A maconha causa esquizofrenia e por isso deve ser legalizada

Atualmente, o maior argumento dos proibicionistas (depois de terem sido desmentidos pela ciência outras tantas vezes) é:  a maconha pode causar esquizofrenia.

Esse argumento parece ter evidências relevantes, dentre elas, um estudo publicado na revista The Lancet e divulgado amplamente pela The Economist. Sim, é verdade que a cannabis possivelmente tem seu impacto na esquizofrenia e justamente por isso que ela precisa ser legalizada.

Primeiro, é importante mencionar que o principal alerta do estudo diz respeito à droga com alto teor de THC e para o consumo frequente (diário). É verdade que em certos países, como a Holanda, esse nível é comum, mas o percentual varia muito de país para país.

No Brasil, como mencionado no próprio artigo, a droga de alto teor de THC não é a mais comum. Em outros países, incluindo locais onde a droga é legalizada, como o Canadá, o teor gira em torno de 15%, bem abaixo dos valores encontrados na Holanda. Sendo o nível de THC um agravante, os resultados nos mostram justamente uma necessidade urgente da legalização da maconha.

Sabemos que a maconha vendida ilegalmente é alterada de diversas formas para que se torne mais viciante, o que atende os interesses de quem vende, e uma forma de se fazer isso é com maior teor de THC.

Já para a venda legal, é possível limitar este teor, controlando para níveis que tornem consumidores menos adictos. É ainda possível taxar o nível de THC na venda legal, fazendo com que a receita arrecadada vá para a saúde e também desestimulando o consumo, já que o preço da droga subiria.

Alguns podem até argumentar que nada iria adiantar uma legalização desse tipo, pois, as pessoas continuariam comprando a droga ilegalmente, para obter mais THC ou fugir dos preços mais altos. Entretanto, não há evidências de que isso ocorreria.

Na Itália, uma mera legalização de uma cannabis contendo somente 0,2% de THC fez com que o número de vendas ilegais caísse. Já nos EUA, a própria maconha medicinal, que possui menos THC, também fez com que as vendas ilegais caíssem. Sendo assim, o controle sugerido é viável.

Se esses argumentos não lhe parecem suficientes para que a droga seja legalizada, é importante verificarmos que tanto a legalização quanto a proibição tem um custo. Quando olhamos para esquizofrenia, vemos que 1% da população é afetada. Ainda que seja um percentual razoável, a proibição da maconha conseguiria deter algo muito menor que esse valor, já que o aumento no consumo após a legalização tem sido pequeno nos países em que ela ocorreu.

Sendo assim, os custos da legalização não parecem ser altos quando comparados aos custos da proibição, que incluem a violência e desigualdade, a ausência dos benefícios que o uso medicinal proporciona e os recursos alocados para esta guerra e que poderiam ser investidos em outras áreas.

É válido lembrar também que o artigo encontrou novas evidências para um tema que ainda gera muito debate. Em outras palavras, ainda é incerto se a relação observada é de causa. Além disso, não podemos nos esquecer que o álcool, o cigarro e até mesmo a poluição também aumentam a probabilidade de uma pessoa desenvolver a esquizofrenia.

Para todos esses casos, seguimos a avaliação de custos x benefícios, que é o que deve ser feito para qualquer política pública. Por fim, lembro de uma frase dita no documentário The Business Behind Getting High, parafraseando: “Olha, se a gente realmente conseguir proibir todo mundo de usar maconha, ok. Pra mim seria fim de papo!”.

As pessoas sempre olham para as drogas como se fosse possível impedir todo mundo de usar. Não é. Pessoas que pensam em políticas públicas não podem fazê-lo como leigos, como se fosse possível criar um mundinho perfeito e livre de tudo que cause algum mal.

Quem pensa em políticas públicas precisa avaliar custos e benefícios de todas as situações existentes e trabalhar com a realidade. Essa realidade é: os custos da proibição são muito mais altos que os custos da legalização.

André Yukio

É matemático pela USP e mestre em economia pela FGV. Possui um blog de estatística e ciência de dados: estatsite.com

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