A cabeça dos economistas

Há algum tempo me deparei com o texto The Natural, escrito pela conhecida economista Deirdre (na época, Donald) McCloskey no início dos anos 90. Ao longo do texto ela reflete sobre a forma de pensar do economista. Um jovem recém-ingresso na graduação seria capaz de pensar como um verdadeiro economistaOu ainda, economistas “natos” existem? Apesar de algumas discordâncias pessoais, meu objetivo com este artigo é apresentar uma síntese dessas interessantes e quase “existenciais” reflexões sobre o economista.

Economistas natos existem?

Os economistas acreditam nas ciências econômicas, diz McCloskey. Nem todos, mas alguns acreditam. Logo, diante das mais diversas questões sociais, os “crentes” buscam eventuais respostas na economia. Essas mesmas pessoas tendem a concordar quando perguntadas sobre os melhores economistasArmen Alchian, Ronald Coase, Gary Becker e outros nomes conhecidos pela corrente ortodoxa da profissão. Apesar das concordâncias, McCloskey é enfática: não é possível ensinar economia aos alunos de graduação. Só é possível ensiná-los sobre a economia. Seguindo o mesmo raciocínio, o estudo da história da arte não é ensina como pintar um quadro, tampouco estudar literatura ensina como escrever um best-seller. Em outras palavras, a graduação pode ensinar sobre economia, mas não te torna um economista.

O ideal para os crentes é: qualquer estudante, em qualquer nível de educação, pode começar a pensar feito um economista. Isso é, olhar para a realidade diante de si próprio e pensar em maximizações, equilíbrios, interações ou identidades contábeis. Trata-se de uma forma específica de enxergar o mundo, dadas certas noções de demanda, restrição, incentivo ou bem-estar. Contudo, o desafio é transmitir essa forma de ver o mundo ao outro. A teoria microeconômica vista por um economista como as entranhas da disciplina é igualmente vista como um assunto entediante para o jovem estudante. Nem mesmo os melhores alunos são capazes de formular um problema microeconômico, resolvê-lo e aplicá-lo ao mundo real. Porém, os melhores estudantes de engenharia ou história certamente se sairiam melhor caso recebessem uma tarefa análoga.

Talvez os livros-texto sejam o problema, diz a economista. Contudo, troque o referencial didático e o resultado provavelmente será: “Isso é muito difícil!” Essa fala surge porque é difícil pensar como um verdadeiro economista. Copiar a matemática do livro-texto? Fácil. Discorrer sobre as implicações da política na economia? Fácil. Aprender sobre a economia? Fácil. Pensar como Friedman ou Solow? Difícil. O economista, com raras exceções, só atingirá a maturidade após anos de experiência acadêmica ou profissional. Assim como não é possível ensinar filosofia para jovens, apenas sobre filosofia, não é possível ensinar economia para estudantes de graduação. O jovem é romântico. Embora seja capaz de memorizar fórmulas, pensar em custos e benefícios exige certo distanciamento emocional. O estudante recém-saído de uma economia socializada (vulgo, casa dos pais) não tem noção sobre a escassez e as escolhas inerentes à vida adulta. Ele aprenderá matemática e história, mas, o modo de vida da economia não pode ser ensinado e leva tempo para ser desenvolvido. Todavia, há quem discorde. Por quê?

McCloskey argumenta pela existência de uma espécie de “economista nato”. O chamado Natural vê a economia de forma intuitiva, já os demais constroem a própria visão deliberadamente. O primeiro tipo de economista é capaz perceber que o sistema de preços funciona para a alocação de recursos escassos e seu custo social é o mais baixo e rápido dentre certas opções, enquanto o segundo tipo construiria as mesmas percepções ao longo de décadas. Considerando o Natural, temos duas figuras distintas: aquele movido pelo interesse próprio e cuja personalidade emula o homo economicus e aquele que compreende a economia através do exercício da alteridade. Em suma, a conclusão derivada dessa série de reflexões é: a grande maioria dos estudantes não é composta por futuros economistas natos. Pelo contrário, podem e devem aprender sobre a economia para aplicá-la às próprias vidas.

Contudo, pensar com a cabeça dos economistas é uma outra história

Paulo Silveira

Graduando em Análise e Desenvolvimento de Sistemas pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) e ex-graduando em Economia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Trabalha com gestão de produtos digitais em startups brasileiras. Produz conteúdo sobre economia e tecnologia. Foi um dos vencedores do concurso nacional de resenhas organizado pelo Conselho Federal de Economia em 2017, escrevendo sobre a obra 'Princípios de Economia Política e Tributação' de David Ricardo.

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