Os meses de maio no Brasil : o impeachment (parte 1)

2016, 2017 e 2018. Os últimos três anos têm tido uma constância curiosa: no mês de maio, grandes e impactantes acontecimentos ocorreram. Essa peculiar coincidência é o que motiva esta trilogia de artigos, que corresponderá a um olhar atento aos meses de maio dos três anos citados.


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2016 – Parte I

Sem dúvida, será o maio mais difícil de relatar. Escrever sobre esse período é uma tarefa bastante árdua, pois ainda existem aqueles leitores de plantão que estão eternamente embevecidos por denúncias de golpes, teorias da conspiração, CIA e etc.

Cenário:

A então presidente Dilma Rousseff era ré na denúncia que fora aceita pelo deputado Eduardo Cunha (presidente da Câmara na época), que a acusava de cometer as chamadas “Pedaladas Fiscais”.

Essa irregularidade não é tão trivial de entender, pois trata-se de um assunto mais técnico e específico. Afinal, contabilidade não é nem de longe um dos assuntos mais populares na mídia consumida pelo brasileiro médio, então é natural causar uma maior exaltação dos ânimos. O não conhecimento, ou seja, a imperícia do assunto acabou fomentando uma maior revolta dos seus apoiadores sobre a importância real do caso – e se ele justificaria ou não o afastamento da presidente.

Este tipo de crime, o de responsabilidade, é passível de análise das casas legislativas. Devido a isso, temos que iniciar a nossa discussão adotando esse ponto de partida.

O que aconteceu?

No dia 11 de maio iniciou-se a votação no Senado para a aprovação da abertura do processo de impeachment, que só terminaria no dia seguinte com 55 votos a favor e 22 contra. Tal abertura já havia sido autorizada pela Câmara dos Deputados no dia 17 de abril daquele ano (367 SIM contra 137 NÃO). Após a votação dos senadores em maio, Dilma Roussef foi afastada da presidência. Com isso, Michel Temer assumiu provisoriamente a presidência, aguardando o julgamento final do Senado, que ocorreria em agosto do mesmo ano.

Logo em seu primeiro discurso como presidente em exercício, Temer anunciou que, se por um lado manteria ativos programas sociais, por outro mudaria o direcionamento da economia em diversos aspectos. A troca de direcionamento mais notável na economia se deu em alguns nomes notórios na equipe econômica, como por exemplo, Henrique Meirelles para o Ministério da Fazenda e Ilan Goldfajn para a Presidência do Banco Central. Ambos eram bastante conhecidos, tanto na política quanto na economia. Meirelles presidira o Banco Central de 2003 a 2011, além de ter assumido a Vice Presidência do BankBoston, inclusive chegando a ser indicado para o cargo de chairman do Lazard Americas. Já Goldfajn fora economista chefe e sócio do Itaú Unibanco e da Gávea Investimentos, além de ter sido professor de Economia da PUC-Rio. Com essas nomeações para a equipe econômica, Temer quis passar um sinal de credibilidade para o mercado e assegurá-lo de uma, senão ruptura, no mínimo distanciamento da política econômica usada no governo que o antecedeu.

Por que aconteceu?

Neste tópico, explicaremos rapidamente o que são as famosas pedaladas.

“Pedaladas fiscais” são, em termos práticos, quando omite-se das contas públicas fatores que fazem muita diferença para sua interpretação e, deste modo, chega-se a conclusões absolutamente diferentes do que seria a condição real delas. O problema não é necessariamente sua existência, mas sim a mudança de interpretação que estas podem gerar – e essa diferença está sobre a magnitude dessa manobra. No gráfico abaixo podemos verificar como Dilma abusou da prática de, ao não repassar recursos públicos para os diferentes entes e mantê-los em caixa, dar a aparência de que as contas públicas permitiam uma expansão impossível dos gastos. Pedalar, ou “maquiar os gastos”, é mostrar que existe uma capacidade de gastos que não existe na realidade – e isso é um crime de responsabilidade. Segundo o procurador Julio Marcelo de Oliveira afirmou em entrevista, aquilo que fora praticado pela então presidente Dilma Rousseff é frontalmente contra o que diz a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O que veio depois?

No dia 31 de agosto, o impeachment de Dilma Rousseff foi concluído. O episódio de agosto foi marcado por uma decisão “fatiada”. Na prática, apesar de ter tido seu mandato cassado, Dilma teve seu direito de exercer cargos públicos mantido. Tal decisão causou muita polêmica na época, pois foi contra o que diz a lei.

Passado o “rally do impeachment” (que foi o efeito positivo sobre os preços das ações do Ibovespa após a saída de Dilma), Temer começou a divulgar com mais força sua agenda reformista e seus planos de “colocar o Brasil nos trilhos” até as eleições de 2018. Agenda essa que, aliás, já era divulgada pelo PMDB desde o final de 2015, com o nome “Uma ponte para o futuro” – divulgação essa que, com o impeachment já posto sobre a mesa meses depois, gerou desconforto quanto a possível conspiração pela saída de Dilma.

Como primeira grande medida, Temer e sua equipe econômica propuseram a PEC 55, também chamada de PEC dos gastos públicos. Essa PEC, de maneira bem resumida, propõe que os gastos do governo federal só poderão sofrer reajuste de acordo com a inflação acumulada segundo o IPCA (Índice de Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) do período anterior – ou seja, que o orçamento todo pode avançar apenas em termos nominais, mas não reais. Essa proposta era um claro sinal de que o governo Temer adotaria uma política mais austera, de contenção de gastos e, a princípio, mais comprometida com a meta fiscal, buscando sanar a questão dos seguidos déficits fiscais observados.

Desde que chegou à presidência, ficou claro que Temer teria um grande desafio na comunicação com a população, ainda mais sendo a brasileira – aquela acostumada com políticas populistas de “almoço grátis”. Uma agenda reformista seria um desafio intenso e de grande desgaste político. Sem uma forte base aliada, ficaria inviável.

Abaixo temos a evolução do índice Bovespa, contemplando o período de 2 de dezembro de 2015 (dia em que o então Presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha aceitou o pedido de impeachment) até o dia 31 de agosto, quando Dilma teve seu mandato cassado.

Ao final do período citado, a Bolsa teve uma alta de quase 30%. Essa alta se deve, em boa parte, às aparentes mudanças nas diretrizes do governo Temer, visto que as políticas adotadas por Dilma Rousseff se mostraram totalmente incapazes de tirar o Brasil daquela que viria a ser a maior recessão da história do país.

Acredite se quiser, leitor: ao final de 2016, a Bolsa subiu 39% e foi o investimento mais rentável do ano.

Na próxima parte: 2017 e o bombástico áudio que azedaram fortemente a lua de mel entre Temer e o mercado (já que esse bom período simplesmente nunca existiu com a população brasileira).

Quer entender um pouco mais sobre as “pedaladas” e o mito de que elas sempre existiram? Confira aqui.

  Eduardo Scovino – Editor do Terraço Econômico Caio Augusto – Editor do Terraço Econômico

Eduardo Scovino

Estuda Engenharia Química na UERJ e é outro economista de coração. Já trabalhou em Operação no meio fabril, mas acabou se rendendo ao jargão “It’s the Economy, stupid!”. Dentre as principais causas que defende, estão a Economia de Mercado, a Destruição Criativa, Finanças Pessoais e Reciclagem. Acredita ainda que é possível uma solução que englobe essas duas últimas. Nas horas vagas, também é remador, frequentador de shows de metal e está sempre pronto para uma roadtrip.
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