Em 1972, John R. Hicks recebeu o prêmio Nobel de Economia por suas contribuições para a teoria do equilíbrio geral e do bem-estar [1]. Hicks talvez não seja um nome tão reconhecido dentre os diversos laureados, contudo, suas contribuições permeiam diversas partes da economia moderna. Neste texto, convido-te a conhecer um pouco sobre o trabalho e a vida desse fascinante economista.
John R. Hicks nasceu em 1904, na cidade de Warwick, no Reino Unido, teve uma trajetória acadêmica ilustre, passando por instituições como Cambridge, Oxford e a London School of Economics(LSE).
Durante seu período como professor-assistente na LSE, Hicks realizou contribuições substanciais, como a invenção da elasticidade de substituição e a identificação do espectro de liquidez. Posteriormente, em seu período em Cambridge, ele finalizou o livro “Valor e Capital” [2], no qual trouxe diversas inovações para a microeconomia, principalmente para a teoria da demanda do consumidor e do equilíbrio geral. Neste mesmo período, Hicks publicou duas resenhas da Teoria Geral de Keynes. Mais contribuições para a teoria keynesiana ocorreriam nos anos seguintes, quando ele passou por instituições como Oxford e Manchester University.
Tudo o que foi comentado até agora consiste na trajetória do economista britânico até 1956 e constitui as contribuições de um Hicks mais jovem. Nos anos posteriores, ele teve uma grande mudança de ênfase no seu pensamento econômico, tanto que, em 1977, alguns anos após receber seu Nobel, Hicks disse o seguinte: “Tive sentimentos mistos ao ser honrado por trabalhos os quais eu me considero superado.”. As contribuições do Hicks mais velho foram em diversas áreas, desde causalidade às teorias do crescimento econômico [3][4][5][6].
Ao longo deste texto, os trabalhos de Hicks sobre o equilíbrio geral e sobre Keynes, em especial, a criação do modelo IS-LM serão explorados em maior detalhe.
Uma das primeiras que surgem quando pensamos em economia é o gráfico de oferta e demanda. Esse modelo, em um primeiro contato, não nos diz muito além do fato de que os preços são determinados no ponto de interseção das curvas, com a demanda se igualando à oferta. Para além disso, em uma análise mais cuidadosa, pode-se dizer que as curvas representam uma posição estacionária de um processo dinâmico, ou seja, os ajustes dos preços e quantidades do mercado. O que foi descrito até agora é chamado de equilíbrio parcial, isto é, o equilíbrio em um único mercado ceteris paribus (tudo o mais constante).
Entendido o que é equilíbrio parcial, é possível partir para o conceito de equilíbrio geral. Como o próprio o nome indica, esse modelo irá tratar da economia como um todo, ou seja, analisa-se a interação entre os mercados, não apenas um único mercado artificialmente isolado [7]. Todavia, esse conceito levanta alguns questionamentos, dentre eles, há um sobre estabilidade: sob quais circunstâncias uma economia competitiva converge para o equilíbrio e, caso isso ocorra, quão rápido ocorre [8]?
Uma das grandes contribuições de Hicks para a teoria do equilíbrio geral se relaciona fortemente à pergunta acima. Utilizando-se de análise estática comparativa[1], ele definiu dois conceitos de estabilidade: a perfeita e a imperfeita.
A estabilidade imperfeita ocorre quando há estabilidade em um dado mercado apenas se todos os outros mercados estão em equilíbrio, ou seja, o equilíbrio é restaurado apenas depois que os ajustes dos preços em todos outros mercados ocorrem. Já a estabilidade perfeita ocorre quando um movimento para fora do equilíbrio de mercado gera uma força que tende a restaurar o equilíbrio, não importando o estado de outros mercados. Além disso, uma das condições para essas estabilidades seria um cenário no qual um aumento nos preços fizesse a oferta maior que a demanda, isto é, a curva de excesso de demanda teria de ter inclinação negativa [1].
Nas linhas da formalização das condições de estabilidade equilíbrio geral, Hicks também realizou a formalização de aspectos de uma interpretação da Teoria Geral de Keynes. Isso ocorreu por meio da criação do modelo IS-LM, um dos mais utilizados quando se estuda a macroeconomia do curto prazo. Ele consiste em duas curvas: a curva IS, que expressa o equilíbrio no mercado de bens, e a LM, que expressa o equilíbrio nos mercados financeiros.
A IS vem de duas funções: uma que determina o valor da taxa de investimento(I) para qualquer valor de taxa de juros (r). Já a outra determina qual o valor de renda do país (y) será necessário para igualar a taxa de investimento a taxa de poupança (S).
A curva LM vem da função do mercado de dinheiro, que determina quais os efeitos da renda e da taxa de juros sobre a quantidade de dinheiro disponível. A curva LM tem uma inclinação positiva, já que um aumento na renda do país tende a aumentar a demanda por dinheiro (como houve crescimento, há maior consumo), já um aumento na taxa de juros tende a diminuir essa demanda, visto que os juros representam, essencialmente, o valor do dinheiro.
Assim, tendo-se compreendido as duas curvas, pode-se desenhar o seguinte gráfico:
No ponto de interseção dessas curvas, determina-se, simultaneamente, o nível de equilíbrio da renda e da taxa de juros. Assim, mostrando um grau de interdependência entre essas duas variáveis macroeconômicas [1].
Esse modelo pode ser utilizado para descrever como os níveis de equilíbrio supracitados se alteram em face a mudanças nas preferências de mercado. Sendo assim, o IS-LM se mostra uma ferramenta extremamente interessante para se analisar fenômenos macroeconômicos, como crises [10][11].
Essas não foram as únicas contribuições do economista britânico, como já foi comentado anteriormente. Contudo, elas mostram o brilhantismo e o rigor matemático de Hicks ao lidar com problemas econômicos, características que permearam toda a sua obra.
João Pedro F. G.
Estudante de ensino médio técnico integrado com Desenvolvimento de Sistemas no COLTEC-UFMG. Alumnus da Olimpíada Brasileira de Economia.
Notas
[1] Press Release – 1972 Nobel
[2] Regis Mateus and Tácito Farias and Fábio Moura. Valor e capital: uma revisita à Hicks.
[3] J. R. Shackleton and Gareth Locksley. Twelve Contemporary Economists. London: The Macmillan Press. 1983.
[5] Prize Lecture – John Hicks
[7] Ross M. Starr. General Equilibrium Theory An Introduction. Cambridge: Cambridge University Press. 2011
[8] Franklin M. Fisher. The Stability of General Equilibrium: What do We Know and Why is it important?
[9] Timothy J. Kehoe. Comparative Statics.
[10] IS-LM Model
[11] Olivier Blanchard. Macroeconomia. São Paulo: Pearson Education do Brasil. 2017.