Você acordou cedo, tomou um banho e ligou a TV enquanto se arrumava. Descobriu que havia uma paralisação dos trabalhadores dos serviços de transporte público, que estava sendo anunciada em todos os jornais. Se você tivesse de ir apenas comprar pão na padaria, tudo bem, mas não; você tem uma obrigação e um horário a cumprir; você precisa chegar ao escritório onde trabalha.
Contudo, o escritório está distante demais para ir andando, sua bicicleta está enferrujada e você não tem carro. Então, para e pensa por uns minutos sobre alternativas e decide: “vou de Uber”. Assim como você, outros milhares de pessoas seguem o mesmo raciocínio. Para a sua surpresa, um trajeto de 8km está saindo por singelos R$50,00. Um amigo manda uma mensagem e no caso dele, andar 11km custaria R$90,00. Isso é muito mais do que o preço normal. Por que isso aconteceu?
Este é o exemplo clássico do conceito da tarifa dinâmica usada pelo Uber, e essa é uma ótima forma de entender as dinâmicas das famosas curvas de oferta e demanda, e como elas impactam os produtos e serviços. Pois bem, vamos do começo.
Pensando em demanda, sabemos que os agentes atribuem valores diferentes aos bens e serviços. É fácil perceber isso quando você vai em um bar com seus amigos. Um deles pode pedir uma cerveja cara, enquanto outro acha que não vale a pena pagar aquele preço na cerveja, ou seja, cada um atribui um valor diferente, e, portanto, está disposto a pagar valores diferentes. Em geral, para a maior parte dos bens, quanto maior seu preço, menos pessoas estarão dispostas a consumi-lo e a quantidade demandada cai. Graficamente podemos representar como abaixo:
Pensando pelo viés da oferta, quanto maior o lucro da venda de um produto, mais agentes terão interesse em vende-lo. Imagine o mesmo caso das cervejas com seus amigos: quanto maior for o preço de venda, mais bares irão querer vender essa cerveja, pois o lucro decorrente dessa venda é atrativo. Graficamente isso fica assim:
Pensando de uma forma agregada, e unindo ambas as curvas, percebemos um ponto onde elas se cruzam. Esse ponto é o tão famoso preço de equilíbrio para aquele produto ou serviço, pois ele iguala, de forma cartesiana, a quantidade demandada com a quantidade ofertada.
Porém, alguns eventos podem causar o deslocamento tanto de uma curva quanto da outra, ou seja, o ponto de equilíbrio é alterado ao longo do tempo. São vários os motivos que podem levar a isso. Imagine que alguma pesquisa mirabolante indique que beber cerveja emagrece, ou retarda o envelhecimento ou simplesmente o tempo está mais quente e gera maior incentivo ao consumo. É provável que mais pessoas estejam dispostas a tomar cerveja, pagando um preço maior. Nesse caso, houve o deslocamento da curva de demanda.
Nesse novo cenário, outro ponto de equilíbrio é estabelecido. Mantendo-se tudo mais constante, mais bares irão vender cervejas, pois ganharão mais dinheiro com o preço que subiu, ajustando a oferta, ao longo da curva pré-existente.
O que aconteceu com o caso do Uber foi exatamente isso. Como não havia ônibus e metrô pela manhã, muitas pessoas solicitaram o serviço, deslocando a curva de demanda. Com o preço mais alto, vários motoristas que estavam fora de serviço foram para as ruas, vendo a possibilidade de ganhar mais. Um novo ponto de equilíbrio foi estabelecido. Na vida real, principalmente com esse recurso do Uber (que permite uma resposta extremamente rápida às variações de oferta e demanda por conta do seu sistema integrado com todos os usuários), o equilíbrio é dinâmico, de forma que o ponto de junção das duas curvas vai se movendo rapidamente conforme aumenta o número de pessoas demandando e ofertando o serviço.
A lei da oferta e demanda é um dos princípios básicos da dinâmica econômica, e é lindo poder presenciar sua manifestação de forma tão cristalina, e negá-la seria abrir margem para um esoterismo estranho e que vão contra os benefícios do livre mercado! Contudo, essa lição de economia, talvez tenha te custado um pouco caro pela manhã.
Pedro Lula Mota, editor do Terraço Econômico
Rubens Terra, Engenheiro mecânico formado pela POLI-USP e candidato ao Level II do CFA Program. Atuou durante anos no mercado financeiro, no mercado de educação e como empreendedor. É sócio-fundador da Beat The Market Co