Schumpeter: inovação, destruição criadora e desenvolvimento

Joseph Alois Schumpeter faz parte de um seleto panteão de economistas, é comprovadamente responsável pela revisão de todo o pensamento econômico de sua época e fruto até hoje de estudos e reflexões. Nascido no extinto Império Austro-húngaro, primeira metade do séc. XIX e, coincidentemente, no mesmo ano da morte de Karl Marx e do nascimento de John M. Keynes.

Schumpeter é considerado um dos economistas mais importantes da história, sobretudo por suas contribuições na teoria do crescimento econômico, democracia, estratégias empresarias e história econômica.

Quem foi Joseph Schumpeter?

O economista austríaco foi um dos vários pensadores que nasceu embebido na avalanche causada por Charles Darwin e a Teoria da Seleção Natural, que rapidamente transcendeu as ciências biológicas, para ser aplicada na ótica das ciências humanas. O economista sonhava contribuir para a criação da “Economia Exata”, com rigor suficiente para se assemelhar à física, sendo previsível e passível de controle – porém já no final de sua vida, pode chegar à conclusão de que a dita “Economia Exata” é tão incongruente quanto uma “História Exata”.

Como todo gênio, foi precoce em toda sua vida, depois de formar-se em Direito na Universidade de Viena no ano 1904, passou um período em Londres, mas retornou para lecionar na cadeira de Antropologia na região em que hoje é situada a Ucrânia. E foi lá onde recebeu pela primeira vez seu apelido de enfant terrible, pois costumava frequentar reuniões e aulas calçando botas de montaria. Contudo, ao se casar com Glayds Seaves, mudaram-se para a cidade do Cairo, onde se tornou conselheiro de finanças da rainha egípcia e tão logo retornou, em março de 1919, para a Áustria e assumiu o posto de Ministro das Finanças a convite do Partido Socialista Cristão (não, ele não era socialista), no qual durou pífios 10 meses.

Em seguida, assumiu a presidência do famoso banco Biedermannbank, em Viena, antiga e conceituada instituição financeira de pequeno porte. O banco abriu falência em 1924, não somente por conta das difíceis condições econômicas vividas, mas também pela desonestidade de alguns de seus diretores, o que fez Schumpeter não só perder toda sua fortuna pessoal, como ainda ficar totalmente endividado. Finalmente, depois de muitas idas e vindas, em 1932, Schumpeter assume a cadeira de antropologia na Universidade Harvard, ali permanecendo até sua morte e produzindo uma quantidade assombrosa de conteúdo.



Ele costumava afirmar que o ponto máximo da capacidade criativa do homem é até os 30 anos de idade, e de fato, quando tinha apenas 25 anos, em 1908, publicou sua primeira grande obra: “A Natureza e a Essência da Teoria da Economia Nacional” e quatro anos mais tarde, sua célebre teoria do “Desenvolvimento Econômico” [1]. Ambas estabeleceram sua importância como teórico da economia. Trabalhava compulsivamente, aproximadamente 84 horas semanais e ainda insatisfeito, de fato além de criador do conceito, também foi representante do chamado “agente empreendedor”.

O capitalismo como um sistema dinâmico

Era boêmio e costumava dizer que iria “torna-se o maior economista, cavaleiro e amante do mundo..mas que os negócios dos cavalos não iam tão bem”. Contudo, teve o privilégio de vivenciar o capitalismo na sua forma mais madura (diferentemente de Smith ou Marx), o que lhe permitiu inferir importantes constatações e voltar-se a questões essenciais da compressão do que viria ser exatamente o sistema capitalista e como/porque este vinha funcionando em certos lugares e outros não.

Seu principal ponto era de substituir a teoria estática da Economia, por sua teoria dinâmica, com um quêde evolucionismo, que ia de encontro às ideias de outro grande expoente da época, Alfred Marshall [2], cuja principal teoria seria de que a natureza não dava saltos, reafirmando a necessidade de melhorias continuas de procedimentos, o que valorizava o papel de administradores e técnicos. Schumpeter, por outro lado, que valorizava saltos inovadores, inesperados e não-lineares.

O galanteador de botas de montaria, Schumpeter.

Schumpeter considerava então, que o capitalismo deveria ser estudado sob a ótica da produtividade e do crescimento, sendo a máxima expressão da inovação, luta humana e pura/simples destruição – tudo isso ao mesmo tempo.

O que é uma sociedade capitalista?

Uma sociedade pode ser considerada capitalista quando funda seu processo econômico ao sabor dos homens de negócio. Dito isso, as características do sistema são elencadas:

  1. A propriedade privada dos meios de produção;
  2. Produção para o lucro privado, sendo a produção pela iniciativa particular em caráter privado;
  3. Ponto importante e crucial: a criação do crédito.

Schumpeter não acreditava que o crescimento podia ser explicado pela variação populacional, da renda e ou riqueza, uma vez que tais fatores não resultavam necessariamente em um fenômeno qualitativamente novo, considerados por ele como mudanças de dados naturais, nada de novo sob o sol.

O desenvolvimento, em sua visão, é um fenômeno distinto, inteiramente novo ao usual fluxo circular, na tendência para o equilíbrio ou da nossa rotina. É uma mudança espontânea e descontínua nos canais do fluxo, rompimento do equilíbrio, que altera e desloca para sempre o estado de equilíbrio previamente estabeleicido, se tornando um “novo normal”  na vida industrial e comercial, não na esfera das necessidades dos consumidores de produtos finais.

O papel do empresário no sistema capitalista

Sendo assim, finalmente no capítulo II de sua teoria do desenvolvimento, ele nos apresenta a sua figura central: o empresário inovador. Ele é o responsável por novos produtos para o mercado, por meio de combinações mais eficientes dos fatores de produção. Tipificando, as combinações inovadoras se configurariam nos seguintes casos: i) Introdução de um novo bem; ii) Introdução de um novo método de produção, baseado numa descoberta cientificamente inovadora; iii) Abertura de um novo mercado; iv) Conquista de uma nova fonte de matérias-primas e v) Estabelecimento de um novo modo de organização de qualquer indústria (criação ou fragmentação de uma posição de monopólio, por exemplo).

empreendedor, independentemente do porte da empresa em que atua, é o agente da inovação e da destruição criativa, esta entendida como a força propulsora não só do capitalismo como do progresso material. Quase todos os negócios, por mais fortes que pareçam em dado momento, acabam falindo, e quase sempre porque não foram capazes de inovar (algumas empresas que foram vanguarda, hoje estão na lata de lixo da história).

Aqui a teoria schumpeteriana se torna uma derivada dos ciclos de Kondratieff:

As ondas de inovação são cada vez mais curtas
Fonte: Inovvaservice

Afirma Schumpeter [3]:  “Historicamente, o primeiro Kondratieff [4] coberto por nossa análise, significa a revolução industrial, incluindo o prolongado processo de absorção. Nós o datamos dos anos oitenta do século XVIII até 1842. O segundo cobre o que chamamos de era da máquina a vapor e do aço. Vai de 1842 a 1897. E o terceiro, O Kondratieff da eletricidade, da química e dos motores, nós o datamos de 1898 em diante. ”

O que é destruição criativa?

No sentido elaborado por Schumpeter, a destruição criadora está na essência da dinâmica do capitalismo, quando novas tecnologias surgem como ondas, aleatoriamente e geralmente vem acompanhada do aumento da produtividade do capital e do trabalho, pois os empresários inovadores conseguem alocar produtos com vantagens competitivas em relação a suas concorrentes tecnologicamente desfasadas.

Sua expressão “destruição criativa” adquiriu contornos quase lendários e é frequentemente repetida em palestras, livros e reuniões empresarias, tornando-se praticamente senso-comum e palavra de ordem em alguns ambientes. Contudo, a grande chave de sua sobrevivência dos empreendedores é o crédito barato e farto, via de regra tais personagens são financistas, rigorosos com relação ao risco e atentos às novas oportunidades e de novos negócios.

Assim sendo, em seu capítulo final da teoria do desenvolvimento, o austríaco trata dos grandes momentos de expansão e retração econômica – os ciclos econômicos tão comuns no processo de desenvolvimento capitalista. Portanto, em períodos de prosperidade, o empreendedor ao criar novos produtos é imitado por uma verdadeira onda de empreendedores não-inovadores, que investem recursos para emular os novos bens criados. Consequentemente, uma onda de investimentos de capital ativa a economia, gerando a prosperidade e o aumento do nível de emprego.

As inovações tecnológicas são inerentes ao sistema

À medida que as inovações tecnológicas ou as modificações nos produtos antigos são assimilados pela conjuntura e seu consumo generalizado, a taxa de crescimento da economia diminui (o que não gera mais ganhos extraordinários) e assim se inicia o processo recessivo da redução dos investimentos e a baixa da oferta de emprego. A constante mudança entre prosperidade e recessão, isto é, da volatilidade da produção é entendido como um obstáculo periódico e transitório, aparte do curso normal de expansão da renda nacional, da renda per capita e do consumo.

Anteriormente, o caráter cíclico do capitalismo era explicado pelos economistas das mais diversas formas, desde a atividade cósmica, do subconsumo da subpopulação e até colheitas frustradas. Então, nesse sentido, a grande contribuição de Schumpeter foi delimitar a relação existente entre o nível de investimento explicado pelo movimento inovador, e que tão logo é transformado em produtos e posteriormente em prosperidade, empregos, renda, além do estabelecimento de um novo paradigma.

Como já afirmado, Schumpeter não mantinha simpatia pela ideologia socialista, mesmo porque nesse sistema a figura do empreendedor não existia (o que também pode ser uma pista para o fracasso do mesmo), porém o que não exclui uma certa visão pessimista por parte do autor em relação ao capitalismo e sua instabilidade. A “máquina capitalista’’, outro famoso termo, defende que o processo capitalista eleva sistematicamente o padrão de vida das massas, contudo não deve ser considerado um estado natural da vida humana. Se caso o fosse, teria surgido muito antes na história e hoje estaria em todos os lugares, então devemos compreende-lo como um sistema construído e mantido com dificuldade hercúlea.

Encerro afirmando que Schumpeter, de forma nobre, acreditava que o mundo só poderia beneficiar da benesses do capitalismo, caso as pessoas entendessem como ele de fato funciona, e não é à toa que dedicou toda sua vida não só o compreendendo, mas principalmente explicando-o, assim como eu e você buscamos fazer neste exato momento.

Notas

[1] Divirta-se como mais de 200 páginas de Schumpeter, na série “Os Economistas” http://www.soniabarroso.pro.br/graduacao/schumpetertde.pdf

[2] Para mais textos de A. Marshall, ver MARSHALL, Alfred. Principles of Economics. Amherst, New York: http://socserv2.socsci.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/marshall/

[3] Schumpeter J. A. (1939), Business Cycles. New York, NY: McGraw-Hill.

[4] The Long Wave in Economic Life: https://stockmarketobservations.files.wordpress.com/2013/01/long-wave-in-economic-life-by-n-d-kondratieff.pdf


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