Desde o nosso saudoso Império, a questão do saneamento básico já era discutida como um problema social no Brasil. De lá para cá, o que não mudou foi a presença maciça do setor pública tentando resolver esse embaraço. E que os serviços prestados estão longe de serem satisfatórios.
Para qualquer nação desenvolvida, o saneamento básico é uma questão basilar. Sem saneamento básico universal, não há desenvolvimento. Além de melhorar a qualidade de vida da população, ele também inclui um conjunto de medidas que visam preservar as condições do meio ambiente com a finalidade de prevenir doenças e promover a saúde. Não é atoa que um dos Objetivos do Milênio é assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todas e todos.
Na nossa Constituição Federal, o saneamento básico é um direito assegurado pela Lei nº 11.445/2007. No seu Art. 3, define saneamento básico como conjunto de serviços, infraestruturas e instalações operacionais de abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos além da drenagem e manejo das águas pluviais, limpeza e fiscalização preventiva das respectivas redes urbanas.
A falta de saneamento básico acarreta altíssimos gastos na construção de hospitais para uma demanda maior de pacientes. Em 2017, por exemplo, segundo o Ministério da Saúde (DATASUS), foram notificadas mais de 258 mil internações por doenças de veiculações hídricas no país. Gastar grandes quantias na construção de hospitais e deixar o tratamento de água e esgoto de fora, é uma forma de atacar os efeitos do problema, e não as causas.
Pior do que a falta de conhecimento das nossas autoridades do que vem antes e depois, só os números do saneamento básico no Brasil. Quase 100 milhões de brasileiros não possuem acesso à coleta de esgoto. Destes, 13 milhões são crianças e adolescentes. 13 milhões de crianças e adolescentes sem saneamento básico significam uma perda incalculável para o país. Aumento da mortalidade infantil e o declínio no rendimento escolar são os efeitos diretos. A diminuição da produtividade do trabalhador influindo diretamente na renda nacional, é outro.
A região norte apresenta os piores números: apenas 10,2% da população possui coleta de esgoto. Em contrapartida, a região sudeste se aproxima dos 80%. Isso tudo escancara a desigualdade de infraestrutura no Brasil.
Devido a esse cenário espantoso mais a pandemia do novo coronavírus, o projeto de lei N° 4162, de 2019 deve ter uma tramitação acelerada no Congresso Nacional. Chamado de o novo marco legal do saneamento básico, o projeto está previsto para a votação no Senado na quarta-feira (24).
O projeto atualiza o marco legal de saneamento básico e acrescenta, basicamente, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) a competência para editar normas de referência sobre o serviço de saneamento (atualmente essas normas são definidas pelas cerca de 50 agências reguladoras regionais, estaduais e municipais) e a exigência de licitação, facilitando assim a participação de empresas privadas.
Iniciativa privada e saneamento básico
Estados Unidos, Japão, Canadá, Inglaterra, México são países em que a iniciativa privada supre bem a demanda por saneamento básico. O caso do Chile, talvez, seja o de maior sucesso. Com 94% de participação da iniciativa privada e níveis de cobertura de água e esgotamento universais e tratamento de esgoto próximo a 100%. No Brasil, a iniciativa privada corresponde a apenas 5% do total de companhias que operam no setor.
E por que não existem mais empresas privadas nesse promissor setor? Já que o grosso do mercado é composto por empresas públicas e elas não conseguem sanar o problema, por que a iniciativa privada não oferece seus serviços? Simplesmente porque o estado dificulta a entrada delas no mercado através de suas agências reguladoras.
O grosso do dinheiro da corrupção está nas obras públicas e nos contratos superfaturados. As empresas privadas até possuem formas de entrar no mercado por meio de processos licitatórios. Se a empresa privada ganhar esse processo, o estado dá a concessão para que ela seja a única que forneça esses serviços ao município. Como no Brasil as preferidas do estado estão sempre um passo a frente para serem escolhidas nesse processo, não há efetivamente um livre mercado nesse setor.
Outro problema na concessão desse “monopólio” é a falta de incentivo que ele cria para a empresa concessionária. Uma vez vencido o processo licitatório, a empresa não possui concorrência e seus consumidores ficam reféns de suas arbitrariedades (taxas abusivas, qualidade insatisfatória do serviço, etc). Obviamente isso tudo depende das características do contrato. Mas não é muito difícil imaginar que isso possa ocorrer.
Para que não aconteça essas arbitrariedades, é necessário que haja no setor uma livre entrada de empresas. Com essa concorrência entre empresas, o principal agente favorecido é o consumidor, que agora possui liberdade para escolher com qual empresa irá gastar sua preciosa renda.
Uma crítica relevante que se faz é a de que a iniciativa privada não teria interesse em oferecer seus serviços para regiões interioranas, aquelas bem afastadas das grandes capitais. Os relatores do novo marco do saneamento básico, prevendo esse questionamento, adicionaram um dispositivo que prevê a concessão de cidades em blocos microrregionais.
Ou seja, a empresa que ganhar a licitação, terá de fornecer seus serviços para o conjunto de cidades listadas no edital. Nesse conjunto, haverá desde cidades pequenas até regiões metropolitanas.
Algo tem que ser feito imediatamente. O problema é que a maior mazela social existente no Brasil hoje, atrai interesses políticos que vão de encontro com o desenvolvimento econômico do país. As empresas públicas concessionárias se tornaram grandes cabides de empregos para políticos apadrinhados.
Toda essa bancada do atraso mesclado com esse preconceito ideológico contra a iniciativa privada faz com que 100 milhões de brasileiros fiquem desamparados. Mudar essa superestrutura requer anos ou até décadas.
Maxwell Marcos
Estudante de graduação do curso de Economia pela Universidade de Taubaté. Apreciador das obras de Nelson Rodrigues e Theodore Dalrymple, acredita que o papel de uma Universidade é criar uma elite intelectual que discuta os problemas do país ou se possível da humanidade.