A nova cara da política velha

A onda de mudança ocorrida nas eleições de outubro de 2018 mudou sensivelmente a composição do Congresso Nacional. No senado, 46 das 54 vagas em aberto foram ocupadas por novos senadores, já na Câmara quase 270 deputados novos foram eleitos. Muitos dos novatos chegaram lá colando sua imagem na do presidente Bolsonaro. Outros, porém, souberam capitalizar em outros nichos do eleitorado.

É o caso de Tabata Amaral (PDT-SP), eleita com 264.450 votos de eleitores paulistas. Jovem, com história de vida de superação, tornou-se a principal candidata na coligação do presidenciável Ciro Gomes (PDT) e levou votos, principalmente, entre estudantes universitários, que também votaram em Ciro no primeiro turno das eleições. Tabata Amaral vendeu-se como um exemplo de pessoa que teve a trajetória de vida mudada através da educação. Saiu da periferia de São Paulo para estudar em Harvard, nos EUA, graças ao seu desempenho em Olimpíadas de Matemática e a conquista de bolsas de estudo.

O eixo central do discurso da deputada é a defesa da Educação, para que todos tenham acesso às mesmas oportunidades que ela teve. Logo no seu primeiro discurso na Câmara, Tabata enfatizou a importância da Educação e prometeu apresentar projetos para fortalecer a área, entre os quais o direcionamento maior de verbas do FUNDEB para prefeituras que retirem a influência política na escolha dos diretores das escolas.

A deputada lamentou o fato de, ainda, ser necessário falar sobre alfabetização no Brasil, sobre estruturação da carreira docente no país e outras questões que demonstram nosso atraso na Educação. Iria além da Deputada. O Brasil precisa falar sobre Saneamento básico, ainda, já que quase metade dos lares brasileiros não tem acesso à rede de coleta de esgoto. Todas essas questões, no entanto, residem em um ponto não tocado no discurso de Tabata Amaral: a estrutura dos gastos públicos no Brasil.

Em 2018, segundo o Tesouro Nacional, 65% dos gastos primários do Governo Federal foram direcionados aos pagamentos de benefícios previdenciários e salários de servidores públicos. As despesas obrigatórias já atingem 93% do orçamento federal. Estados e municípios estão com orçamentos estrangulados pelos pagamentos de servidores ativos e, principalmente, inativos. Sete estados brasileiros já decretaram estado de calamidade financeira e atrasam pagamentos de salários dos servidores, chegando a parcelar os salários, como no caso de Minas Gerais, que parcelou o pagamento do 13º salário de 2018.

Com as finanças caóticas, cada vez mais faltam recursos para manutenção e investimentos na melhoria de serviços públicos essenciais, como Saúde, Segurança Pública e, obviamente, Educação. Ainda que o país gaste quase 5,5% do PIB em investimentos na área, grande parte desse volume é direcionado ao ensino superior. Segundo a OCDE, o gasto com aluno do ensino básico anual é de 3,8 mil dólares, enquanto nas universidades chega a 11,7 mil dólares.

No médio/longo-prazo, não há saída para a educação pública brasileira que não passe por discussões sobre assuntos ainda vistos como tabu, como a utilização de voucher educacional, além da implantação do modelo charter em escolas públicas, nas quais uma Organização Social fica responsável pela gestão de uma Unidade Educacional. Porém, antes dessa discussão, a mais urgente e importante é a reforma fiscal do país, a qual depende de uma série de reformas estruturais, começando pela Reforma da Previdência.

Qualquer parlamentar que se coloque como defensor da melhoria de serviços públicos precisa, obrigatoriamente, defender e apoiar reformas que tragam o equilíbrio das contas públicas e devolvam ao Estado a capacidade de executar investimentos. Apenas com a parte fiscal arrumada, será possível debater as prioridades e particularidades das políticas públicas em cada área essencial. Como deputada eleita com apoio do grupo Renova Brasil, Tabata Amaral teve aulas com economistas, como Marcos Lisboa, que certamente expuseram essas situações e alertaram aos novos parlamentares sobre as condições deterioradas das contas públicas.

Durante seu discurso, a deputada chegou a citar escolas públicas do Ceará como exemplo de qualidade na Educação. De fato, o Ceará tem grande eficiência no gasto educacional, isto é, a relação entre a pontuação nos exames de avaliação e o gasto na área atinge níveis ótimos. No entanto, a deputada não cita o trabalho por trás disso, que compreendeu uma regime de teto de gastos adotado pelo governo do estado, além de aumento na contribuição previdenciária de servidores públicos estaduais e limitações de reajustes salariais. Na educação, atrelou a remuneração de professores ao desempenho obtido pelos alunos, além de guiar projetos e programas educacionais através de evidências.

Não há nada mais velho na política do que jogar para a torcida, valendo-se da condição de parlamentar oposicionista. Tabata, com sua boa formação e capacidade de comunicação, poderia explicar como as reformas estruturais do gasto público são importantes para melhorar serviços públicos essenciais, principalmente a Educação. Entretanto, pela linha adotada na campanha e no início de mandato, o discurso em defesa da Educação não passa de palavras vazias sem efeito prático visando promoção pessoal, além de manter incutida na população a ideia errada de que o dinheiro público é infinito, faltando apenas vontade política dos governantes para aplicá-lo.

Victor Oliveira

Mestre em Instituições, Organizações e Trabalho (DEP-UFSCar) e possui experiência na área financeira.

Um Comentário

  1. Dinheiro publico não é infinito… mas esse vai muito aquém da realidade da educação… não tenho o número de cabeça mas te garanto que o investimento no setor não passa de 5% do Pib… a linha do PDT é clara… ela defende um estado forte para investir em educação… então perfeitamente da pra se partir da premissa que o estado tem condições de investimento…
    Não existe um manual de “Nova Política”… e quem o fizer sem realmente entender o Brasil ou sequer debater o tema está produzindo falácias…
    E nesse vídeo é interessante, pois menciona que a direita (através do slogan “Nova Política”) se apossou do discurso de austeridade fiscal com o único fim de tomar os recursos economizados para o saco sem fundo da divida publica…
    Agora… se “Nova Política” é discutir “estado zero” ou “escola sem partido”….. eu fico com a “velha” que discute investimento, valorização dos docentes e qualidade de ensino…

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