do mais, tem sido investigadas a fundo suas relações com o esquema de corrupção em questão. Antes disso, no final da década de 1990 e início dos anos 2000, tínhamos como Procurador Geral da República alguém que parecia estar sempre evitando que qualquer investigação ocorresse, o famoso engavetador. [4].

Teste rápido: se você chegou a esta parte e bradou “então devemos tudo ao governo do PT, sem ele não haveria investigação alguma”, muita calma nesta hora, porque você talvez tenha voltado a se inserir em um dos dois grupos descritos logo ao início deste artigo. O ponto aqui é diferente: não é preciso estar em um time, torcer para a “condenação deste sem-vergonha” ou “para que todos possam observar quão injusto o sistema judiciário brasileiro é com aquele que tanto ajudou os outros”. O que é preciso torcer é para que a lei seja aplicada da maneira mais adequada.

Dois fatos: primeiramente é preciso ser claro e admitir que sobre os investigados da Lava Jato pairam suspeitas – e provas, e delações premiadas, e extratos bancários, e conversas de Whatsapp interceptadas, e planilhas – de diversas naturezas; em segundo lugar, investigação não significa condenação sumária. Portanto, aqueles que acreditam que alguns indivíduos não precisam ser investigados por serem muito importantes e aqueles que acham que isso não é necessário porque a culpa já é notável antes de um processo como este estão ambos incorretos em suas análises. Aliás, estão apenas sinalizando que acreditam em uma justiça parcial, que só deve funcionar quando aqueles que merecem ser punidos pela vontade popular forem punidos.

A quem interessa politizar ao máximo as relações? É claro, aos próprios políticos. Sensibilizar a população com alcunhas como perseguição política é algo que chama a atenção e atrai a vontade de muitos de acreditar sem precisar pensar em evidências, a famosa pós-verdade. Não seja cego: ninguém é tão poderoso que não possa ser ao menos investigado – assim como ninguém é tão passível de culpa que também não precise de investigação para ser condenado. É justamente neste encontro de mares – o do “Lula merece a cadeia para sempre” e do “Lula não precisa ser investigado, e quem é contra isso é contra o Brasil” – que figuras políticas já bem posicionadas na história brasileira acabam por se sobressair como supostamente inocentes de qualquer acusação, basicamente por utilizarem o roteiro de sofrimento como sendo mais importante do que aquilo que realmente são investigados. E, pode acreditar, para alguém com o capital político do ex-presidente, essa confusão é bastante benéfica a ele mesmo.

Especificamente sobre o caso do ex-presidente Lula, existem cinco investigações em curso [5], nas quais diversos tipos de provas e elementos existem. Sabe o que ocorre se, ao fim das contas ele não for mesmo culpado de tudo que é acusado? Ele será inocentado – e, com altas chances, processará muitas pessoas. E sabe o que ocorre se ele for considerado culpado pela justiça? Ele será condenado e terá uma pena a cumprir. Não fantasiemos sobre qualquer aspecto que possa fugir da execução penal, pois isso apenas pode levar a uma conclusão de parcialidade de pensamento, além de tirar o foco do que está em jogo na próprio processo jurídico.

Seja a lei utilizada de maneira imparcial e encontre punição àqueles que cometeram ilícitos e o país acaba por melhorar ao longo do tempo. Seja a lei uma figura pendular entre a “acusação dos que merecem” e a “perseguição dos inocentes”, e seremos ainda por muitas décadas o país em que a imparcialidade domina, avanços reais em combate a corrupção são sempre temporários e os populistas perseguidos saem vitoriosos, independente de quaisquer problemas a eles associados.

Deixemos a justiça trabalhar, investigue-se quem quer que seja, para que enfim saibamos quem acabará sendo punido e quem acabará sendo inocentado, pois a não-investigação, por supostamente não haver necessidade, dada a culpabilidade da pessoa ser imensa ou nenhuma, é consideravelmente danosa para a confiabilidade das instituições brasileiras.

Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico Notas [1]          https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2015/06/05/dez-anos-depois-relembre-o-caso-mensalao.htm [2]          http://www.valor.com.br/politica/3586792/joaquim-barbosa-se-diz-ameacado-e-abandona-relatoria-do-mensalao [3]          http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2016/09/francenildo-costa-eu-estava-falando-verdade.html [4]          http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc250512.htm [5]          http://www.bbc.com/portuguese/brasil-38303771
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