Borgen: a política que me arrancou suspiros e esperança

No início do ano assisti a série dinamarquesa Borgen, da Netflix. Me encantei logo no primeiro episódio, foi amor a 1ª vista. Posso enumerar diversos motivos, dentre eles que: é uma série gostosa de assistir, um enredo que te envolve a cada episódio, a cenografia e fotografia são lindas, os personagens instigantes e cativantes (pasmem, você não assistirá cenas de ação, sexo, e outros elementos tão populares em séries famosas), e o elenco é excepcional; porém o que me conquistou foi muito além do delicioso entretenimento que a série proporciona, foi poder espelhar um sonho pessoal através da série: uma política equilibrada.

Para alguns leitores, não deve ser novidade que sou uma entusiasta da política, que trabalho com ela desde 2017 e sou mestranda em comunicação política contemporânea. E a consequência de algumas das minhas inquietações em relação a nossa política, surgiu a ideia e motivação para escrever esse texto. Quero deixar bem claro que o texto é sob um ponto de vista extremamente pessoal.

Minha real intenção através do texto é ser positiva e deixar a minha visão política, mas, infelizmente, farei algumas tristes comparações da política brasileira com a representada na série (que não deve ser 100% real pois se trata de uma ficção). Quero esclarecer que não se trata de comparações nós contra eles ou que devemos ser como eles, até porque, vivemos em realidades completamente diferentes e também não cabe entrar nas perspectivas de: tamanho e população de país, sistema eleitoral, sistema de governo e ideologias. Meu intuito é trazer pontos sobre a dinâmica dos acontecimentos, o comportamento dos atores políticos envolvidos, influência da imprensa e a liderança feminina.

Pra quem não assistiu a série, ela se passa na Dinamarca e foi produzida entre 2010 e 2013. São 3 temporadas com 10 episódios cada, e por incrível que pareça, cada episódio é simplesmente surpreendente. O nome “Borgen” que significa castelo ou fortaleza, é como os dinamarqueses chamam o governo que ocupa o Palácio Christenborg, em Copenhagen. Para resumir e sem dar spoiler, Borgen acompanha os bastidores do poder na Dinamarca, com escândalos, corrupção, espionagem, a mistura entre público e privado e os altos e baixos de Birgitte, a 1ª ministra.

Como acabei de colocar, a personagem central é Birgitte Nyborg, política de um partido moderado (inclusive é o nome do partido), que luta aos trancos e barrancos no Parlamento para manter seu país longe dos extremismos (igualzinho ao que vemos por aqui, #soquenão), e garantindo direitos como transparência, integração e igualdade. Deixando um pouco de lado os temas: moderação e transparência, a série retrata acontecimentos muito parecidos com o Brasil, Nyborg enfrenta políticos experientes e um agressivo jornalista com o poder de destruir qualquer reputação.

Até aqui tudo bem, também temos políticos que, independente de ideologia, almejam cargos políticos e para isso precisam enfrentar adversários e a grande mídia. Como não se vive somente de “inimigos”, a 1ª ministra tem grandes aliados políticos e o seu grande assessor Kasper Juul. Kasper (meu 2º personagem favorito porque o 1º é a Nyborg) é um excelente e admirável Relações Públicas, que na minha opinião não joga tão limpo assim, porém através de sua experiência e influência consegue antecipar a todos os movimentos de seus adversários.

É bem interessante acompanhar ao longo das três temporadas a ascensão e queda de Nyborg. O que me chamou a atenção é que mesmo ela ocupando o maior cargo enquanto 1ª ministra da Dinamarca, Nyborg continuou como um ser humano normal tendo que lidar tanto com as bizarrices políticas quanto com as dificuldades do seu dia a dia como família, dinheiro e saúde – que só um parêntese, é angustiante.

Agora, a maior comparação (negativa) que faço da série com a nossa realidade é que, no Brasil, qualquer “mané” quando eleito, logo de início tem direto a uma série de regalias e privilégios. Enquanto no Borgen eles andam de bicicleta, a 1ª ministra leva seus filhos a escola e cumpre atividades normais como mãe, aqui o presidente tem direito a um palácio e auxílios que não acabam mais. Sem contar nas nomeações para cargos comissionados com altos salários e sem qualquer justificativa de competência para o exercer a função. Aqui também cargos do alto escalão se deslocam para qualquer lugar num carro blindado, com forte escolta e sem contar na comitiva de “assessores” pra lá e pra cá com as mesas regalias.

Outro aspecto que me chamou atenção foi o papel da imprensa pois a série retrata dois tipos de tabloides, um que batalha para manter a credibilidade e transparência da notícia e o outro que está sempre em busca do sensacionalismo. Infelizmente, aqui no Brasil, eu vejo uma imprensa completamente parcial manipulando a opinião pública de acordo com os seus interesses corporativistas, não vou entrar no mérito ideológico porque podemos apontar influência da mídia para ambos os lados.

E, claro, eu não poderia deixar de falar da representatividade do papel da mulher como líder e 1ª ministra de um país. A forma com que a série conduziu esse tema foi de extrema sabedoria e sua grande virtude foi não cair nos clichês do sexismo, como sempre sugere o tema de uma mulher comandando de uma nação cercada de homens que lutam para arrancar uma migalha que seja do poder. Os personagens (masculinos e femininos) de Borgen não jogam com estereótipos fáceis e proporcionam ótimas discussões políticas que fogem às discussões de gêneros e polarizações. E mesmo assim a série está bem longe de ser monótona.

Quero chegar ao final do texto destacando acontecimentos da série que seriam um sonho pessoal para a política que acredito como ideal. É um sonho o 1º ministro ter seu cargo ameaçado porque pagou uma despesa pessoal com um cartão corporativo e um ministro poder ser impedido por ter sido pego dirigindo sob efeito de álcool. Trazendo para a nossa realidade, corremos o risco de em breve ter um condenado concorrendo a presidência da república, isso sem falar no altíssimo número de parlamentares e cargos do executivo que são ficha suja. Também é um sonho ter uma imprensa que busca a verdade, que se preocupa em narrar e transmitir os fatos como eles realmente são. Na série fica bem claro como os políticos podem perder seus cargos por qualquer deslize e como a corrupção tem um preço muito alto a qualquer um deles.

A luta de Nyborg pela busca do equilíbrio e moderação na política é algo que me fascinou porque eu jamais acreditei em extremismos e em manipulação da sociedade. Acredito na busca pelo consenso da melhor decisão para determinada situação e que as decisões políticas devam ser baseadas em nossa ideologia somada às evidências dos fatos. Jamais devemos colocar a ideologia acima de qualquer decisão pois estamos vivendo em mundo moderno com constantes transformações e descobertas onde não tem mais espaço para “pré conceitos”.

As pautas não devem ser exclusivas de ideologia. Eu, como liberal, quero sim falar de meio ambiente, programas sociais e de igualdade de oportunidades. Acredito que enquanto tivermos uma política baseada em extremismos jamais caminharemos para a evolução e o desenvolvimento. Chegou o momento de agirmos como um povo unido que, sim, possui divergências de pensamentos e ideologias, mas que se senta junto numa mesa de forma respeitosa para decidir o futuro de pessoas vulneráveis porque enquanto a política não olhar para essa parcela da sociedade, estaremos fadados ao fracasso como nação.

Nara Fonseca Borges

Relações Públicas e mestranda em Comunicação Contemporânea pela Faculdade Cásper Líbero.

 

 

 

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