Os principais fatores de todas as eleições sempre foram às demandas eleitorais. São elas que direcionam e norteiam todas as campanhas vitoriosas. Muitas delas, principalmente nas décadas passadas, eram forjadas por governos, com a intenção de garantir a permanência de seus grupos no poder.
Como sabemos, até pouco tempo atrás, o acesso à informação e, sobretudo a propagação de opiniões individuais, era restrito a uma pequena classe formadora de opinião, porém a internet e as redes sociais deram a todo indivíduo o direito de expressar livremente aquilo que pensa e sente.
Essa democratização das informações transformou boa parte do jornalismo em uma via de mão dupla, onde o “consumidor de notícias” interage com o agente noticiador, complementando, concordando ou discordando das informações transmitidas, e isso tornou quase inviável a criação de novas demandas eleitorais que não estejam em sincronia com a realidade da maioria. Colocando em outras palavras, a classe política que por décadas determinaram quais são as prioridades da sociedade, perderam o poder de determinar votos criando “agendas” que atendessem somente suas necessidades.
No Brasil, mais especificamente na década de 1980 e início da década de 1990, o controle a inflação era uma das maiores prioridades entre os eleitores, mesmo que eles não soubessem explicar os fatores que geram a desvalorização da moeda e a consequente alta nos preços dos serviços e bens de consumo. Neste mesmo período havia outras demandas, como a erradicação da pobreza e da fome; o combate a seca e o controle de doenças transmitidas por vírus, mais especificamente nas regiões Norte e Nordeste. A seca no sertão nordestino foi por incontáveis vezes utilizadas como palanque eleitoral, sendo uma das grandes fontes de criação de demanda eleitoreira no Brasil.
No mesmo período citado acima, tínhamos no Brasil uma das menores taxas de desemprego da história de nosso país. José Sarney, quando entregou o governo a Fernando Collor, apenas 4,6% da população estava desempregada, contudo o poder de compra do salário era extremamente baixo. Para se ter uma ideia, existiam consórcios de bicicletas e vídeo cassetes, ou seja, bens de consumo facilmente adquiridos hoje era “conquistados” em sistemas que parcelavam o produto em 24 ou 50 vezes, pois do contrário eles não seriam acessíveis as classes mais baixas.
Algo semelhante ocorre hoje em dia na Bolívia, que tem a menor taxa de desemprego da América Latina, mas também “ostenta” o primeiro lugar no ranking de países com população abaixo da linha de pobreza.
Com o controle da inflação, no Brasil, as classes inferiores (economicamente falando), tiveram um aumento significativo em seu poder de compra. Passaram a ter acesso a serviços e produtos que somente as classes médias e altas tinham. Telefone, carro, TVs de alta resolução e até viagens internacionais tornaram-se normais entre a classe operária brasileira, mas, onde vamos chegar com esse preâmbulo? Chagaremos novamente na chamada demanda eleitoral.
Com o enriquecimento daqueles que décadas atrás sofriam com suas contas, as demandas mudaram. Gozando de relativa prosperidade, controle de pragas que provocavam doenças e tendo mais tempo livre, passamos a desejar outras coisas. Por outro lado, toda essa evolução desarmou a velha classe política, e aqui entram as redes sociais, transformando pessoas comuns em formadores de opiniões.
Vimos, na eleição que elegeu Bolsonaro para a presidência, o resultado dessas novas reinvindicações populares. O combate a violência e, especialmente, a impunidade, foram o carro chefe da campanha de nosso atual presidente. A revolta gerada pelos excessos dos grupos de esquerda que dizem defender minorias foi outro fator relevante para o resultado da última eleição. O brasileiro médio é conservador, e maior parte da população revoltou-se contra as formas “quase primitivas” de protestos encenados por essas militâncias. A ameaça a família tradicional (como se houvesse outro tipo de unidade familiar), também contribuiu significativamente para o crescimento da popularidade de Jair Bolsonaro, contudo não devemos desprezar aquele que foi, na minha opinião, fator decisivo no resultado da eleição: as demandas criadas nas redes sociais.
Os abusivos privilégios da classe governante e da classe dos magistrados foram motivos de inúmeras revoltas nas redes. Muitos chegaram a comparar o Brasil de hoje a Inglaterra de séculos passados, onde uma pequena aristocracia (de sangue, não no sentido literal da palavra), viviam de maneira nababesca à custa dos impostos pagos pelas classes operária e empresarial. Auxílio moradia, auxílio mudança, auxílio creche, auxílio gasolina, passagens aéreas e outros benefícios que, somado ao salário, passam facilmente de uma centena de mil reais.
Grupos de interesse também contribuíram para a formação de novas demandas, em especial a demanda pelo Liberalismo Econômico. Vários textos técnicos, traduzidos para uma linguagem simples, de fácil compreensão, de cunho liberal e pró capitalista, derrubaram por terra vários mitos perpetuados pela esquerda contra a economia de mercado. Comparativos das condições de vida entre trabalhadores de países livres e trabalhadores de países com economia altamente regulada pelo Estado, deram aos brasileiros uma noção mais ampla de como funciona o mercado, e explicaram por que o inimigo é a pobreza e não a desigualdade, e mais, mostraram que, ao contrário do que pregava o senso comum, não é a desigualdade que gera a pobreza. Enfim, intelectualizaram parte dos brasileiros que até então desconheciam os mecanismo e agentes que movem o mundo. Diante de tudo isso, a aproximação do Bolsonaro com o Paulo Guedes sacramentou a vitória antes mesmo das eleições.
Mas, agora que elegemos a bancada mais conservadora e liberal da história do Brasil, o que devemos esperar de nossos representantes?
Fácil. Que compreendam quais foram às demandas que os elegeram, e que trabalhem para que elas sejam atendidas. Que cortem da própria carne, abdicando de privilégios; que reduzam o tamanho da máquina pública privatizando estatais que servem unicamente como instrumento de negociações políticas; que reduzam os gastos públicos para, dessa forma, poderem reduzir a carga tributária e dar ao brasileiro, especialmente ao operário, condições para que tenham o mesmo padrão de vida de um operário britânico ou norte americano.
Esperamos que as novas demandas sejam atendidas pelos motivos expostos, inclusive a fim de evitar decepções, o que poderia promover futuramente no país um retrocesso inédito, permitindo o retorno da velha política e de suas nefastas consequências.
Alisson Berkenbrock