TPP – O que é e por que você devia se importar com ele

Terraço Econômico – por Rachel Borges de Sá Líderes de países que assinaram o TPP

A começar pelo mais importante, a sigla que virou um verdadeiro must na temporada 2015 nos manuais de comércio exterior ao redor do mundo significa nada mais nada menos do que Trans-Pacific Partnership. (Fracas) metáforas de moda à parte, o TPP é o mais novo acordo comercial firmado entre EUA, Japão, nossos vizinhos latinos México, Peru e Chile, os longínquos Austrália e Nova Zelândia, além de Canadá e outros quatro países banhados pelo Oceano Pacífico. Juntos, eles respondem por cerca de 40% do PIB global, fato que explica a característica histórica do tratado.

Mas qual o objetivo desse acordo e como ele funciona? Concluído após quase oito anos de negociação, o TPP visa reduzir barreiras comerciais com o corte ou redução de tarifas de importação entre países-membros a fim de aumentar o fluxo de bens e serviços. Além disso, o tratado também inclui a redução de barreiras não tarifárias para facilitar transações, que incluem o estabelecimento de regras uniformes para setores como investimentos, meio ambiente, direitos trabalhistas e propriedade intelectual [1]. Isso significa que – tudo o mais constante – bens e serviços, de geladeiras à tomates, petróleo ou design de projetos de infraestrutura, fluirão com muito mais facilidade e, mais importante, menor custo entre os 12 países constituintes desse verdadeiro megabloco regional de comércio.

E o Brasil com isso? Apesar de ao longe não parecer envolver em nada o nosso país, um olhar mais atento revela como a criação e entrada em vigor do TPP terão grandes impactos na economia brasileira. Primeiro, um quarto do comércio do Brasil é feito com os países que assinaram o acordo, sendo o destino de um terço de nossas exportações [2]. De acordo com recente estudo conduzido por pesquisadores da FGV [3], o TPP pode encolher as exportações brasileiras em até 2.7%, tanto no setor do agronegócio quanto na indústria.

Grosso modo, é simples entender como corremos um grande risco de perdermos esses mercados: se você pudesse comprar um produto de um país com o qual você não precisa pagar nenhuma tarifa (ou seja, impostos de importação ou exportação) nem enfrentar nenhuma complexa burocracia, por que você iria comprar de outro?

Segundo, a facilitação do comércio entre tais países influenciará a decisão de investidores, como grandes empresas, que poderão concluir que nosso eterno mercado doméstico potencial deixa de valer a pena quando comparado a mercados cujo investimento será invariavelmente mais fácil, rápido e barato [4].

Além disso, é importante destacar que grande parte das exportações brasileiras para países como Chile e EUA são produtos manufaturados de nossa cada vez mais combalida indústria nacional – representando 35% do total desse tipo de exportação no país. Nesse contexto, em meio à grave crise enfrentada pela economia brasileira, na qual o setor industrial é o que mais sofre, a luz no fim do túnel mantida pela ideia de recuperação via exportações torna-se gradativamente opaca.

Infelizmente, gostaria de dizer que não participamos desse e de mais nenhum acordo regional, porque, afinal, o pacífico está lá do outro lado – e, pelo menos por enquanto, a megalomaníaca ferrovia que nos daria uma saída ao Pacífico via Peru ainda não está pronta. Porém, não é bem por aí. No caso, o verdadeiro “estraga prazeres” é o Mercosul – mais precisamente, a completa alienação do bloco em relação às cadeias globais de produção. Por ser uma união aduaneira, o acordo vincula países-membros (no caso, Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e, ainda não completamente, Venezuela) a adotarem tarifas comuns para importados de outras regiões, impedindo que acordos de livre comércio sejam firmados entre os países fora do âmbito do Mercosul.

Até aí, não há problema algum. Afinal, o Brasil – como maior potência da região – pode firmar acordos via Mercosul e ampliar não somente sua participação na economia global, mas da região como um todo. Porém, após os primeiros triunfantes anos de vida do bloco, o fator político passou a ganhar muito mais peso em seu processo decisório, prejudicando os benefícios econômicos trazidos pela união de países em prol do comércio facilitado. A título de exemplo, os últimos acordos firmados pelo Mercosul, oficializados entre 2007 e 2010, foram com Cuba, Índia e Israel – mercados de pouquíssima relevância comercial aos países do bloco quando comparado à parceiros como EUA, China e UE. Na mesma linha, três acordos firmados com Egito, Palestina e União Aduaneira da África Austral nunca saíram do papel – devido à falta de decisão dos legislativos de cada país. Para completar, um acordo negociado entre Mercosul e UE, que traria numerosos benefícios à economia da região, é discutido a nada mais nada menos do que 15 anos (!).

Então quer dizer que o Brasil ficará isolado no Mercosul, enquanto 40% da riqueza mundial vai rolar “livre, leve e solta” mundo afora? Mais uma vez, não é bem por aí. Como vivemos no mundo real, e palavras como entrave, lobby e oposição não foram criadas apenas com o propósito de descrever a conturbada realidade político-econômica brasileira, também no TPP nem tudo são flores. Como destacado anteriormente, o TPP visa reduzir tarifas – tudo o mais constante. Para entrar em vigor, ainda é preciso que seja ratificado pelo Legislativo de cada um dos países envolvidos.

Para os EUA, por exemplo, não será tarefa fácil – ainda mais levando em conta a próxima corrida eleitoral e a oposição vinda até mesmo de “fogo amigo” disparado por parte da bancada democrata no Congresso. Membros do mesmo partido do verdadeiro “pai” do novo acordo contrariam a festejada vitória do presidente Barack Obama em defesa de produtores e trabalhadores internos contrários à abertura comercial. Ao mesmo tempo, republicanos ditos liberais clamam até mesmo pelo direito da indústria tabagista em processar governos por campanhas contra o fumo. Do outro lado do Pacífico, a Austrália enfrenta oposição de grandes produtores domésticos de açúcar, que não gostaram nada da ideia de competição barata vinda de fora, enquanto o Canadá lida com raivosos produtores de laticínios.

Além disso, há a crescente discussão sobre o papel da China nesse novo acordo comercial. Dará certo um bloco que exclui a segunda maior potência mundial, que mesmo em declínio ainda cresce a taxas exorbitantes quando comparadas a seus pares desenvolvidos? O primeiro ministro Japonês, Shinzo Abe, deixou as portas abertas ao vizinho asiático. Já a misteriosa cúpula política chinesa alterna-se entre flertes com o ocidente e fervorosas críticas à suposta tentativa norte-americana de minar sua influência tanto na Ásia quanto na região de seus novos amigos latino-americanos.

Se o acordo será aprovado, se de fato as barreiras serão reduzidas e quais outros países entrarão nesse acordo histórico, só o tempo dirá. Porém, duas coisas são certas. A primeira, como afirma a teoria econômica, que ganhos de comércio internacional se traduzem rapidamente em desenvolvimento econômico e aumentos da produtividade – fatores que, neste momento, não deveriam ser assim futilmente desprezados. A segunda, que o Brasil está ficando para trás. Já considerado um país fechado ao comércio internacional por onde se queira medir (importações + exportações correspondem a apenas 20% do PIB), temos feito apostas erradas de forma consistente nos últimos anos, e escolhido a rodinha de amigos errada. Afinal, “diga-me com quem andas, e te direi quem és”.

Referências [1] http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,eua-fecham-maior-acordo-comercial-da-historia-com-paises-do-pacifico,1774671 [2] http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/235571-o-brasil-na-bolha-do-jeca.shtml [3] Thorstensen, V. and Ferraz, L. (2014) “O Isolamento do Brasil em Relação aos Acordos e Mega Acordos Comerciais”, Boletim de Economia e Política Internacional (Vol.16), (Brasilia: IPEA) [4] http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mercado/235571-o-brasil-na-bolha-do-jeca.shtml
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